Eólicas offshore: PL incorpora texto previsto para MP e tem acordo para ser aprovado no legislativo

Marisa Wanzeller e Leila Coimbra, da Agência iNFRA

O novo relatório do deputado Zé Vitor (PL-MG) para o PL (Projeto de Lei) 11.247/2018, que regulamenta a geração eólica offshore, incorporou pontos que estariam em matérias que o governo pretendia encaminhar para o Congresso via MP (Medida Provisória). Além de regras que podem reduzir o impacto de tarifas para os consumidores cativos (residenciais), com foco na região Norte (em especial o Amapá), o texto onera o mercado livre de energia e realoca a contratação de 8 GW (gigawatts) de térmicas prevista na lei da Eletrobras. E dá subsídios para fontes renováveis.

A Câmara votará a matéria hoje (28), após acordo da Frente Parlamentar de Energia com o presidente Arthur Lira (PP-AL) e com as lideranças partidárias.

Apesar dos jabutis – tópicos que não dizem respeitos à ementa inicial da matéria – a Agência iNFRA apurou que o presidente da Casa quer acelerar a votação para chegar na COP 28, conferência global de assuntos ambientais, com matérias verdes aprovadas. A ideia é mostrar comprometimento da Câmara dos Deputados com a pauta ambiental.

A negociação já teria se estendido ao Senado. O responsável pela relatoria será o senador Carlos Portinho (PL-RJ), que pretende votar a matéria ainda neste ano, disseram fontes. Apesar do prazo curto, a celeridade é um ponto essencial para impedir que o aumento tarifário de 44,41% no Amapá passe a vigorar a partir de 13 de dezembro.

Procurado, Portinho avalia que as mudanças “no campo das offshore” foram poucas. Quanto ao resto, ainda é preciso avaliar. “Um leão de cada vez. Quando chegar no Senado, a gente vai avaliar as alterações”, disse à Agência iNFRA.

Mercado Livre
O rateio de custos do setor elétrico que hoje pesam sobre o mercado de baixa tensão com os grandes consumidores ligados em alta tensão e no mercado livre é um dos pontos que seria apresentado via MP, na tentativa de reduzir o aumento tarifário das distribuidoras de energia e, com isso, impedir o reajuste do do Amapá. 

Segundo o governador Clécio Luis, o presidente Lula teria se comprometido em apresentar uma proposta para reverter a situação ainda na última sexta-feira (24). Isso, no entanto, não ocorreu. O governo não apresentou a MP. Mas os pontos cruciais apareceram no relatório do deputado Zé Vitor. 

O texto inclui os consumidores livres no rateio dos custos dos despachos de termelétricas do regime especial, de forma proporcional ao consumo, e dos custos de Itaipu, de usinas nucleares, empreendimentos estruturantes, Conta-Covid e Conta Escassez Hídrica, de forma condicionante para a abertura do mercado.

A CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) também é tópico do novo texto, que sugere a extinção das quotas diferenciadas por nível de tensão. 

A matéria também passou a prever a alocação dos custos da sobrecontratação das distribuidoras, decorrentes da migração integralmente ao ACL (Ambiente de Contratação Livre), e a alocação de perdas técnicas e não técnicas, proporcional aos ambientes de contratação.

Essas medidas oneram o consumidor livre mas diminuem as tarifas dos consumidores das distribuidoras de energia elétrica, com reajustes definidos pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica).

Lei da Eletrobras
O relatório do parlamentar também propõe alterações na Lei 14.182/2021, que permitiu a desestatização da Eletrobras, tema que estava no radar do governo.

O novo parecer redistribui a contratação obrigatória de 8 GW em térmicas para outras fontes, como PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas), hidrogênio líquido e eólicas. O texto propõe ainda a extensão do desconto na tarifa de transmissão para biomassa, resíduos sólidos e biogás por mais cinco anos.

Pauta verde
O posicionamento do presidente da Câmara, Arthur Lira, nas redes sociais na última semana reforça a intenção do parlamentar em avançar nas pautas verdes na reta final da Legislatura de 2023. 

Lira disse na semana passada que pretende avançar nas deliberações sobre os PLs do Combustível do Futuro, Mercado de Carbono, Marco Regulatório das Eólicas Offshore, Hidrogênio Verde, além do Paten (Programa de Aceleração da Transição Energética). 

Nas redes sociais, disse estar “renovando o compromisso com a sustentabilidade”. “Estou focado em debater e aprovar a ‘pauta verde’, uma das principais prioridades da presidência da Câmara nos próximos meses”, afirmou.

Na ocasião, o vice-presidente do Senado e presidente da Frente Parlamentar de Recursos Naturais e Energia, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), disse que o Senado está pronto para receber as matérias da “pauta verde” a serem votadas na Câmara.

“Transferência de custos”
Para o diretor de Energia Elétrica da Abrace (Associação Brasileira de Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres), Victor iOcca, a inclusão desses pontos no texto das eólicas offshore representa uma “tentativa de transferir ineficiências do mercado cativo para o mercado livre”. O que, segundo ele, vai retirar ainda mais a pouca competitividade que as indústrias do país já têm. 

“[O projeto] reduz na marra a tarifa do [consumidor] cativo com uma ação política, mas isso vai voltar, todas essas ineficiências e custos vão se rebater no custo dos produtos e serviços no mês seguinte, não tem mágica. A partir do momento que você aumenta e muito o custo para a indústria, ela vai acabar sendo forçada a repassar isso”, disse à Agência iNFRA

A associação que representa os grandes consumidores estima que o relatório apresentado para o PL das offshore pode custar R$ 28 bilhões ao ano para os consumidores. Em nota repassada aos associados, a Abrace diz que acompanha a tramitação do projeto com atenção e “trabalha para retirar do texto todas estas alterações estranhas ao marco legal de eólicas offshore que adicionam custos expressivos aos consumidores industriais”. 

Em coro, a Frente Nacional dos Consumidores de Energia diz que o relatório do PL “foi recheado de jabutis que encarecem a conta de luz dos consumidores brasileiros”. “Entre os jabutis, estão benefícios para a Geração Distribuída, descontos para produtores de biomassa e biometano e liberação de preços para o gás utilizado nas usinas térmicas. Tudo isso a ser bancado com o dinheiro dos consumidores.”

“A produção de energias renováveis é essencial para a transição energética brasileira, mas o país precisa fazer essa transição de forma inteligente e responsável. Avançar para o modelo offshore no momento é um equívoco”, destaca o presidente da Frente, Luiz Eduardo Barata, ex-diretor do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico).

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