Sheyla Santos, da Agência iNFRA
A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) apresentou às concessionárias de rodovias uma proposta de mudança contratual e regulatória para incluir nas concessões a reconstrução dos pavimentos rodoviários. Ao aderir à proposta de inclusão como obra obrigatória, a concessionária terá um conjunto de responsabilidades contratuais específicas a cumprir, como a adoção do pedágio eletrônico (free flow), HS-WIM (pesagem dinâmica), metodologia iPAVe para caracterização de pavimentos rodoviários, entre outros aspectos.
Outra obrigação relevante a partir do aceite será a renúncia expressa e irrevogável pela concessionária a qualquer pleito ou litígio administrativos, judiciais ou arbitrais, presentes ou futuros, relacionados ao tema pavimento, “incluindo, mas não se limitando a, alegações de vício oculto e/ou de desgaste prematuro decorrente de excesso de carga”. As contribuições à proposta podem ser enviadas até as 18h de 12 de agosto por meio deste link.
Hoje, a reconstrução do pavimento não é formalmente tratada como obrigação contratual expressa nos contratos, lacuna que, de acordo com a ANTT, compromete a efetividade dos instrumentos regulatórios para exigir intervenções estruturais mais robustas por parte das concessionárias. De acordo com a agência, a nova proposta apresentada onera as concessionárias, prevendo que elas reconstruam segmentos inteiros a fim de assegurar um desempenho adequado das vias e uma melhor prestação de serviço ao usuário. Em troca, as concessões terão seus contratos reequilibrados.
Deterioração
O superintendente de Infraestrutura Rodoviária da ANTT, Fernando Bezerra, disse na reunião que o nível de deterioração do pavimento é muito alto nas concessões federais. Segundo ele, a agência tem notado a recorrência de intervenções paliativas nos pavimentos, apesar da existência de mecanismos contratuais vigentes, como a aplicação de multas e do chamado Fator D, desconto tarifário para usuários aplicado quando a concessionária não cumpre obrigações.
Bezerra destacou que as empresas classificadas como ótimas no topo da Pesquisa CNT de Rodovias 2024 são estaduais, e não federais. “Trabalhando o pavimento de forma igual às outras disciplinas, a gente [ANTT] acha que talvez esteja falhando, tendo em vista a importância dele [do pavimento] dentro dos outros elementos, como sinalização, drenagem, terrapleno”, disse o superintendente.
Se a obrigatoriedade proposta pela ANTT se concretizar, as obras no pavimento passarão a estar sujeitas à fiscalização e haverá a exigência por parte da agência de um projeto executivo, que passará a ser apresentado com certificação do Inmetro. A mesma certificação deverá valer para o orçamento do projeto. Conforme a proposta, o recebimento das obras no pavimento deverá ser conduzido por uma comissão específica designada pela ANTT. E a atuação da comissão e a fiscalização da obra será realizada em conjunto com supervisoras ou verificadores, como OIA.
A concessionária também terá de aderir à Instrução Normativa 34/2024, da ANTT. Segundo a agência, a adesão à proposta “dependerá de formalização mediante Termo Aditivo e Revisão Extraordinária, com recomposição do equilíbrio econômico-financeiro apenas para o primeiro ciclo de reconstrução”.
Críticas ao novo modelo
Na reunião em que a ANTT apresentou a proposta, o diretor-executivo da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias), Marco Antonio Giusti, criticou os ciclos fixos de oito anos para as obras, período proposto pela ANTT. Ele também disse que a proposta põe no mesmo nível concessionárias em diferentes fases contratuais e manifestou dúvida sobre o processo e a abrangência do reequilíbrio econômico-financeiro a ser calculado.
“Caso mantida a estratégia de efetiva reconstrução de todo o pavimento a cada oito anos, entendemos que não seria adequado limitar o reequilíbrio à primeira intervenção”, disse Giusti. “A definição de um programa de reconstrução com ciclos fixos de oito anos exclui, por exemplo, do conjunto de opções viáveis, soluções de engenharia que possibilitariam intervenções em prazos mais alargados”, avaliou.
No entendimento da ABCR, a complexidade e a abrangência da proposta da ANTT justificaria a criação de um grupo de trabalho com representantes das equipes técnicas das concessionárias. Na reunião, a entidade também defendeu uma definição mais clara e uniforme para o escopo da reconstrução do pavimento.
Guilherme Baldassari, gerente de Engenharia de obras do Grupo WAY, concessionária da BR-262/MG, apoiou a proposta da agência, mas também se mostrou preocupado quanto ao ciclo de oito anos. Sobre revestimentos, Baldassari disse que as concessionárias da ANTT usam bastante microrrevestimento e disse que poderia se pensar em camadas mais sofisticadas, como asfalto de maior conforto de rolagem e menor ruído.
O gerente técnico da ANUT (Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga), André Aguiar, apoiou as propostas de Giusti e questionou a mudança contratual após anos de concessões. “Será que o decaimento do diligenciamento da ANTT ao longo dos anos não causou essa, digamos assim, leniência?”, questionou.
De acordo com a ANTT, a proposta apresentada às concessionárias tem caráter técnico preliminar, sem efeito vinculante ou alteração automática nos contratos vigentes e poderá ser aplicável somente aos segmentos de pavimentos herdados pelo DNIT. A agência disse que vai avaliar futuramente a viabilidade de um grupo de trabalho. “A ANTT e a superintendência não têm uma opinião formada, mas o que a gente tem de concreto aqui, de fato, não está bom o cenário atual”, disse o superintendente Bezerra.








