30/07/2025 | 09h00  •  Atualização: 01/08/2025 | 13h54

Dúvidas sobre leilão do GSF ameaçam realização do certame nesta semana

Foto: Cemig/Divulgação

Geraldo Campos Jr., Lais Carregosa e Marisa Wanzeller, da Agência iNFRA

A reunião da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) na terça-feira (29) lançou dúvidas sobre o leilão do GSF (sigla para risco hidrológico), inicialmente planejado para sexta-feira (1º). A principal delas é se o certame está mantido para esta semana em meio a questionamentos sobre a sua segurança jurídica, que podem, inclusive, levar à anulação do edital, na avaliação de especialistas consultados pela Agência iNFRA.

A questão surgiu com um questionamento do diretor da agência, Fernando Mosna, sobre a Portaria 112/2025, que regulamenta o certame. No seu entendimento, ela apresenta ilegalidade, e deveria ser republicada pelo MME (Ministério de Minas e Energia), assim como os editais do leilão pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia). Com isso, Mosna defendeu uma recomendação expressa ao ministério para adiar o certame, mas não houve aprovação da diretoria até o momento, uma vez que o diretor pediu vista do processo que tratava do tema.

Dentro do governo, o entendimento é que a portaria não tem qualquer ilegalidade e que, um eventual adiamento do leilão caberia à CCEE e à ANEEL, disseram fontes. Questionada, a reguladora disse em nota que a CCEE é responsável por avaliar “quanto à data de realização do Mecanismo Concorrencial e outros aspectos relacionados em observância aos comandos legais associados”.

“A Portaria MME n⁰ 112/2025, que regulamentou o Mecanismo Concorrencial previsto na MP (Medida Provisória) 1.300/2025, estabeleceu que: ‘Caberá à CCEE divulgar, por meio de Edital, a data de realização do mecanismo concorrencial, os critérios detalhados de participação, cronograma, sistemática e demais procedimentos operacionais do mecanismo concorrencial centralizado’”, destacou a agência em nota. Procurada, a CCEE não respondeu até o fechamento desta reportagem.

A Abrage, associação que representa as grandes hidrelétricas – interessadas no certame –, disse em nota que a definição da data de realização do leilão cabe às instituições responsáveis, ou seja, ANEEL, CCEE e MME. 

Para o advogado Caio Alves, head de Energia do escritório Rolim Goulart Cardoso, “o que foi levantado pelo [diretor Fernando] Mosna, do ponto de vista legal, é importante porque eventualmente pode anular o certame”. Ele explica que o assunto se trata de uma “questão de ordem pública”, que pode ensejar questionamentos judiciais e a eventual anulação do leilão.

Em nota encaminhada, o MME disse que a portaria que disciplina o leilão do GSF atende aos “critérios estabelecidos pela legislação” e que “está amparada por instrução técnica e jurídica”. Segundo a pasta, a Portaria 112/1015 segue as diretrizes da MP 1.300/2025, que criou o certame. 

“Tem um momento crítico agora porque o ministério tem que ter muita certeza da decisão que vai tomar, porque se for para corrigir o leilão é melhor corrigir agora e, se ele entender que não tem nada para corrigir e depois se notar que essa decisão não foi tão acertada assim, aí o risco é muito grande, exatamente o risco de cancelar o leilão”, disse o advogado.

“Taxa de desconto”
A ilegalidade da portaria, segundo Mosna, ocorre ao fixar uma taxa de desconto ou de retorno de investimento (chamada de WACC) em 10,94%. Acontece que a MP 1.300/2025, que permite a realização do certame, diz que a extensão da outorga será feita com base em parâmetros já definidos pela reguladora, o que, segundo o diretor, levaria a uma taxa de desconto de 9,63%, usada nos mecanismos de 2015 e 2020 do GSF. 

Segundo o advogado Caio Alves, o ponto levantado por Mosna altera o valor a ser convertido pelo certame. “Isso pode afetar tanto o interesse de quem quer participar para comprar os créditos de GSF quanto os interesses também dos geradores que estão com ações de GSF”, declarou. 

Outros especialistas no tema, no entanto, argumentam que a medida provisória não determina que a taxa de desconto seja igual à utilizada em 2015, permitindo atualização, ou seja, alcançando-se os 10,94%. Fontes do governo afirmam que a MP define que a taxa seja calculada “com base” nos valores dos parâmetros aplicados pela ANEEL anteriormente. A questão levantada é se “com base” significaria “igual” ou “com a mesma metodologia”, disseram. 

Na reunião da ANEEL, após o questionamento de Mosna, o diretor-geral da agência, Sandoval Feitosa, afirmou que há uma dúvida clara sobre qual taxa de desconto será aplicada no leilão. Mosna pediu vista do processo e afirmou que vai encaminhar ofício ao MME e à CCEE indicando seu posicionamento. Ele ainda afirmou querer ouvir a procuradoria da agência.

Incertezas
A diretoria da ANEEL analisou pedidos de esclarecimentos dos agentes sobre algumas das regras do leilão, mas o processo não chegou a ter deliberação por causa do pedido de vista de Mosna.

O advogado André Edelstein, sócio do escritório Edelstein Advogados, explica que, diante do pedido de vista e da não deliberação do tema pela diretoria, permanecem em aberto algumas incertezas. Ele lista cinco pontos que ainda carecem de esclarecimentos:

  1. desconto no fio: se a extensão dos contratos em até sete anos prevista pelo certame se configuraria como uma “prorrogação contratual” ou não. Se considerada “prorrogação”, os agentes de geração hidrelétrica participantes do MRE compradores deixariam de contar com os descontos nas tarifas de distribuição e transmissão durante esse período adicional;
  2. limite de extensão cumulativo: se o limite de sete anos de extensão contratual é cumulativo com outras prorrogações;
  3. regime de exploração durante o prazo de extensão: se a comercialização da energia durante o prazo de extensão contratual é livre ou deve observar o mesmo regime atualmente aplicável no caso das usinas submetidas ao regime de cotas;
  4. taxa de desconto: cujo questionamento foi levantado por Mosna na reunião da diretoria;
  5. honorários advocatícios: segundo Edelstein, a portaria e o edital do leilão dão margem para que os agentes compradores que vençam o leilão fiquem expostos ao pagamento de honorários à União Federal com a desistência das ações judiciais. Os valores podem ser consideráveis e representam mais um risco a ser considerado pelos agentes interessados em participar do mecanismo.


Os pontos de 1 a 3 foram objeto do processo discutido pela diretoria da ANEEL na terça-feira (29). “O fato é que esses esclarecimentos não foram aprovados pela diretoria. Então, embora tenham sido debatidos e, aparentemente tenha havido um consenso nas manifestações dos diretores, não houve aprovação dessa deliberação pela diretoria diante do pedido de vista. Então, continuamos convivendo com a incerteza”, afirmou o advogado.

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