José Augusto Valente*
A atual pandemia da Covid-19 está provocando consequências danosas para as economias de todos os países. O Brasil, com mais de 200 milhões de habitantes, sofrerá significativo impacto caso precise realizar mais um ou dois meses de isolamento social. Fala-se em queda de cinco pontos percentuais do PIB, acompanhada de aumento significativo de desemprego e de perda de renda, o que é uma tragédia para uma economia já combalida.
Quando as atividades forem retomadas, restará incerteza e algum nível de desesperança, seja pelo grande número de doentes, mortos e contaminados, seja pelo desemprego que terá aumentado ao passo que a capacidade do mercado para responder à necessidade de renda ainda estará reduzida. O Brasil, assim como os demais países desenvolvidos, terá que contar com o Estado para gerar trabalho e renda para milhões e, com isso, induzir os agentes econômicos a investir o máximo possível, retomando a esperança.
Esse período de indução do Estado poderá durar entre dois e quatro anos, não se pode afirmar com precisão. Mas é preciso que fique claro para todos que é provisório e que paralelamente deverão ser construídas as condições para retorno à busca dos objetivos fiscais adequados.
Dessa forma, o grande desafio a ser enfrentado é o de gerar milhões de postos de trabalho e renda, via programas emergenciais. Isso exigirá dos nossos dirigentes um robusto programa emergencial, para os próximos dois a quatro anos, nas esferas da União, estados e municípios, bem como criatividade para viabilização dos recursos, que não precisam ser necessariamente financeiros.
O Plano Pró-Brasil do Governo Federal, lançado na semana passada e momentaneamente congelado, busca enfrentar esse desafio com um leque de ações, ainda em fase embrionária, na área do Ministério da Infraestrutura. Considero um bom ponto de partida, mas avalio que é possível pensar um projeto mais ousado, cujos fundamentos e principais ações apresento agora.
É sabido que recursos aplicados em obras e serviços de infraestrutura, especialmente rodoviária e saneamento, geram impactos significativos na geração de trabalho e renda, além de melhorarem a qualidade de vida de milhões de pessoas.
Sugiro, portanto, um programa emergencial, com esse foco, por meio de medidas que signifiquem “injeção na veia”, para máxima eficácia.
- Aceleração de programa de obras e serviços de manutenção e conservação rodoviária, com destinação adicional de R$ 10 bilhões/ano ao atual orçamento do DNIT, para voltar ao patamar de 2010;
- Antecipação de renovação de concessões rodoviárias, que estão em vias de encerramento contratual, ou prorrogação das que estão com dificuldades financeiras, desde que as concessionárias garantam a retomada dos investimentos nos próximos cinco anos, permitindo a reorganização societária para aquelas com dificuldades financeiras;
- Criação de um programa emergencial de geração de emprego e renda, para obras e serviços de infraestrutura rodoviária e saneamento básico, com base em consórcios públicos, a serem criados nos 26 estados e no Distrito Federal, com base na Lei 11.107/2005. Este programa será coordenado pela Casa Civil. A orientação geral é de que cada governo de estado estabeleça programas emergenciais de geração de emprego e renda, por regiões ou bacias produtivas, como as do leite e de frutas, entre outras, envolvendo no consórcio público as prefeituras respectivas. Principais ações intensivas em mão de obra a desenvolver:
- pavimentação de estradas de terra, utilizando métodos e técnicas de baixo custo;
- conservação e eventual restauração das rodovias municipais, estaduais e federais, utilizando soluções como tratamentos superficiais simples e duplo;
- obras e serviços de saneamento básico, para rede de águas pluviais e redes de coleta e destinação de esgoto.
Nessa configuração de consórcio público, a União fornece recursos financeiros e insumos para pavimentação asfáltica, os estados as suas usinas de asfalto disponíveis, bem como caminhões basculantes e rolos compactadores, entre outros equipamentos necessários.
Aos municípios cabe o cadastramento e fornecimento de mão de obra, incluindo a execução, com supervisão de técnicos da própria prefeitura, dos DERs ou das superintendências do DNIT.
Tais propostas, que representam uma abordagem bastante diferenciada do que consta no Plano Pró-Brasil do Governo Federal, necessitam também de uma abordagem ousada no que diz respeito às formas de financiamento. Um caminho possível para isso é identificar fundos não constitucionais que possam ser cancelados parcialmente, nos próximos cinco anos, para gerar financeiro para investimentos públicos diretos por órgãos como o DNIT e transferências para DERs e prefeituras, nos consórcios públicos. Segundo levantamento do Ministério da Economia, que elaborou a PEC dos Fundos, em tramitação no Congresso Nacional, é possível gerar um financeiro anual de até R$ 200 bilhões. Como essa PEC é muito polêmica, o momento justifica utilizar um pequeno percentual desse total, o que é suficiente para financiar as obras e serviços programados.
Estou convencido que, com estas medidas, milhões de empregos podem ser gerados no curto e médio prazos, sem grandes impactos fiscais, saindo do círculo vicioso do momento “pandemia” para um momento de esperança em relação ao futuro.