Roberto Rockmann*
Distribuidoras de energia elétrica, governo e parlamentares intensificarão nesta semana as discussões de opções para redução dos reajustes de energia elétrica. O foco neste momento é o estabelecimento de uma alíquota máxima de 17% sobre o ICMS da energia elétrica para as novas contas de luz, que pode ser votado nesta semana na Câmara. Também se avalia a redução temporária do imposto, que poderia trazer uma redução de 5% nas tarifas.
Se na Câmara a aprovação é considerada certa, há bastante receio de que a pauta não seja aprovada no Senado, mais próximo dos governadores. Entre os senadores circula um estudo do economista Sergio Gobetti, especialista em finanças públicas, que aponta que, ao fixar a alíquota máxima de 17% para os estados, a perda para os governadores ficaria em R$ 70 bilhões.
Assim como o governo federal se financia com dividendos da Petrobras, os governos estaduais têm no ICMS importante fonte de receita. Reduções mesmo que temporárias têm impacto grande sobre os governadores, alguns em campanha de reeleição. “O provisório no Brasil vira definitivo, o Senado não será um caminho fácil para qualquer decisão sobre o ICMS”, diz um empresário.
A narrativa do governo federal será de que os estados estão com o caixa cheio. Dados do Banco Central apontam que os governos estaduais contavam com cerca de R$ 170 bilhões em caixa em março. Em dezembro de 2020, o valor era de R$ 65 bilhões.
Existem ainda dúvidas se a discussão sobre a interferência sobre o ICMS não irá parar no Supremo Tribunal Federal, que poderia julgar inconstitucional a proposta. No fim do ano passado, o STF modulou os efeitos de uma decisão que reduziu o ICMS cobrado nas contas de luz e serviços de telecomunicação, mas as alíquotas menores ficariam para 2024.
As conversas entre empresas e governo não estão centradas somente sobre o ICMS. Há várias ideias sobre a mesa, mas ainda são hipóteses porque há variáveis indefinidas: a oferta de capitalização da Eletrobras, já que o Tribunal de Contas da União divulgou recomendações e determinações a serem seguidas para que o processo avance; e o Projeto de Lei 414, cujo trâmite se tornou nebuloso com as tarifas ganhando projeção.
Segunda tranche do empréstimo
Quais são as ideias que circulam? Executar uma segunda tranche de empréstimo para as distribuidoras (a princípio a extensão do cheque especial é vista com ressalvas na ANEEL). Também se fala em extensão do prazo das concessões de distribuição. Outra ideia seria usar R$ 5 bilhões ou mais da oferta de capitalização da Eletrobras para baixar as tarifas. Dinheiro da renovação da concessão de geradoras, ponto que deve estar no PL 414, para reduzir as tarifas, também está na pauta. Estimam-se R$ 20 bilhões, metade iria para o Tesouro, metade para as contas de luz.
Estruturalmente, haveria problemas também no sistema de bandeiras tarifárias. Criado em 2015, ele não teria coberto todos os custos para os quais ele foi criado. De 2015 ao fim do primeiro trimestre de 2022, o déficit superaria R$ 14 bilhões. O assunto foi discutido em recente consulta pública aberta pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica).
Nas últimas duas décadas, o setor elétrico vive em um pêndulo: ora há excesso de oferta, ora falta. No atual momento de excesso, paga-se a conta da escassez. Arrumar a casa e evitar uma crise financeira de grandes proporções em um ambiente de fragilidade institucional e regulatória não será tarefa fácil. Não haverá um remédio milagroso, mas uma série de medicamentos a serem dados a um paciente que inspira cada vez mais cuidados. O risco é mandar o paciente para casa sem que a doença seja devidamente tratada.
*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.
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