iNFRADebate: Caminhos para a sustentabilidade portuária

Augusto Wagner Padilha Martins*

Ainda são tímidas as iniciativas dos portos e terminais brasileiros rumo ao cenário de não emissões de carbono, meta essa ratificada nas convenções mundiais acerca da preservação do planeta. Retiradas as providências obrigatórias, previstas em leis e nas condicionantes ambientais de licenças para instalar ou operar, nada de substancial e definitivo é realizado, apesar de aqui e ali surgirem ideias e planos pioneiros de sustentabilidade que, se perseguidos nos próximos anos, poderão resultar em ações efetivas.

No entanto, o tema veio para ficar. A Europa já iniciou processos de sustentabilidade na sua atividade produtiva visando alcançar a emissão zero de carbono até 2050, com metas transitórias ambiciosas para 2030. O ano de 2021 será marcado pelas discussões da COP 26, que trouxeram à pauta ambiental um salutar sentido de urgência. As decisões comuns a mais de 200 países que lá estiveram defendem a necessidade de “acelerar” (1) a transição energética para fontes limpas, e (2) os esforços para reduzir subsídios “ineficientes” a combustíveis fósseis e o uso de carvão que não use tecnologia de compensação de emissões.

Segundo a mídia especializada, “o texto estabelece a necessidade de redução global das emissões de dióxido de carbono em 45% até 2030, na comparação com 2010, e de neutralidade de liberação de CO2 até 2050 – quando emissões são reduzidas ao máximo e as restantes são totalmente compensadas por reflorestamento e tecnologias de captura de carbono da atmosfera”. Como parte desse processo, os países signatários já deverão apresentar em 2022 um plano de compromissos com a redução de gases que promovem o efeito estufa.

É urgente, pois, para nós brasileiros, discutir, definir e promover uma pauta de sustentabilidade de altíssimo nível, que sensibilize, ensine, planeje e promova ações de longo prazo visando tornar nossos entes produtivos, portos e terminais inclusive, em agentes não emissores de carbono e altamente engajados numa missão mundial de salvação do planeta.

E certamente tais ações não terão volta. Logo essas providências se tornarão indispensáveis na venda de produtos e serviços, na formação do preço, na captação de recursos de acionistas e na negociação de financiamento e empréstimos, além da inserção em programas governamentais sensíveis à questão ambiental. O caminho também exigirá respostas para temas difíceis e tabus que ainda permeiam a tomada de decisão de nossos executivos portuários. Sem pretender ser exaustivo, estão aqui alguns pontos importantes:

  1. Há no país uma manifesta má vontade com o tema, visto como um embaraço ao lucro e um empecilho ao crescimento econômico. Ao contrário, a sustentabilidade é indutora de novas receitas e de melhor qualidade de vida dessa e das próximas gerações. 
  2. A automação e a digitalização reduzem as emissões de carbono e deverão substituir tarefas demandadoras de combustíveis e materiais por tarefas digitais. Esse é um dos caminhos que terminais e autoridades portuárias precisam percorrer para a redução de danos ambientais.  
  3. A gestão de resíduos sólidos deve ser levada com seriedade e ter metas progressivas de não geração. Caso isso não seja possível em todos os pontos das cadeias produtivas, é necessário definir metas audaciosas de substituição de materiais, reciclagem e/ou geração de bioenergia.
  4. É indispensável definir metas que reduzam – e cheguem à extinção – a emissão de carbono de veículos e equipamentos. A substituição daqueles movidos a combustíveis fósseis por elétricos é, sem dúvida, uma primeira fase indispensável no processo de sustentabilidade portuária.
  5. Da mesma forma, é urgente a fixação de metas de redução de consumo de energia elétrica oriunda da rede pública em edifícios e galpões. O sítio portuário deve buscar sua autossuficiência energética com fontes renováveis (fotovoltaica, biocombustíveis e a geração eólica).
  6. É salutar o estímulo, através de políticas de descontos, à recepção e operação de navios que usem combustíveis verdes certificados. Até que isso ocorra, é indispensável a oferta de energias alternativas a navios ancorados, que permitam que aqueles que usem combustíveis convencionais possam reduzir ou zerar a emissão de poluentes enquanto estiverem no cais.
  7. Integração da comunidade portuária com a academia, a municipalidade e a sociedade local para que tenham a mesma percepção de importância e urgência da adoção de medidas ambientais de transição energética, promovendo ainda o necessário nivelamento do conhecimento, do reconhecimento das necessidades e dos desafios que precisam ser vencidos.

Dada a abrangência e multiplicidade das ações, é preciso que a comunidade de provedores e demandadores de serviços portuários elabore e execute, em parceria com as autoridades intervenientes (municipais, estaduais e federais), um plano estratégico que defina quais objetivos alcançar, seus cronogramas, estratégias e custos a compartilhar, promovendo-se, assim, a transição energética paulatina e a descarbonização da atividade. Trará melhores impactos e menores custos se não for deixada para amanhã.

*Augusto Wagner Padilha Martins é economista e consultor de empresas na área de logística. Exerceu diversas funções públicas, inclusive a de secretário-executivo e ministro interino de Portos, a presidência de conselhos de administração de autoridades portuárias e cargos diretivos em empresas privadas do setor portuário. 
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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