iNFRADebate: O setor de infraestrutura no novo Congresso

Matheus Junges*, Victor Hugo Figueiredo** e Tatiane Wildt***

A composição do Congresso Nacional é subsidiária para o desenvolvimento de políticas públicas relacionadas ao setor de infraestrutura. O momento de transição entre legislaturas é oportunidade para projeções quanto ao andamento de matérias e identificação de forças políticas relevantes. Neste artigo, a Coordenação de Infraestrutura da BMJ Consultores Associados analisa o potencial de discussão em torno da pauta em vista dos deputados federais e senadores que assumem mandato a partir de 2023.

Apesar da queda do índice de renovação a 39% – nas eleições de 2018 a taxa foi próxima a 50% –, parte significativa dos parlamentares atuantes nas pautas de infraestrutura renovaram mandato. Entretanto, o número de parlamentares que não lograram a renovação de mandato foi proporcionalmente maior entre os atuantes nos principais espaços de deliberação do setor no Poder Legislativo. Em relação aos nomes atualmente ligados à CVT (Comissão de Viação e Transportes) da Câmara dos Deputados, à CI (Comissão de Infraestrutura) do Senado Federal e à Frenlogi (Frente Parlamentar Mista de Logística de Transportes e Armazenagem), o índice de renovação ficou acima de 50%.

Cabe destaque às posições de liderança da CVT, CI e Frenlogi, haja vista que naturalmente detêm proeminência nas pautas em discussão no âmbito do Legislativo. O deputado Hildo Rocha (MDB-MA), atual presidente da CVT, não obteve sucesso na tentativa de conquista de um terceiro mandato consecutivo. O deputado Fábio Ramalho (MDB-MG), 2º vice-presidente da CVT, também não foi reeleito na disputa por um quinto mandato consecutivo. Em contrapartida, os deputados Hercílio Coelho Diniz (MDB-MG) e Hugo Leal (PSD-RJ), respectivos 1º e 3º vice-presidentes da CVT, renovaram mandato na Câmara; Leal ainda é vice-presidente da Frenlogi, que dentre os seis vice-presidentes ligados às câmaras temáticas que disputaram a eleição, cinco foram reeleitos.

Na CI, o senador Dário Berger (PSB-SC), presidente da comissão durante o biênio 2021-2022, não renovou seu primeiro mandato no Senado. Em outra frente, Berger é titular da Frenlogi, cujo atual presidente, Wellington Fagundes (PL-MT), também titular da CI, renovou seu primeiro mandato. Outros cinco vice-presidentes (geral e câmaras setoriais) da Frente também se reelegeram; apenas o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), vice-presidente da Câmara Temática Aeroportuária, não conquistou novo mandato.

Os senadores Wellington Fagundes e Dário Berger têm sido nomes-chave na tramitação do PL (Projeto de Lei) 2.646/2020, que dispõe sobre as debêntures de infraestrutura, uma das proposições de amplo interesse por parte do setor. Enquanto Berger apresentou as três últimas emendas à atual versão do PL, Fagundes é o relator no plenário no Senado, casa revisora do projeto. O senador mato-grossense prometeu entregar o relatório após o período eleitoral. Caso não haja avanços na tramitação até o fim da atual legislatura, o PL tende a continuar como prioridade em 2023, já que as debêntures de infraestrutura estão contempladas nos planos relacionados a investimentos no setor no governo Lula (PT). Ainda, destaca-se o papel do deputado federal João Maia (PL-RN), autor do projeto, que possui capacidade de articulação política e técnica, reeleito em outubro. Maia e Fagundes possuem outro trunfo: o crescimento expressivo de eleitos pelo partido, especialmente na Câmara, por conseguinte, capacidade ampla para compor coalizões.

Fagundes e Berger também compõem a autoria da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 1/2021, que determina que pelo menos 70% dos recursos obtidos com outorgas onerosas de obras e serviços de transportes aéreo, aquaviário e terrestre sejam reinvestidos no próprio setor. Enquanto Wellington é o primeiro signatário da PEC, Dário e outros senadores, como Jayme Campos (União-MT), que apresentou emenda ao texto e foi relator de plenário da proposta já encaminhada à Câmara. A PEC também deve ser prioridade na próxima legislatura, mas tende a avançar com dificuldade em virtude do nível de coesão requerida pelas regras de tramitação que se aplicam às PECs. A pressão de governadores que desejam realizar obras de grande porte nos próximos anos, como Rio de Janeiro, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais, também deve contribuir para o avanço da pauta.

No subsetor de infraestrutura marítimo-portuária, será necessário um esforço setorial para o engajamento dos parlamentares, sobretudo nas pautas de navegação. Conforme demonstrado durante a tramitação do PL 4.199/2020, o Programa “BR do Mar”, restou manifesta a dificuldade do Parlamento em tratar de temas como a navegação de cabotagem. O deputado Gurgel (PL-RJ), que foi relator da proposta e poderia criar alguma afinidade com o assunto, não conseguiu a reeleição. O deputado Hugo Leal, que costuma ter mais familiaridade com a pauta, não teve atuação tão preponderante como o esperado. Leal costuma defender o interesse da indústria naval, setor de grande importância para a sua base eleitoral no Rio de Janeiro. Leal tem realizado campanha junto aos deputados pela indicação à vaga aberta no TCU (Tribunal de Contas da União) e, caso eleito à Corte, o deputado Júlio Lopes (PP-RJ), vice-presidente da Comissão Temática de Portos da Frenlogi, e o senador Carlos Portinho (PL-RJ) devem concentrar a representação de interesses do setor a nível regional durante a próxima legislatura. Do lado do Senado Federal, o setor de navegação poderá contar ainda com o senador Nelsinho Trad (PSD-MS), que tem mandato até 2027 e, por ter relatado o PL 4.199/2020, tem familiaridade com o assunto.

Sob outro enfoque, o setor portuário poderá contar com representantes mais engajados. A exemplo da deputada Rosana Valle (PL-SP), que concentra a representação de interesses do setor portuário na região de Santos (SP), já que tem base eleitoral na cidade e conduz os trabalhos da FPM (Frente Parlamentar Mista) pelo Futuro do Porto de Santos. Enquanto Rosana logrou a renovação de seu primeiro mandato, o deputado Junior Bozzella (União-SP), que também defende pleitos da Baixada Santista, é membro da FPM dos Portos Nacionais e costuma ensejar debates sobre temas de infraestrutura portuária na Câmara, não foi reeleito. O deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), reeleito para seu quinto mandato na Câmara, também é membro da FPM pelo Futuro do Porto de Santos e tem conectado pautas do setor aos interesses do agronegócio.

Kátia Abreu (Progressistas-TO), referência dos senadores na tramitação do BR do Mar no Senado, não teve sucesso na disputa pelo novo mandato. Nelsinho e os demais parlamentares aqui citados que terão continuidade na próxima legislatura devem ter movimentações associadas a Paulo Alexandre Barbosa (PSDB-SP), deputado estadual por dois mandatos, ex-secretário estadual de Desenvolvimento de São Paulo e ex-prefeito de Santos (SP), agora eleito deputado federal, e que deverá ser um nome importante para o setor portuário na próxima legislatura.

Dentro do subsetor aeroviário, o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), vice-presidente da Câmara Temática Aeroportuária da Frenlogi, não foi reeleito. Jerônimo apresentou número significativo de emendas ao texto da Medida Provisória 1.089/2021 (Voo Simples), uma das poucas proposições recentes relacionadas ao setor aéreo, que tratou de processos e procedimentos relativos ao funcionamento do setor e à atuação da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil). O deputado General Peternelli (União-SP) e o senador Carlos Viana (PL-MG), relatores da MP do Voo Simples no Congresso, mesmo não tão atuantes em outras pautas do setor, não lograram sucesso nas eleições de 2022; Peternelli não renovou mandato e Carlos não foi eleito ao governo de Minas Gerais, mas segue com mandato até 2027. Assim como Carlos, o senador Paulo Paim (PT-RS), que apresentou emendas relacionadas ao regramento de investimentos internacionais e de relações trabalhistas aplicadas ao setor, também possui mais quatro anos de mandato.

Em relação ao subsetor ferroviário, o deputado Pedro Uczai (PT-SC), vice-presidente da Câmara Temática Ferroviária da Frenlogi, conquistou nas urnas um quarto mandato consecutivo. Apesar do pouco envolvimento com a pauta recentemente, a atuação de Pedro em proposições de interesse do setor terá a companhia dos deputados Zé Vitor (PL-MG), relator de plenário do PL 261/2018, sobre a exploração indireta, pela União, do transporte ferroviário em infraestruturas de propriedade privada, a autorização da autorregulação ferroviária, e a disciplina do trânsito e transporte ferroviário (Marco Legal Ferroviário); e de Wellington Fagundes, que apresentou diversas emendas ao texto ao longo da tramitação. No entanto, o senador Jean Paul Prates (PT-RN), também relator de plenário da proposição, não concorreu à renovação de seu primeiro mandato.

O deputado Cláudio Cajado (PP-BA), autor do projeto transformado na Lei 10.680/2003, que incluiu ferrovias na relação descritiva do Plano Nacional de Viação, teve êxito na eleição para um oitavo mandato na Câmara. Não há clareza quanto a outros parlamentares interessados na atuação em pautas de interesse do setor, principalmente dentre os novos congressistas na próxima legislatura do Congresso. Existe a possibilidade de que o avanço nos projetos de linhas férreas anunciados recentemente estimule a participação de representantes do Centro-Oeste, Sudeste e suas adjacências do Nordeste, regiões em que estes estão mais maduros.

Em relação ao subsetor rodoviário, o deputado Diego Andrade (PSD-MG), vice-presidente da CT Rodoviária da Frenlogi e titular da CVT, conquistou nas urnas seu quarto mandato consecutivo. O deputado Hildo Rocha, que, como citado anteriormente, é atual presidente da CVT e não foi reeleito, é relator do PL 510/2022, que dispõe sobre a permissão da exploração e administração de rodovias por meio do regime de autorização, de autoria do deputado Paulo Eduardo Martins (PL-PR). Paulo, que também é autor do PL 1.712/2022, que trata da criação de cota única de tributos relacionados à atividade das concessionárias de rodovias, não teve sucesso na corrida por uma cadeira no Senado nas eleições de 2022 e não estará no Congresso na próxima legislatura.

Ainda, os deputados Aliel Machado (PV-PR) e Filipe Barros (PL-PR), que vinham atuando na movimentação da pauta relacionada às cessões das rodovias paranaenses à iniciativa privada, renovaram seus mandatos. Outro parlamentar reeleito, que trabalha pela agenda de rodovias em seu estado é o deputado Carlos Chiodini (MDB-SC), titular e ex-presidente da CVT, que já declarou que priorizará atuação em pleitos relacionados às rodovias BR-280 e BR-101, que cortam o estado catarinense. Wellington Fagundes também teve destaque em movimentações relativas à BR-163 e deve continuar a trabalhar por interesses do setor de forma associada ao agronegócio.

Dentro do setor rodoviário, a categoria dos caminhoneiros tem ensejado a discussão de pautas de interesse por meio da participação de parlamentares como o deputado Fausto Pinato (PP-SP), reeleito para seu terceiro mandato consecutivo na Câmara. Por sua vez, o deputado Nereu Crispim (PSL-RS), presidente da FPM dos Caminhoneiros Autônomos e Celetistas, ocupa posição de suplente na próxima legislatura. A categoria certamente encontrará disposição para a defesa de seus interesses nas figuras dos deputados Delegado Éder Mauro (PL-PA), Antônio Carlos Rodrigues (PL-SP) e Zé Trovão (PL-SC), liderança da categoria que teve sucesso na conquista de uma cadeira na Câmara, ao contrário de Chorão Caminhoneiro (PSD-SP).

Em síntese, dentre os eleitos para a próxima legislatura, há um contingente de parlamentares que cumprirão mandatos inaugurais ou retornarão ao Legislativo Federal após terem passado por outros cargos na área de infraestrutura. Os deputados João Leão (PP-BA), Max Lemos (Pros-RJ), Cobalchini (MDB-SC) e Wilder Morais (PL-GO) foram secretários de Infraestrutura em seus estados, enquanto o deputado Coronel Chrisóstomo (PL-RO) foi secretário de Infraestrutura da cidade de Porto Velho (RO). Esses representantes também poderão tornar-se referência em discussões de projetos voltados à infraestrutura ao longo da próxima legislatura.

Visualiza-se que os parlamentares devem discutir pautas relacionadas ao setor de infraestrutura sob diferentes cenários ao longo da próxima legislatura. No decorrer de 2023, o Legislativo deve deslocar foco para propostas que tratam de alternativas de financiamento para a retomada de projetos de infraestrutura, da recuperação de orçamento para o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e de resgate das discussões sobre obras públicas paralisadas. Este último deve ganhar mais força, tendo em vista as ações da atual oposição atual do Governo. Estas são pautas de interesse público e privado, que encontraram resistência por parte do Executivo durante o governo de Jair Bolsonaro. O avanço em outras frentes dependerá das tratativas por um novo dispositivo de limitação de gastos públicos e da agenda do Executivo, que deve enfrentar a necessidade de priorização de investimentos dentro das áreas de infraestrutura, educação e saúde.

*Matheus Junges é consultor de Infraestrutura da BMJ Consultores Associados.
**Victor Hugo Figueiredo é consultor de Infraestrutura da BMJ Consultores Associados.
***Tatiane Wildt é coordenadora de Infraestrutura da BMJ Consultores Associados.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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