Gabriel Vasconcelos e Lais Carregosa, da Agência iNFRA
A Comissão Mista da MP (Medida Provisória) 1.291, que trata do fundo social do pré-sal, aprovou na terça-feira (24) o relatório do deputado José Priante (MDB-PA), incorporando ao texto o objeto do PL (Projeto de Lei) 2.632/2025: permitir ao governo leiloar, por meio da PPSA (Pré-Sal Petróleo S.A.), as participações da União relativas às chamadas áreas não contratadas dentro de campos unitizados.
O PL, de autoria do Executivo, tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados, com prazo para apreciação até 12 de julho, mas agora deve avançar dentro da MP, que tem de ser apreciada pelo Congresso até 3 de julho sob o risco de caducar.
O leilão da participação da União em campos de petróleo já produtivos é o pilar principal do pacote do MME (Ministério de Minas e Energia) para aumentar em R$ 35 bilhões a arrecadação federal, neste e no próximo ano. Segundo cálculos do governo, a medida, sozinha, deve render pelo menos R$ 15 bilhões. Esse montante varia conforme a atratividade do certame e, para Priante, deve superar expectativas.
“Segundo os ruins de matemática, essa matéria resultará numa arrecadação de uns R$ 20 bilhões, os que calculam melhor chegam a R$ 35 bilhões. Só isso já abafa um pouquinho aquela história do IOF”, disse o deputado. “Incorporamos [na MP] até porque o próprio projeto não ia ser bem-vindo no Congresso […] É uma matéria que dialoga direto com o pré-sal, com arrecadação”, explicou.
Antecipação de receitas futuras
Na prática, trata-se da antecipação de receitas futuras dos leilões de carga da PPSA, realizados periodicamente. O próximo, inclusive, envolve 74,5 milhões de barris de petróleo e ocorre nesta quinta-feira (26), na B3.
Nesse tipo de leilão da PPSA, comercializadoras (tradings) compram e recebem volumes de petróleo já produzidos, proporcionais à parcela da União em contratos de partilha (pré-sal) e aos percentuais da produção relativos às áreas não contratadas sob os chamados AIP (Acordos de Individualização da Produção). No novo modelo, não serão mais leiloadas cargas de petróleo da União, mas sua participação inteira.
Esses AIP ordenam a produção em áreas que não foram concedidas para a exploração e produção de petróleo por meio dos leilões tradicionais da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), mas que, por serem uma extensão geológica de jazidas já licitadas em regimes de concessão ou partilha, acabam anexadas a essas operações.
Os percentuais produtivos dessas áreas no todo são atribuídos à União por meio da PPSA. Os principais são: 3,5% de Mero; 0,6% de Tupi; e 0,95% de Atapu – todos campos da Bacia de Santos operados pela Petrobras em consórcio com outras petroleiras, na maioria das vezes, tendo Shell, TotalEnergies e Petrogal participações relevantes. As chinesas CNPC e CNOOC têm, cada uma, 9,65% de participação em Mero.
Leitura do mercado
Na avaliação do presidente do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás), Roberto Ardenghy, esse leilão das áreas não contratadas deve atrair principalmente as empresas que já atuam nas jazidas unitizadas, por já conhecerem a fundo o ativo e já terem realizado investimentos nas estruturas de produção.
“Se uma empresa de fora vencer esse leilão, vai ter de chegar pagando pelos sistemas de produção que estão lá proporcionalmente à participação adquirida”, disse. Agentes do setor ouvidos pela Agência iNFRA concordam que o pagamento à União, acrescido desse investimento inicial relacionado às instalações, tende a afugentar empresas estranhas às concessões.
Da perspectiva do governo, diz Ardenghy, a antecipação da venda futura de cargas vai impor um desconto no potencial de arrecadação das áreas, tornando-se o ônus da arrecadação extra.
Com relação ao impacto no calendário de leilões da PPSA, o presidente do IBP diz que não deve interferir nos leilões de carga, mas abre, sim, uma competição pelos investimentos das petroleiras potencialmente orientados para o leilão de partilha marcado para 22 de outubro.
Sócio da área de Infraestrutura e Energia do Mattos Filho, o advogado Giovani Loss reconhece a concorrência dos certames pelos investimentos das empresas, mas lembra que o leilão de partilha engloba um risco exploratório que as áreas não contratadas sob AIP não têm por já serem produtivas.
Para o advogado, a incorporação do PL do governo pela MP tornou o texto mais seguro juridicamente, por ter colocado de forma expressa que as empresas compradoras das participações não herdam as prerrogativas da PPSA e devem estar nas mesmas condições dos outros consorciados.
Loss observa, ainda, que o texto deixa aberta a porta para que o expediente dos leilões de participação se estendam às chamadas “áreas estratégicas”, o que pode ser atribuído a áreas já contratadas dentro do pré-sal, por exemplo, nas quais a União recebe uma fatia do óleo-lucro conforme fixado por oferta em leilão.
Isso já havia sido acrescentado pelo governo no PL original, que garantia ao CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) a prerrogativa de aplicar o mecanismo de leilão antecipado à parcela do óleo-lucro da União no pré-sal. “Na prática, se isso acontecer, pode levar a um esvaziamento gradativo das funções da PPSA”, diz Loss.