15/07/2025 | 09h00  •  Atualização: 15/07/2025 | 14h37

Nova MP e vetos das eólicas offshore derrubados criam regras conflitantes para PCHs

Foto: Enel

Marisa Wanzeller, Lais Carregosa e Geraldo Campos Jr., da Agência iNFRA

A MP (Medida Provisória) 1.304/2025, publicada na última sexta-feira (11), estabelece regras conflitantes com o Marco Legal das Eólicas Offshore, cujos vetos foram derrubados pelo Congresso. A contratação de PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas) está sendo disciplinada pelas duas normas de formas diferentes, dizem especialistas ouvidos pela Agência iNFRA. Segundo eles, o Congresso pode ter que arbitrar o conflito.

Os dispositivos contraditórios versam sobre o volume e locais de contratação dessas usinas. Os comandos estão no artigo 1º da Lei de Privatização da Eletrobras (Lei 14.182/2021), em parágrafos diferentes, que foram acrescentados pela MP 1.304/2025 e pela Lei das Eólicas Offshore (Lei 15.097/2025), com as alterações provocadas pela derrubada de vetos no Congresso Nacional, promulgada em 7 de julho.

Dessa forma, enquanto os parágrafos 1º e 19º preveem a contratação de 4,9 GW (gigawatts) de PCHs, sendo 3 GW em 2026 com entrega escalonada entre 2032 e 2034 – obedecendo a MP recém-publicada –, o parágrafo 14º do mesmo artigo determina que seja feita a contratação de PCHs seguindo montantes por regiões, com entregas até 2030, conforme determinado pela Lei das Eólicas Offshore.

Segundo especialistas, é preciso que o relator da MP no Congresso – ainda não designado – harmonize o artigo. Até lá, as normas vigentes ficam à mercê da interpretação da lei. O prazo de emendas à medida provisória se encerra nesta quinta-feira (17). 

“Zona cinza”
Consultor Legislativo do Senado Federal, Israel Lacerda ressalta que não há hierarquia entre os dispositivos. “Há uma zona cinza a se resolver, quer seja por interpretação ou por aperfeiçoamento legislativo”, disse à Agência iNFRA.

Com a vigência dos parágrafos conflitantes, o consultor pondera que o Poder Executivo pode implementar as determinações “da forma como ele interpretar, considerando as demais legislações”. 

Impacto tarifário
Gustavo De Marchi, sócio do Décio Freire Advogados, interpreta que há uma “revogação tácita” do parágrafo 14. Ou seja, embora a MP 1.304 não trate da revogação expressa do dispositivo inserido pela Lei das Eólicas Offshore, ela faz determinações incompatíveis com ele, ocasionando o afastamento da sua aplicação.

“A MP estabelece um limite para a contratação indicando o início do suprimento. Quando faz isso, ela limita o impacto tarifário e o posterga”, disse à Agência iNFRA.

Insegurança jurídica
O sócio do escritório Demarest Advogados, Henrique Reis, também vê a revogação tácita do trecho como uma interpretação possível, mas alerta que isso pode gerar insegurança jurídica. Ele defende que os dispositivos da lei sejam compatibilizados pela relatoria da MP 1.304 ou por uma nova lei. 

“Dá para fazer um esforço para compatibilizar o tema, então entendo que o Congresso vai ter que se manifestar”, afirmou à reportagem. “A revogação tácita gera uma certa insegurança e pode ser questionada, por exemplo, por donos de projetos que se beneficiariam com as PCHs locacionais.”

“A Medida Provisória poderia ter revogado ou então distribuído os montantes. Na minha visão, não teve essa intenção na MP de contratar PCH locacional, o que pode ser questionado”, continuou Reis. 

O advogado ressalta que os efeitos da incompatibilidade dos dispositivos não são imediatos, mas podem prejudicar o andamento dos processos previstos na MP, como a contratação de montantes já em 2026. Logo, o ponto deve ser mapeado pelo Congresso Nacional.

Reis também aponta que a aprovação de projeto de lei que derruba as contratações por regiões, previstas no Marco das Eólicas Offshore, também é uma possibilidade. Como o PL (Projeto de Lei) 3.112/2025, apresentado pela deputada Carolina de Toni (PL-SC) em 27 de junho. 

MP x Veto
A MP 1.304 reescreve o parágrafo primeiro do artigo 1º da Lei da Eletrobras, substituindo a aquisição de térmicas pela contratação de 4,9 GW (gigawatts) de PCHs. Ainda acrescenta os parágrafos 19º e 20º à lei prevendo a contratação da maior parte desse montante, 3 GW, já em 2026, com início de suprimento escalonado de 2032 a 2034. 
 
Já o veto promulgado pelo Congresso Nacional incorpora à Lei das Eólicas Offshore outro comando de alteração da Lei da Eletrobras, no parágrafo 14º: a contratação de 3 GW de PCHs do Centro Oeste; 1,5 GW das regiões Sul e Sudeste; e 400 MW das regiões Norte e Nordeste. As previsões de entrega estão entre 2029 e 2030.

Já o artigo 16º, também inserido pela Lei das Eólicas Offshore, prevê que a contratação dos montantes ocorra mesmo em caso de leilões vazios, com inexistência de oferta.

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