Novas regras da ANTT impactam transporte ferroviário de cargas

Felipe Alves Pacheco*

Muito aguardada pelos usuários do transporte ferroviário de cargas – grandes empresas que utilizam este modal para escoar sua produção –, a recém-publicada Resolução 6.031/2023, da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), regulamenta as “operações acessórias ao serviço de transporte ferroviário de cargas”.  E promete trazer maior segurança jurídica às relações comerciais e operacionais entre tais companhias e, principalmente, as concessionárias de ferrovias, além de coibir possíveis abusos.

A resolução conceitua as operações acessórias como “atividades complementares ao serviço de transporte ferroviário de cargas, para as quais se permite a cobrança de preço em virtude de sua execução”, a exemplo da manobra, carregamento e descarregamento, amarração, enlonamento, dentre outras.

Mesmo que complementares aos serviços de transporte ferroviário de cargas, tais operações têm tido elevado impacto financeiro no frete das mercadorias destinadas à exportação (chegaram a representar 35% do frete, de acordo com a ANTT), reduzindo a competitividade do produto brasileiro no exterior.

Tal fato chamou a atenção do TCU (Tribunal de Contas da União) em 2021, que apontou um possível excesso de cobrança por parte das concessionárias de ferrovias e, consequentemente, recomendou à ANTT a regulamentação das “operações acessórias”.

Conforme estudo disponibilizado pela agência em consulta pública realizada sobre o tema também em 2021, a receita das concessionárias com as operações acessórias havia crescido 172% entre 2012 e 2019, enquanto os respectivos custos no mesmo período sofreram redução de 22%.

Dentre as operações já conceituadas pela norma destaca-se a manobra, atividade bastante debatida entre usuários e concessionárias. A agência conceituou-a como a atividade de movimentação, agrupamento, desagrupamento ou reposicionamento de vagões e locomotivas ocorrida em terminais, estações ou pátios, com intuito de atendimento a necessidade específica do usuário.

De forma complementar, no art. 2°, parágrafo 2º e art. 4°, parágrafo 4º, o regulador foi assertivo ao deixar claro que somente será considerada “manobra” quando houver “uma necessidade específica do usuário”, ou seja, se ela for solicitada expressamente pelo usuário “em razão de particularidades do transporte”.

Assim, a partir de tais definições, manobras realizadas pelo provedor de operações acessórias em razão de uma infraestrutura insuficiente de seus pátios ou terminais, ou por eventual precariedade de seus vagões, por exemplo, não poderão ser cobradas do usuário.

As manobras realizadas pelo prestador de serviços em “pontos intermediários do fluxo de transporte” também não poderão ser objeto de cobrança dos usuários (art. 6°, inciso IX).

Importante notar que a resolução também traz um rol de atividades que não podem ser consideradas operações acessórias e, assim, ser cobradas dos usuários, como a manutenção de material rodante e a inspeção de segurança, o que trará maior compreensão da matéria pelos agentes regulados.

Com isso, o “excesso de cobranças” outrora constatado pelo TCU poderá ser mais bem monitorado e coibido pela ANTT e pelos usuários dos serviços de transporte de cargas.

Nesse sentido, no artigo 15 da resolução a agência traz expresso alerta aos provedores de operações acessórias quanto à vedação da “prática de preços abusivos”.

Até mesmo porque, diferentemente do serviço de transporte ferroviário de cargas – remunerado por tarifa e cujos limites máximos são homologados pela ANTT – as operações acessórias podem ter seus preços livremente pactuados entre o seu provedor e o usuário.

A ANTT ainda previu, no anexo da resolução, o IPOA (Indicador de Participação das Operações Acessórias) na receita de transporte de cada concessionária. Referido índice auxiliará a agência na fiscalização das operações acessórias, notadamente para coibir abusos nas cobranças de tais serviços.

Caso sejam constatados indícios de prática abusiva, prevê a norma que os casos deverão ser encaminhados ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), além da instauração de procedimento específico de apuração pela própria Agência, que poderá resultar em sanções administrativas.

A norma também prevê que a ANTT poderá ser acionada pelos usuários para atuar via mediação ou arbitragem nos assuntos não resolvidos entre as partes.

Espera-se, assim, que a nova regulamentação traga maior segurança jurídica aos usuários, transparência e efetiva fiscalização e monitoramento, pela Agência, dos provedores de operações acessórias — concessionárias, subconcessionárias, ATFs (Agentes Transportadores Ferroviários) e as empresas que se enquadrem como partes relacionadas às concessionárias.

E, em breve, espera-se que novos players surjam nesse novo nicho de mercado, para que as operações acessórias deixem de se concentrar nas mãos das concessionárias de ferrovias e empresas pertencentes aos seus grupos econômicos, reduzindo os custos para os usuários e, consequentemente, do produto ao seu destinatário final.

*Felipe Alves Pacheco é sócio do Chenut Oliveira Santiago Advogados e especialista em Direito Público.
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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