Amanda Pupo, da Agência iNFRA
O TCU (Tribunal de Contas da União) aprovou na quarta-feira (5) novas regras para os processos de solução consensual que tramitam na corte, atuação criada em 2022, que, no setor de infraestrutura, abriu espaço para repactuações de diversos ativos problemáticos. Com a nova versão da IN (Instrução Normativa) 91/2022, a corte buscou aparar uma série de arestas que, na experiência prática das negociações, acabaram gerando algum grau de ruído e maior complexidade no fechamento dos acordos.
A redação atualizada traz mais detalhes sobre ritos e prazos, responde a reclamações sobre a admissibilidade de pedidos, aumenta a participação social e prevê mais exigências aos requerimentos que chegam à SecexConsenso do tribunal. Entre as novidades estão prazos específicos para procedimentos que são feitos na comissão de solução consensual depois que seus integrantes fecham a proposta de acordo.
Não houve alteração do período de até 120 dias para a elaboração da proposta. Ficou especificado, por sua vez, que, após esse prazo, as partes terão até 15 dias para se manifestarem com pareceres técnico e jurídico. Segundo apurou a Agência iNFRA, esse período servirá para formalizar o aval à redação pelo ministro do Estado, pela agência responsável e pelo conselho da empresa envolvida.
A norma antiga não estipulava um prazo para isso, mas a SecexConsenso vinha dando 15 dias para essa etapa – que inclui, por exemplo, o aval da diretoria da agência reguladora. As partes, contudo, pedem prorrogações que acabam sendo concedidas. A nova IN não deixa expressa essa possibilidade, mas também não diz que o período é improrrogável.
Os pedidos de mais prazo vêm sendo feitos tanto pelas áreas públicas como pelos atores privados – já que, por exemplo, acontece muitas vezes de controladores de companhias que renegociam contratos estarem fora do país e exigirem uma governança para esses assuntos tramitarem internamente.
“A medida [prazo de 15 dias para manifestação] garante que a proposta de acordo chegue ao Plenário do TCU com chancela formal da governança decisória dos órgãos e entidades envolvidos, respeitando suas respectivas competências. Ademais, ao exigir a juntada dos pareceres que fundamentem a anuência, a norma sana deficiência observada em casos pretéritos nos quais a aprovação era comunicada sem a devida documentação de suporte”, afirmou em seu voto o ministro Jhonatan de Jesus, que relatou a atualização da IN 91/2022.
Após o recebimento dessas posições, a unidade de auditoria especializada na temática terá cinco dias para análise, além de dez dias para a SecexConsenso emitir sua manifestação e consolidar todos os pareceres e manifestações recebidos.
Orçamento de obras
Já uma das novas obrigações para os requerimentos que chegam ao TCU diz respeito diretamente ao setor de infraestrutura. A nova IN define que, quando a solicitação de solução consensual contemplar indicações de investimentos em obras, o pedido deverá ser acompanhado de três elementos.
São eles: justificativa técnica para cada obra, incluindo a demonstração de seu alinhamento ao planejamento setorial e a priorização do conjunto de investimentos com base em critérios objetivos de custo-benefício; o anteprojeto de engenharia ou elementos de projeto básico que permitam a plena caracterização da obra, além de orçamento referenciado por sistemas de custos oficiais ou por preços de mercado devidamente justificados; e estudo de cenários que demonstre a correlação entre investimentos, prazo contratual e impacto tarifário.
A nova regra ataca um problema já expressado por ministros em julgamento de acordos de repactuações de rodovias, como mostrou a Agência iNFRA. Na negociação relativa a Arteris Fernão Dias, por exemplo, houve grande discussão entre os envolvidos justamente porque havia divergência sobre os valores de investimentos apresentados pela concessionária.
As negociações na CSC (Comissão de Solução Consensual) levaram a uma redução expressiva dos montantes, mas a avaliação dentro da corte é de que esses debates poderiam ser abreviados se as propostas chegassem de forma mais consistente ao tribunal.
A avaliação foi reforçada pelo relator. “Ao demandar, desde logo, orçamento referenciado e estudo de cenários (incisos II e III), mitiga-se a assimetria informacional e evita-se que a negociação parta de premissas infladas ou mal definidas”, escreveu. Outra novidade diretamente relacionada à infraestrutura é a previsão de que o tribunal poderá, ao analisar processos de tomada de contas especial, incentivar a adoção de solução consensual em certos casos que cuidam de obras paralisadas e inoperantes.
Admissão
Outro ponto que já afetou casos do setor é a regra de admissão de uma solução consensual. Pela redação antiga, se não houvesse a admissão de algum ministro que tenha processos sobre o tema, o pedido de negociação tinha de ser arquivado. Foi o que enterrou as chances de uma repactuação da Malha Oeste, operada pela Rumo, já que o ministro Aroldo Cedraz rejeitou o requerimento do governo.
Na nova IN, se o ministro em questão não ratificar a decisão do presidente do TCU de admitir um caso, a presidência pode reformar seu despacho ou levá-lo a referendo do plenário, com todos os ministros. “No âmbito dos workshops realizados pela SecexConsenso, ficou claro que a impossibilidade de recorrer de decisões pela inadmissibilidade é ponto sensível que precisa ser equacionado”, observou Jhonatan de Jesus.
Condicionantes do plenário
Mais uma novidade relevante para o setor é a que permite que o acórdão do TCU nas soluções consensuais possa ser alvo do chamado embargo de declaração, uma espécie de recurso que tenta esclarecer dúvidas sobre a redação do que foi decidido pelos ministros.
Ele poderá ser apresentado somente nos julgamentos nos quais o tribunal tenha imposto alguma condicionante para a validade do acordo. Há vários casos no mercado de infraestrutura, em especial de rodovias, que os ministros condicionaram o avanço da solução consensual a algumas mudanças no que foi negociado dentro da CSC.
A situação remete, por exemplo, ao que aconteceu na repactuação da Autopista Fluminense. Em outubro de 2024, o tribunal analisou o acordo e impôs uma série de condicionantes para sua assinatura. O caso voltou ao plenário somente em julho deste ano, sendo que, na maioria dos apontamentos, o TCU acatou as justificativas que foram apresentadas pelo governo, pela agência e pela concessionária, levando a ajustes marginais na modelagem do novo contrato.
“O escopo dos aclaratórios, reitero, será rigorosamente limitado a sanar vícios de clareza na redação das condicionantes, sendo manifestamente incabível o apelo para rediscutir o mérito do acordo ou das próprias condições”, afirmou Jhonatan de Jesus. A nova redação também deixa expresso um rito de fechamento para as hipóteses em que o plenário sugere alterações ao acordo.
O novo fluxo assegura, primeiramente, que a SecexConsenso, junto às demais unidades, examine a conformidade das alterações e prepare a versão final do termo de autocomposição. Em seguida, prevê nova manifestação do MPTCU (Ministério Público de Contas) caso as alterações tenham sido substantivas. O rito culmina com a submissão do termo final ao plenário, que autorizará a assinatura.
Estatais
O tribunal também ampliou o escopo de órgãos que podem pedir soluções consensuais, incluindo agora os dirigentes máximos de todas as empresas estatais. O presidente do TCU, Vital do Rêgo, indicou que a Petrobras estava aguardando a atualização da IN para apresentar pedidos à corte de contas. Segundo ele, há uma fila “importante” de processos que o novo normativo vai destravar, mencionando a petroleira e, por exemplo, os litígios no campo de Tupi.
Por sugestão de Vital, a atualização da norma também absorveu novas regras de participação social e transparência. Uma das recomendações da SecexConsenso, acatada na proposta, é de que o requerimento inicial passará a ser público por padrão – ressalvadas as peças justificadamente sigilosas.
Guarulhos
O TCU também julgou processo de acompanhamento da implementação do APM (Automated People Mover), entre a Estação Aeroporto da Linha 13-Jade da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e o Aeroporto de Guarulhos (SP), cuja entrega está atrasada, já tendo sido postergada quatro vezes, desde fevereiro de 2024.
Apesar disso, o TCU entendeu que não seria necessária uma atuação mais assertiva nesse momento, uma vez que a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) já está acompanhando eventuais irregularidades. A corte decidiu apenas restituir os autos à AudRodoviaAviação para que, em fevereiro de 2026, em nova etapa do acompanhamento, elucide, por exemplo, o andamento do processo de certificação e a previsão atualizada de conclusão e início das atividades.








