Opinião

Opinião – A quem interessa a resiliência climática nas rodovias?

Monica Jaen*

O Ministério dos Transportes publicou a Portaria 622/2024 que trata sobre resiliência climática. O documento traz diretrizes que poderão resultar em mais segurança jurídica para a realização de investimentos necessários à adaptação da infraestrutura frente às mudanças climáticas.

Lamentavelmente, são medidas que se mostraram ainda mais urgentes após as enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul, exigindo agora elevados recursos para a reconstrução dos trechos de rodovias afetados – o governo do Rio Grande do Sul estima essa despesa em, ao menos, de R$ 3 bilhões.

Diante do cenário traçado cientificamente, de que os eventos climáticos serão mais frequentes e intensos, a adequação das rodovias tende a evitar perdas e aumentar a rentabilidade da concessão no longo prazo, desde que devidamente previstos ou incorporados aos contratos de concessão.

E esse é o espírito da nova portaria que determina que nos novos projetos de concessões rodoviárias deve constar a previsão de se destinar, no mínimo, 1% da receita bruta para o desenvolvimento de infraestrutura resiliente.

Mesmo antes da publicação da portaria em questão, o governo federal já vinha incluindo capítulos ESG (Environmental, Social and Governance ou Ambiental, Social e Governança) em editais recentes, como o do sistema rodoviário BR-381/MG e da Rota dos Cristais (BR-040/GO/MG).

Para as concessões existentes, segundo a portaria, fica a cargo da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) realizar estudos técnicos, por meio das concessionárias, para identificar áreas vulneráveis e mapear necessidades de ações de forma a incluir novos investimentos, não previstos nos contratos.

As concessionárias de rodovias já se dedicam em estudos de impactos climáticos e em soluções mais apropriadas de infraestrutura por diversos motivos, mas há outros agentes cuja resiliência climática da malha viária também interessa.

De grande importância, falemos dos agentes financiadores. Os bancos e fundos que investem no setor estão cada vez mais seletivos e incorporam esses aspectos de riscos ambientais em suas avaliações de crédito e investimento, ainda que precisem priorizar e evoluir nos financiamentos para a adaptação climática da infraestrutura rodoviária.

O World Bank já destacou publicamente a necessidade de assegurar que condições relacionadas às mudanças climáticas sejam identificadas e consideradas durante o desenvolvimento, desenho e implementação de cada PPP (Parceria Pública Privada).

Mas, o que na prática o setor privado pode fazer para atender a urgência social e as demandas de mercado por respostas às mudanças climáticas? No Brasil, devido aos recursos limitados e à falta de previsão inicial sobre os impactos iminentes das mudanças climáticas, os projetos sempre foram pensados para reduzir ao máximo a presença de obras como pontes e túneis.

Como consequência, os percursos são sinuosos, com muitas escavações e aterros, aumentando a exposição a eventos climáticos, principalmente chuvas torrenciais que podem provocar deslizamentos e enchentes.

Considerando isso, entendo que as obras de adaptações da infraestrutura atual, como alteamento de pontes e contenções de taludes, sejam tão urgentes quanto as previsões em novos projetos. Porém, como define a Portaria 622/2024, é necessário o justo equilíbrio contratual para a realização desses investimentos.

Hoje é possível identificar áreas de maior risco que precisam ser priorizadas e incluídas no planejamento estratégico das concessionárias de forma a aumentar a resiliência dos ativos.

Do ponto de vista de novos contratos de concessão, além da destinação de parte da receita bruta para a resiliência climática, penso ser importante considerar ainda previsão de uso de parte dos recursos vinculados, em especial os valores advindos do pagamento de outorga para a execução de medidas sustentáveis e descontos progressivos, proporcionais ao volume de investimentos realizados em sustentabilidade nos novos contratos.

Vale ressaltar ainda que as concessionárias têm ingerência de ação somente dentro da sua área de responsabilidade contratual, não conseguindo atuar em problemas que venham de fora, como é o caso de barragens de empreendimentos localizados próximas da rodovia ou ocupações irregulares.

Como consequência, um plano de adaptação verdadeiramente eficaz deve envolver outros sujeitos como o Poder Concedente, a União, os Estados e os Municípios.

Em resumo, as recentes iniciativas dos setores público e privado devem se complementar e convergir para um objetivo comum: garantir a sustentabilidade e a resiliência das infraestruturas rodoviárias em face dos crescentes desafios climáticos. A implementação eficaz das diretrizes da Portaria 622/2024 é crucial para preparar nossas rodovias para um futuro mais seguro e sustentável que permita a continuidade da contribuição do setor para o crescimento econômico do país.

*Monica Jaen é advogada ambiental e bióloga, mestre em direito, e diretora de sustentabilidade no Grupo EcoRodovias.
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto

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