da Agência iNFRA
Há espaço para ampliar a infraestrutura nacional, desde que medidas sejam tomadas para propiciar as condições adequadas para os investimentos. É o que indicaram os palestrantes do painel “Diagnóstico do Setor Portuário – Impacto das Restrições da Capacidade Portuária nos Custos e na Eficiência Logística do País”, do SUMMIT PORTOS 2022, realizado na última quinta-feira (1º) em São Paulo.
O consultor Gesner Oliveira mostrou dados para embasar os argumentos. Ele destacou que o percentual brasileiro de investimento em infraestrutura é pequeno em relação a outros países. Segundo dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o Brasil aplicou 2,2% do PIB, na média dos últimos 20 anos, frente à média mundial de 3,8%; e de 4,7% na Índia e 8,5% na China. Professor na FGV (Fundação Getulio Vargas), o economista contou que o Brasil já investiu mais de 5% do PIB na área nos anos 1970.
Oliveira ainda apresentou números da Abdib (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base) que revelam que as áreas de transporte e logística representam a maior lacuna, atrás inclusive de saneamento, energia elétrica e telecomunicações. Para o economista, os dados apontam para a importância do investimento privado e para a segurança jurídica, principalmente num cenário de queda de investimento público.
A impossibilidade de receber navios com mais de 12 mil TEUs, aponta Oliveira, complica a situação brasileira. “Quando houver melhora na economia, o Brasil precisará estar preparado”, comentou. Ele também lamentou que o país não seja incluído nas principais rotas comerciais marítimas mundiais. “De certa forma, estamos fora do jogo”, pontuou. E ainda acrescentou que o maior porto brasileiro, o de Santos, conta com investimentos muito aquém do necessário.
Como a saída estaria no setor privado, Oliveira mencionou a necessidade de incentivar mais participantes no mercado. “Ocorre a queda de preços por TEU com mais players”, disse. Ele citou o exemplo do porto de Santos, em que o custo por movimentação ficava na faixa de US$ 300 por TEU no início dos anos 2010 e caiu para a casa de US$ 100 em períodos mais recentes. E para propiciar estruturas mais sólidas e competitivas, o economista defendeu a atuação integral. “A integração vertical não deve ser demonizada”, afirmou, analisando que ela é capaz de gerar eficiência.
Competitividade
O superintendente-geral do Cade (Conselho Administrativo do Desenvolvimento Econômico), Alexandre Barreto, fez questão de dizer que o órgão, que pode ser considerado um “xerife da concorrência”, preza pela intervenção mínima e que não é, de saída, contrário à integração vertical, mas que cada caso precisa ser analisado para não impedir a participação de competidores. Para ele, o fundamental é ter um ambiente de segurança jurídica, com previsibilidade e decisões técnicas.
Barreto lembrou que a área de infraestrutura é regulada, e que demanda atuação coordenada com outros órgãos estatais. Nesse sentido, disse que é indesejável que ocorram decisões divergentes, capazes de trazer dúvidas para o mercado. No setor, o Cade também se ocupa de outros pontos polêmicos, como sobreposição horizontal entre terminais e cobrança de segregação e entrega. “Nossas ações devem ser previsíveis, transparentes e técnicas”, disse.
No setor portuário, destacou o superintendente, há uma sintonia do Cade com a ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários). Um dos exemplos foi a proposta do novo terminal de contêineres de Santos, o STS10, que está em fase de estudo para concessão.
Barreto evitou falar sobre a aprovação do novo terminal de contêiner de Santos. Ele disse que o Cade contribuiu para o edital do STS10 e que o órgão foi mal compreendido em dois documentos técnicos. O Cade, segundo o superintendente, atua para evitar a concentração excessiva, a criação de barreiras de entrada e fechamento de mercados e atua em casos concretos.
Assim, destacou que o órgão não é contrário, de saída, à criação de um novo terminal de contêineres nem à integração vertical, mas que precisa se preocupar de não impedir a atuação de outros players. Em especial, em sobreposições horizontais, que têm potencial de provocar problemas para a concorrência. Em concreto, sobre o STS10, o Cade foi provocado a se manifestar e não conheceu o pedido.
Morosidade
A discussão sobre concorrência e atendimento da demanda também esteve presente na fala do diretor-geral da ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), Eduardo Nery. Ele citou casos estrangeiros, como o de Rotterdam, na Holanda, em que muito antes de a demanda se apresentar os planejamentos e execuções são realizados para se preparar para as necessidades futuras. “Aqui esperamos. Ainda estamos discutindo se vamos oferecer ou não”, lamentou Nery.
O diretor-geral da ANTAQ frisou que a área de contêineres de Santos opera com quase 90% de capacidade, sendo que uma ocupação na faixa de 65% já seria alta. Mas ele salientou que, ainda assim, há todo um desgaste em um processo de convencimento sobre a necessidade. A elaboração do projeto da concessão do STS10, que estaria em vias de ser encaminhado, contou ele, foi baseada não em narrativas, mas em dados e argumentos. Nery comentou que atualmente as estruturas estatais funcionam como um catalisador de insegurança jurídica, mas que é preciso deixar de lado “as vaidades institucionais”. Sobre o STS10 em especial, citou que o Cade é a autoridade concorrencial, mas que respeita o conhecimento trazido pela ANTAQ.
Nery explicou que, embora Santos esteja experienciando uma boa fase, com dinheiro em caixa, não consegue fazer os investimentos necessários e se adequar às expectativas. O diagnóstico é de que a máquina pública se move em ritmo demasiadamente lento, incompatível com as exigências do setor, principalmente em função dos prazos para compras e licitações.
Mesmo um arrendamento simplificado, que só pode ser aplicado em alguns casos, leva seis meses. Nery destacou que Santos está sem acesso aquaviário adequado e sem berços de atracação em número suficiente. De certa forma, o diretor-geral justificou o caminho até a decisão de optar pela desestatização.
Falta de preparação
Essa morosidade e o abismo entre a oferta de serviços e a necessidade foram alvos de comentários do coordenador de assuntos logísticos da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), José Perboyre Ferreira Gomes. Os associados da entidade exportam 230 mil contêineres por ano, para 150 países, e enfrentam no cotidiano os empecilhos e os gargalos do setor portuário.
“A pandemia de Covid-19 mostrou a necessidade de se antecipar à demanda. Como vamos escoar a produção nos próximos anos?”, questionou.
Ele lembrou que os principais investimentos dos armadores são em meganavios, de 25 mil TEUs, mas os portos brasileiros não estão preparados para essa frota mercantil. O coordenador da ABPA ainda citou as dificuldades tarifárias. Um levantamento da entidade apontou que existem 105 tarifas sendo praticadas nos portos brasileiros e a sugestão seria de que fossem, no máximo, 48 tipos. “Além disso, um porto cobra e outro não, com algumas cobranças subjetivas”, destacou.