Eduardo Carvalhaes, Karen Coutinho e Giovanna Malavolta*
Edital da sexta rodada muda substancialmente as condições de habilitação técnica exigidas nos certames anteriores.
A operação da infraestrutura aeroportuária brasileira passou por diversas mudanças e aprimoramentos na última década. A Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária) foi a principal responsável pelo encargo durante quase 40 anos, administrando mais de 60 aeroportos espalhados por todo território nacional. O início das concessões à iniciativa privada por parte do Governo Federal, em 2011, começou a mudar esse cenário.
Nas cinco rodadas de leilões promovidas até agora pela ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) e pelos entes federais responsáveis pela regulação desse mercado, foram concedidos 22 aeroportos. Já foram anunciadas mais duas rodadas neste ano, encerrando a década de um grande primeiro ciclo de concessões.
Para a sexta rodada, foi prevista a concessão de mais 22 aeroportos separados em três blocos (Sul, Norte e Central). A sétima rodada, por sua vez, incluirá importantes aeroportos que são vistos como a joia da coroa: Congonhas (SP) e Santos Dumont (RJ) – que juntos compõem a quarta rota doméstica mais movimentada do mundo, com quase 40 mil voos anuais. Ainda estão programadas as relicitações de Viracopos (SP) e São Gonçalo do Amarante (RN).
Apesar de o setor aeroportuário ter sido um dos mais afetados pela pandemia da Covid-19, o Governo Federal mantém a agenda de concessões. Considerando que os grandes operadores aeroportuários passaram recentemente pelo debate inicial sobre o reequilíbrio econômico-financeiro de seus contratos de concessão no Brasil e, mundo afora, buscam se recuperar da grave crise econômica que assola o setor, cabe questionar: quem conseguirá investir nas concessões que estão por vir?
É nesse contexto que, dentre as regras para a sexta rodada, foi reavaliada a vedação da participação de não operadores aeroportuários nos leilões. Enquanto fundos de investimento em infraestrutura defendiam que não há prejuízo em sua participação nos certames, já que a expertise técnica poderia ser obtida no mercado por meio de contratação de serviço ou assessoria, a ANAC e os operadores vinham apresentando bastante resistência a essa possibilidade.
Em que pese o aumento inquestionável de competitividade, para as autoridades pairava a dúvida sobre a boa gestão dos projetos por investidores sem experiência comprovada em um setor sofisticado, mais complexo do que outros mercados de infraestrutura regulada e com íntima relação com protocolos de segurança. Ou seja, o principal questionamento era se esta mudança afetaria a qualidade dos serviços, especialmente considerada a imaturidade das primeiras concessões outorgadas no setor.
Até a quinta rodada, os requisitos de habilitação técnica para a participação nos leilões determinavam que a proponente fosse operadora aeroportuária com experiência específica, ou que, em caso de consórcio, ao menos uma das consorciadas atendesse integralmente à exigência e possuísse, obrigatoriamente, pelo menos 15% de participação no consórcio. Ou seja, o operador aeroportuário necessariamente deveria ser acionista da futura concessionária.
O edital da sexta rodada foi publicado no dia 18 de dezembro, mudando substancialmente as condições de habilitação técnica exigidas nas rodadas anteriores. Em sessão plenária do último dia 8, o TCU (Tribunal de Contas da União) não só deu seu aval para a participação de proponente que não seja operador aeroportuário, como sugeriu o aprimoramento das cláusulas editalícias que disciplinavam o tema para evitar que potenciais interessados fossem indevidamente afastados.
O edital, seguindo as orientações do TCU, determina que o proponente que não seja operador aeroportuário deve apresentar compromisso de contratação de assistência técnica às operações aeroportuárias. Além disso, o edital traz rol exemplificativo de atividades que fazem parte do conceito de “assistência técnica”, dispõe que a contratação do operador aeroportuário é condição prévia à assinatura do contrato de concessão e prevê, ainda, que a rescisão desse contrato depende de anuência prévia da ANAC.
O governo espera aumentar consideravelmente a competitividade do leilão e, consequentemente, o valor de ágio, com a participação isolada de fundos de investimentos em infraestrutura sem a necessidade de consórcio com operadores aeroportuários. Sem dúvida, essa inovação abre caminhos para a mudança de perfil dos participantes e ocorre em momento no qual reconhecidamente o setor de infraestrutura aeroportuária no Brasil é tido como maduro, diante dos muitos aperfeiçoamentos realizados pela ANAC ao longo das rodadas de concessão.
De um ponto de vista otimista, esse modelo permitirá que os grandes operadores nacionais e estrangeiros continuem sendo parte do avanço das concessões aeroportuárias no Brasil, seja por meio de equity – para os que estarão dispostos a investir já no ano que vem –, seja por meio de prestação de serviços que lhes garanta receita financeira. Por outro lado, nesse novo modelo, os fundos de investimento têm o enorme desafio de garantir que a administração dos terminais não será comprometida e que o alto nível de serviço que os aeroportos privatizados entregam seja garantido.
A participação desses agentes já é relevante em setores como energia elétrica e pode ser, quem sabe, o futuro da infraestrutura aeroportuária brasileira. O leilão da sexta rodada está previsto para ocorrer em 7 de abril de 2021.