Nestor Rabello, da Agência iNFRA
A negociação de contratos de geração entre a Amazonas Energia e PIEs (Produtores Independentes de Energia) de Manaus, com passivos que chegam a R$ 850 milhões, deve chegar a uma resolução nas próximas semanas, segundo o presidente do Conselho de Administração da distribuidora, Gustavo de Marchi.
“A solução depende de vários atores, mas estou confiante que chegaremos a um bom termo após análise da ANEEL [Agência Nacional de Energia Elétrica] de algumas questões sensíveis para o desfecho do assunto. Acredito que nas próximas semanas teremos uma definição, pois as discussões estão bastante avançadas”, disse Marchi, em entrevista à Agência iNFRA.
Esse avanço ocorre na esteira da sanção da Lei 14.146/2021 (oriunda da chamada “MP do Amapá”), nesta semana, em que uma emenda permitiu o reconhecimento da difícil situação financeira da distribuidora como fruto de uma sobrecontratação involuntária – definida por Marchi como “estrutural” – e também que o ônus do custo da geração local da Amazonas Energia seja suportado pela CCC (Conta de Consumo de Combustíveis).
“Houve um movimento muito forte para o veto, mas conseguimos manter aquele dispositivo, fundamental para a Amazonas Energia”, disse Marchi. “Sem essa solução, não conseguimos viabilizar a concessão no Amazonas. Diria até impossível. Não há gestão, não há governança ou qualquer outra questão que pudesse minimamente fazer frente a tamanho impacto”, completou.
ANEEL faz ajustes
A solução para a sobrecontratação da companhia passa pela renegociação dos contratos de geração térmica com os produtores e são mediadas pela ANEEL. Há um consenso para que os pagamentos sejam parcelados, pagos após uma carência e feitos de forma casada com os recursos que virão da CCC. Em outra perna, negocia-se que os contratos com as geradoras deixem de ser 100% inflexíveis, como é o caso hoje.
Resta somente definir aspectos da operação, como qual será o cronograma de pagamentos dessa dívida, a qual o executivo classifica como “extremamente impactante” e que não para de crescer. “Estamos tratando agora dos ‘pormenores’. Há um descasamento em relação ao dispêndio e cobertura [pela CCC], o que gera efeito financeiro de caixa grave para a Amazonas Energia”, salientou.
A necessidade de se ajustar o fluxo de pagamentos acontece porque a agência determina que o valor apurado da sobrecontratação será reembolsado em 12 parcelas, e somente após a homologação no processo tarifário.
A distribuidora, contudo, não dispõe desse tempo: “Mesmo que haja o reconhecimento econômico do valor, o efeito financeiro é muito grande, […] tem de haver uma concatenação da periodicidade desses pagamentos, de modo a mitigar os efeitos financeiros da sobrecontratação”, diz. “São essas correções que contamos com a sensibilidade do regulador para avançar”, pontuou.
Ajuda importante
A Amazonas Energia foi privatizada em 2017, como parte do grupo de distribuidoras do Norte e Nordeste que estavam sob designação da Eletrobras. Foi arrematada pelo grupo Oliveira Energia. A sobrecontratação involuntária da empresa veio como uma “herança maldita”, classificou o executivo, por conta da desverticalização da Amazonas GT, ocorrida um ano após a privatização.
Esse contexto sensibilizou o MME (Ministério de Minas e Energia) a contribuir para a resolução do imbróglio. “A secretária Marisete [do MME] foi fundamental para a aprovação daquele dispositivo da Lei 14.146, que reconheceu o que chamamos de sobrecontratação estrutural da Amazonas Energia. É diferente da sobrecontratação conjuntural das outras distribuidoras”, apontou.
“Foi uma situação decorrente de um arranjo necessário para a desverticalização da Amazonas GT e a alienação da própria distribuidora. Isso tudo gerou consequências, de realocação e preservação de contatos, e o ônus ficou com a distribuidora. É uma herança maldita, que persiste no tempo e gera um ônus insuportável”, ressaltou.
Segundo Marchi, as conversas iniciais para um acordo não foram fáceis: “Começou tumultuado, desordenado, até por conta da complexidade e dificuldade do tema. Mas essa nova gestão da Amazonas Energia, o novo corpo diretivo, imprimiu outra dinâmica”.
“É uma arquitetura bastante interessante [no âmbito do acordo], que vai permitir eficiência para esse processo. Lembrando que temos que respeitar contratos. […] Se você matar a distribuidora, ela morre, mas vai deixar muita gente a ver navios também”, acrescentou.
Outras medidas
Além da emenda aprovada ao longo da tramitação da MP do Amapá, a Amazonas Energia contou também com a MP (Medida Provisória) 998, transformada na Lei 14.120/2021, para reforçar o objetivo de reestruturar a companhia.
A lei traz um dispositivo que dá mais cinco anos para que algumas distribuidoras do Norte recém-privatizadas – entre elas a Amazonas Energia – atinjam os parâmetros de eficiência econômica e financeira estabelecidos para a concessão, algo que seria “impossível” de realizar sem a ajuda da nova legislação, segundo Marchi.