Dimmi Amora, da Agência iNFRA
A diretoria da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) decidiu na última quinta-feira (17) opinar pela decretação da caducidade da concessão da BR-393/RJ, administrada pela empresa K-Infra desde 2018.
O relator do processo, diretor Davi Barreto, afirmou que “os mecanismos de enforcement são insuficientes para fazer a concessionária cumprir qualquer tipo de acordo”. A decisão dos diretores foi unânime e a sessão pode ser vista neste link. A deliberação foi publicada na sexta-feira (18) no DOU (Diário Oficial da União) (neste link).
As multas por inadimplemento da concessão, que descumpriu segundo ele “todos os planos” da agência para que ela cumprisse com as obrigações do contrato, podem passar dos R$ 800 milhões, o que seria maior até que o valor declarado de investimentos a serem amortizados da concessão em caso de caducidade, cerca de R$ 640 milhões (que ainda vão passar por revisão).
Segundo Barreto, já há R$ 100 milhões em multas transitadas em julgado, ou seja, para as quais a concessionária não tem mais como recorrer. O valor é superior ao faturamento de um ano da concessão, disse o diretor.
A concessionária pedia para que fosse aceita sua relicitação pelas regras da Lei 13.448/2017, alegando que seria a melhor saída para os usuários. Mas uma análise de impacto regulatório feita pela agência apontou que a solução adequada seria a caducidade. Por isso, na mesma sessão, mas em processo diferente, a diretoria indicou que a relicitação não deve ser aceita pelo governo. Esta deliberação, também publicada no DOU de sexta, está disponível aqui.
Palavra do Ministério
A palavra final vai caber ao Ministério da Infraestrutura, no caso de decretação de caducidade, e ao Conselho do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), para o caso de aceitar ou não relicitação, que para o diretor tecnicamente não se encaixa no conceito de viabilidade da lei.
Em 2019 a agência indicou a caducidade da concessão da Transnordestina (ferrovia) e o governo não aceitou e tenta fazer um reequilíbrio do contrato, alegando que a solução seria mais viável que a caducidade.
O relator fez um duro voto para defender a caducidade da K-Infra, informando que a agência tentou todos os arsenais disponíveis antes da caducidade, mas que a concessionária segue em “total descaso com a prestação de serviço”.
“Nada do que foi combinado foi respeitado”, disse Davi num trecho do seu voto.
Ele explicou que manter a rodovia no poder da K-Infra pode piorar ainda mais a situação, visto que se as multas forem executadas a empresa poderia ficar sem caixa para os serviços essenciais.
“Vícios”
Em sua defesa, a advogada da K-Infra, Isabela Moraes, utilizou-se de uma declaração do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) no processo, de que não teria condições de assumir a rodovia, em caso de caducidade. Mas Barreto esclareceu que o órgão informou não ter orçamento para fazer investimentos de ampliação, o que a concessionária também não fez e não tinha planos de fazer.
Ela também alegou que o processo de caducidade teria “vícios” e que a empresa ainda está recorrendo das multas, que teriam sido dadas em duplicidade. Mas, segundo Davi Barreto, a área técnica da agência fez um relatório rebatendo ponto por ponto as alegações da defesa.
Davi também lembrou que, desde que a assumiu a concessão, em 2018, o novo administrador “nunca investiu” recurso próprio na rodovia. Ao contrário, empresas ligadas ao administrador receberam da concessionária R$ 16 milhões por serviços prestados e foram distribuídos R$ 3,5 milhões em recursos para os membros da diretoria, segundo o diretor.
Paraíso fiscal
Conforme a Agência iNFRA mostrou em reportagem de outubro de 2018, disponível neste link, a K-Infra era uma empresa desconhecida do setor de rodovias, tinha capital social de apenas R$ 10 mil e sócios que estavam protegidos em paraísos fiscais no exterior. O representante legal da empresa no Brasil havia sido condenado por fraude fiscal.
Ainda assim, a ANTT não viu problema em aceitar a troca de acionista – na época a concessão era a espanhola Acciona – alegando que havia um plano de investimentos da nova empresa, que entraria com recursos milionários para fazer obras que a espanhola não havia realizado em 10 anos de concessão, algo que nunca aconteceu.