Em disputa sobre renovação, Ministro dos Transportes paralisa processos de ferrovias da Vale e da VLI

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

O ministro dos Transportes, Renan Filho, pediu à ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) para paralisar a análise de dois processos que envolvem ferrovias que são controladas pela Vale, a renovação antecipada da FCA e o aditivo ao contrato da EFC (Estrada de Ferro dos Carajás) e da EFVM (Estrada de Ferro Vitória Minas) para ampliar o prazo de obras. 

O ministério está em uma disputa com a Vale para que ela pague novos valores pela renovação contratual antecipada de suas duas ferrovias, realizada em 2021, o que a empresa não aceita nos termos que estão sendo apresentados.  

Ainda em setembro, o ministério pediu para que a proposta de reabertura da Audiência Pública para a renovação antecipada da FCA (Ferrovia Centro Atlântica), controlada pela VLI, empresa cuja Vale é a principal acionista, fosse retirada da pauta da reunião de diretoria da agência para revisão. 

O contrato da FCA vence em 2026 e o governo, em 2018, iniciou o processo de renovação antecipada dessa ferrovia, no mesmo molde das outras quatro que já tiveram esse procedimento concluído. Mas a proposta apresentada à audiência pública em 2021 foi muito criticada por governos estaduais e foi necessário revê-la.

Concessionária, agência e ministério haviam acertado uma nova proposta que a agência levaria a votação em setembro. Mas, após não conseguir o acordo com a Vale sobre novos valores a serem pagos na renovação das outras ferrovias, o ministro oficiou a agência informando que deseja rever os parâmetros para a renovação da FCA.

Fim das renovações
Na prática, o governo já cogita não mais renovar nem essa e nem nenhuma outra concessão ferroviária, indicando que o modelo anterior não trouxe vantagem para a administração e que as concessionárias não querem revê-lo agora. Já há levantamentos para contratar estudos para licitar a concessão da FCA e da Malha Sul, da Rumo, segundo apurou a Agência iNFRA

Em resposta à Agência iNFRA, o Ministério dos Transportes informou que o “sobrestamento da audiência pública da Ferrovia Centro-Atlântica foi feito (…) para uma revisão dos cálculos a partir da verificação mais detalhada dos custos, investimentos e período de alocação no fluxo de caixa”.

Já a empresa informou que o processo segue em análise nos órgãos reguladores e “acredita que, uma vez concluída, a renovação permitirá um novo ciclo de investimentos” e que “segue com agendas regulares com o poder público e confiante na conclusão do processo.” 

“O plano de negócios discutido entre ANTT e FCA para o próximo ciclo contratual de 30 anos aponta para mais de R$ 30 bilhões que estimularão a indústria ferroviária e metalmecânica nacional e a economia como um todo, gerando impostos e cerca de 15 mil empregos, além de promover o aumento de quase 50% do fluxo de carga geral pela malha, 80 obras de solução de conflitos urbanos, entre diversos outros benefícios”. 

Novo pedido
Nesta semana, a agência foi informada sobre novo pedido do ministério de suspensão de análise de processo em relação às concessões ferroviárias da mineradora Vale. 

Esta pautado para a próxima reunião eletrônica de diretoria da agência o processo 50500.294679/2023-20, que trata da celebração de termos aditivos aos contratos de concessão da EFC e da EFVM para formalizar “a prorrogação dos prazos para cumprimento das obrigações não financeiras pela concessionária”.

Em 2021, ao aprovar a Lei 14.237/2021, o novo Marco Legal das Ferrovias, os congressistas consignaram no artigo 65 que todas as concessionárias teriam 12 meses a mais de prazo para realizar as obrigações não financeiras do contrato, ou seja, as obras e compras de equipamentos. A justificativa para o ato foi a pandemia de Covid-19.

A postergação dos prazos foi justificada à época porque as renovações têm cronogramas de obras considerados curtos que, se não forem integralmente cumpridos, podem levar as empresas a perderem o direito de renovação e ter que devolver o bem ao governo, sem direito à indenização.

Esse foi o motivo da Rumo Malha Paulista ter ido ao governo e ao TCU pedir uma mediação para rever seu caderno de encargos, já que ele não seria cumprido, mesmo com a extensão de prazo prevista na lei. Uma versão parcial do acordo foi aprovada pelo TCU e depende agora de validação por parte da empresa e do governo para ser ratificada, conforme mostrou a edição desta quinta-feira (30) da Agência iNFRA.

“Impacto nas políticas públicas”
Para cumprir o que a lei determina sobre a ampliação do prazo para as obras, a ANTT tem que fazer aditivos em todos os contratos ferroviários, inclusive os de novas concessões. O processo interno para isso da EFC e da EFVM foi concluído e seria votado numa reunião eletrônica, por ser considerado de menor complexidade.

Mas o ofício que chegou indica a necessidade de rever o que a agência estava decidindo, alegando descumprimento de prazos. Em resposta à Agência iNFRA, o ministério informou que o ofício “tem como objetivo alertar sobre uma questão jurídica relativa a interpretação da aplicabilidade da Lei 14.237/2020 a caso concreto de contrato de concessão. A matéria tem impactos nas políticas públicas e precisará de uniformização do entendimento jurídico.”

O ministro Renan Filho deu entrevistas recentes indicando que pretende seguir com a cobrança de valores que o governo considera que foram pagos a menos na renovação antecipada das concessões, inclusive com possibilidade de judicialização do processo. Conforme mostrou a Agência iNFRA em agosto, o governo tem um plano de obter uma indenização de R$ 30 bilhões das concessionárias renovadas, algo que elas não concordam.

Sem determinação
A pasta contava que o acordo mediado no TCU (Tribunal de Contas da União) sobre a Malha Paulista, na qual a Rumo se prontificou a pagar um valor de R$ 670 milhões ao governo como um “adicional de vantajosidade”, pudesse forçar as outras empresas a tomar a mesma atitude. Numa entrevista no Programa Roda Viva, em agosto, Renan chegou a dizer que o valor dos R$ 30 bilhões anunciado se baseava no cálculo que estava sendo feito para a Malha Paulista.

Mas a decisão tomada pelos ministros do tribunal nesta quarta-feira (29) não indicou nenhuma determinação em relação à revisão do tema para as outras concessões. Para conseguir aprovar a proposta, o relator, ministro Vital do Rêgo, teve que tirar essa determinação que constava de sua proposta inicial de decisão. Mesmo assim, dois ministros foram contra o acordo.

Um dos argumentos dos ministros contrários é que não havia uma memória de cálculo ou metodologia para se chegar ao valor desse “adicional de vantajosidade”. A justificativa inicial apresentada pelo ministério era que esse adicional seria uma espécie de compensação ao governo pela “assimetria de informação” em relação à permissão para mudar o contrato, de acordo com documento do processo obtido pela Agência iNFRA.

Justificativa
Mas, depois que o processo foi retirado da pauta do TCU em outubro para analisar essa questão, que vários ministros do TCU indicaram ser inadequada sem uma metodologia de cálculo ou análise de risco, o Ministério dos Transportes apresentou nova justificativa para o valor do “adicional de vantajosidade”.

Em síntese, a empresa e a pasta concordaram que foi contabilizado como um ativo da Rumo o valor dos bens não amortizados entre a data da renovação (2020) e o fim do contrato original (2026). Como o contrato foi renovado e não finalizado, não haveria motivo para esse valor ser contabilizado como ativo da Rumo, já que a empresa ficará no contrato ao fim da depreciação.

Esse valor do ativo não amortizado entre 2021 e 2026 seria de R$ 492,5 milhões que, atualizados pelo IPCA, chegam aos R$ 670 milhões, que a Rumo concordou em pagar como “adicional de vantajosidade”, indica o documento.

O relator entendeu que, na época da renovação, não havia regra específica sobre como tratar do tema. Por isso, não apontou nenhuma irregularidade no procedimento adotado pela agência e o governo da época, que foi então referendado pelo plenário do TCU. No entanto, indicou que seria adequado que o ministério e a agência fizessem, agora, uma reavaliação, devido ao interesse público no tema.

Auditoria externa
Vital também indicou que o “adicional de vantajosidade” não poderá ser descontado de outra conta que está em andamento no caso das renovações antecipadas de concessões ferroviárias, que é o balanço definitivo auditado de ativos e passivos da concessão. 

Na época da renovação, ficou acordado que, para acelerar o processo e garantir o início das obras mais rapidamente, o valor dos ativos e passivos seria apenas estimado. Após a realização de auditoria externa para verificar os números, a empresa se comprometeria a pagar uma possível diferença de valores que fosse encontrada pela auditoria.

As empresas estão levando ao governo a possibilidade dessa auditoria ser acelerada e os valores a maior que forem encontrados possam fazer parte do fundo que o Ministério quer constituir para investir em ferrovias.

Vale
Em nota, a Vale informou que “continua cumprindo com as obrigações decorrentes da renovação antecipada das ferrovias Estrada de Ferro Vitoria a Minas e Estrada de Ferro Carajás em 2020, tendo entregado 100% do compromisso cruzado da Fiol (56 mil toneladas de trilhos e 32 mil toneladas de dormentes) e adquirido os equipamentos necessários para expansão da oferta de trem de passageiros. As mais de 470 obras de mobilidade urbana, que irão beneficiar 33 municípios a partir de investimentos previstos de R$ 2,8 bilhões, e a obra da FICO, com desembolsos de R$ 10,7 bilhões, seguem em implantação.”

VLI
A VLI encaminhou nota de esclarecimento à reportagem:

“A VLI esclarece que sua composição acionária é formada por diversos acionistas e tem controle compartilhado. A empresa conta com uma governança sólida, totalmente independente e norteada pelos interesses do negócio da empresa”.

“A VLI é uma holding de capital fechado com ações divididas entre seis acionistas: Vale (29,6%), Brookfield Brasil (25,5%), Brasil Port Holdings L.P. (1%), Mitsui & Co. (20%), Fundo de Investimentos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FI-FGTS), administrado pela Caixa Econômica Federal (15,9%), e BNDES Participações (8%)”.

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