Luiz Fernando Fabbriani*
A discussão em torno do novo marco legal do saneamento resultou em reconhecimento do papel da cidade e da importância do entendimento da população brasileira sobre a necessidade da universalização do saneamento, inclusive dos benefícios econômicos, sociais e ambientais que são proporcionados pelo saneamento básico, com impactos positivos sobre a saúde, o bem estar e produtividade. Esse reconhecimento da relevância do saneamento básico abre caminho para o desenvolvimento sustentável das cidades.
Eu diria que esse movimento é a nova força motriz que busca o cumprimento das obrigações previstas no novo marco regulatório, o que virá a impor para as empresas públicas e privadas, um novo posicionamento por meio de concessões ou PPPs (parcerias público-privadas) para fazer frente à capacidade de investimento, pois todos terão que andar juntos, para proporcionar melhores serviços à população, com ampliação do acesso tanto a água potável quanto ao tratamento dos efluentes domésticos. Além disso, será necessário implantar aterros sanitários (em decorrência do fechamento dos “lixões”) e aprimorar as infraestruturas para drenagem pluvial.
É nesse contexto, como carioca e profissional do ramo de infraestrutura, com conhecimento no mercado de saneamento, que faço a reflexão sobre qual será o modelo e em quais circunstâncias as empresas públicas e privadas do mercado de saneamento se organizarão para enfrentar esse desafio.
Note-se que vivenciamos os leilões de concessão dos quatro blocos da empresa estadual de saneamento do estado do Rio de Janeiro, a Cedae. Tanto pela dimensão do projeto – medida em valores de investimento (aproximadamente R$ 30 bilhões – quanto em população a ser atendida (em torno de 11 milhões de pessoas), esse leilão já mudou a configuração do mercado privado de prestação de serviços de saneamento. Os vencedores dos 3 blocos em que o projeto foi leiloado abocanharam uma fatia relevante do mercado da noite para o dia.
O desafio será grande, pois estamos falando de investimentos de cerca de R$ 200 milhões por mês, em 35 cidades, ao mesmo tempo, nos primeiros 5 anos.
Será que as cidades e o mercado estão preparados para isso? Será que foram realizados estudos para avaliar os impactos (ruído, poeira, perturbação do tráfego) da realização de obras dessa dimensão em tão pouco tempo? Será que haverá insumos, mão de obra e os demais meios para cumprimento dessas metas?
A cidade do Rio de Janeiro enfrentou recentemente desafio semelhante, para a realização do programa de investimentos necessários à realização da Copa de 2014 e à Olimpíada de 2016. Mais ou menos ao mesmo tempo, realizou-se a implantação do Porto Maravilha, do Parque Olímpico, da Rodovia Transolímpica (posteriormente renomeada para Via Rio) e do VLT Rio. Por isso, entendo que a cidade é capaz de ter sucesso neste novo desafio. Aliás, o ciclo de investimentos a ser gerado pelo projeto da Cedae é também uma excelente oportunidade para aquecer a economia e melhorar a vida da população do Rio de Janeiro. Mesmo que ocorram gargalos na cadeia de fornecimento de insumos, materiais, equipamentos e mão de obra, creio que esses problemas podem ser superados com planejamento, organização e eventualmente renegociação de prazos com o poder concedente quando isso for indispensável.
Os vencedores da licitação da Cedae terão que fazer um enorme esforço inicial para a formação de times de gestão e planejamento e elaboração dos projetos. Será necessário manter sempre uma visão sistêmica e inovadora para proporcionar reais legados às cidades na instalação dos novos sistemas de tratamento, sem falar na contínua manutenção e gestão do sistema existente, em busca de excelência e atendimento das metas estabelecidas no contrato de concessão.
O enfrentamento de todos esses desafios exigirá um novo modelo, uma reestruturação das governanças corporativas das empresas com uma visão de maior parceria público-privada, considerando como parte das novas estratégias o posicionamento em desenvolvimento sustentável, com forte atenção às relações institucionais e nos stakeholders, deixando para trás aquelas empresas que não participarem dessas inovações, o que será muito importante para mudar de vez a cara do Brasil.