iNFRADebate: PPP de iluminação pública como plataforma pra “smart city” – afinal, o que é possível custear com recursos da contribuição

Rafael R. Garofano* e Israel Barbosa dos Santos**

Dúvida comum nos projetos de PPP (Parcerias Público-Privadas) de iluminação pública é saber se a contribuição para custeio dos serviços de iluminação pública, usualmente denominada COSIP (Contribuição de Serviço de Iluminação Pública) ou CIP (Contribuição de Iluminação Pública), pode ou não servir como fonte de receitas para custear investimentos e operação de tecnologias, soluções e sistemas inteligentes. Do ponto de vista técnico, sabe-se que é possível incorporar à rede de iluminação pública de uma cidade diversos dispositivos conectados, capazes de oferecer inúmeras funcionalidades adicionais, para além do incremento de qualidade e eficiência dos serviços de iluminação pública propriamente ditos. 

Primeiramente, não é demais lembrar que a interpretação acerca das limitações e condicionantes ao uso de recursos da COSIP/CIP para custear investimentos em soluções tecnológicas para “smart cities” está ancorado em decisões dos Tribunais, notadamente o julgamento realizado em sessão virtual de 07.08.2020 a 17.08.2020, por meio da qual o Pleno do STF, por maioria, apreciando o Tema 696 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário para fixar a tese de que: “É constitucional a aplicação dos recursos arrecadados por meio de contribuição para o custeio da iluminação pública na expansão e aprimoramento da rede“.

Com isso, praticamente toda obrigação de investimento decorrente de contrato de PPP que puder ser incluída no conceito de “iluminação pública”, pode também ser custeada com recursos da CIP, inclusive o melhoramento e a expansão do sistema de IP. Por outro lado, como decorrência direta do artigo 149-A da Constituição Federal, é assente o entendimento de que os recursos arrecadados por meio da CIP devem observar estrita vinculação à finalidade exclusiva de custeio da iluminação pública1, não se prestando a remunerar atividades relacionadas (a exemplo de serviços agregados à plataforma de IP e demais itens diversos da iluminação pública).

Atualmente há diversas possibilidades de integração entre os postes de iluminação pública e tecnologias, como por exemplo (i) câmeras de segurança e vigilância; (ii) dispositivos de geolocalização; (iii) serviços de emergência; (iv) sinalização digital, para fins de direcionamento, trânsito, informações ao público, publicidade, etc.; (v) sensores de imagem, para fins de proximidade, contagem de pedestres, monitoramento de estacionamento, segurança pública; (vi) rede wi-fi; (vii) sensores ambientais para controlar a qualidade do ar, a poluição sonora, etc.

A integração entre todos esses equipamentos e a implantação de postes de iluminação pública multifuncionais permite a coleta de dados da cidade em tempo real e possibilita a criação de uma rede municipal de coleta de informações, permitindo ao Poder Público ofertar serviços públicos de maneira mais eficiente e adequada às necessidades dos cidadãos2. As cidades inteligentes têm como característica exatamente a integração de sistemas e de bancos de dados, justamente para permitir a interoperabilidade e a “inteligência”. Faz todo sentido, portanto, do ponto de vista técnico e de política pública, que um projeto de PPP municipal preveja a infraestrutura e integração desses sistemas e bancos de dados. A utilização da rede de IP como plataforma para converter uma cidade em uma smart city não é apenas viável tecnicamente, como também é bastante desejável.

No Brasil, essa tendência de integração tem sido inserida no ambiente urbano sobretudo por meio de projetos de iluminação pública, em razão da característica da infraestrutura de postes, capilaridade e também em razão da existência de uma fonte de receita que tem se mostrado suficiente para custear os investimentos e operação dos serviços de IP, com deságios consideráveis nos leilões e eventuais “sobras” financeiras que poderiam – ao menos em tese – serem aplicadas para melhoria dos sistemas de gestão do parque de iluminação e até para a implantação de outras soluções inteligentes. 

Embora todas desejáveis e certamente muito úteis, o problema é saber como podem ser custeadas. Um dos principais obstáculos está na possibilidade jurídica ou não de utilização dos recursos da CIP para custear as soluções que transbordam em alguma medida a solução da IP propriamente dita. Para além das soluções tecnológicas tipicamente ligadas ao sistema de IP, outras soluções inteligentes que apresentam inegável sinergia com os postes e equipamentos de iluminação são geralmente cogitadas para serem implantadas em conjunto com a modernização e ampliação do parque de IP. 

É possível dividir as inúmeras soluções tecnológicas para as cidades inteligentes em pelo menos 3 (três) diferentes categorias, de acordo com as suas características, finalidades e interface com os serviços de iluminação pública: (i) infraestrutura, soluções e tecnologias que são próprios e exclusivos para atender ao sistema de iluminação pública (telegestão, p. ex.); (ii) soluções, tecnologias ou serviços que claramente não tem qualquer relação com a IP (sensores ambientais, p.ex.), ainda que se utilizem da infraestrutura de IP (postes); e (iii) infraestrutura, soluções e tecnologias que, embora tenham sido concebidas para atender ao sistema de iluminação pública, podem servir para agregar novas funcionalidades e serviços às cidades sem comprometimento de sua finalidade original ou de seu desempenho. 

Nesse último grupo estariam, p. ex., plataformas e sistemas tecnológicos com função integradora (middleware, p.ex.), situados entre o sistema operacional e os aplicativos nele executados, capazes de permitir a comunicação e o gerenciamento de dados para uma série de aplicativos distribuídos e suas respectivas funcionalidades. Apesar de concebido originalmente para gerir dados do sistema de IP, a solução permitiria, uma vez implantada, o recebimento e o tratamento de dados de outros sensores instalados na cidade e sua integração à CCO (central de controle operacional). 

O primeiro grupo é a essência do contrato de PPP de iluminação pública e não há dúvida quanto à possibilidade de sua remuneração pela CIP. O segundo grupo está mais claramente fora do que se convencionou considerar como serviço de iluminação pública, portanto a utilização de recursos da CIP para custeá-los certamente seria objeto de questionamentos. O terceiro grupo, por sua vez, está situado em uma “zona cinzenta” devido ao seu caráter multifuncional e merece, por isso, maior atenção. 

Aqui nesse terceiro grupo há pelo menos duas visões possíveis: (i) uma que vai considerar a impossibilidade de custear pela CIP uma infraestrutura tecnológica que pode ser aproveitada para outras funcionalidades, não necessariamente vinculadas e nem tampouco úteis ao sistema de iluminação pública do município3 (tecnologias não-exclusivas); (ii) e uma segunda visão que vai admitir o custeio da referida infraestrutura tecnológica, desde que ela seja necessária ou útil ao sistema de iluminação pública e que a sua utilização para outras finalidades ou funcionalidades não prejudique a sua função principal. 

A primeira visão não parece adequada e nem tampouco razoável. Se a infraestrutura tecnológica é necessária ou no mínimo representa alguma utilidade relevante à gestão e operação do sistema de IP do município – após criteriosa análise de qualidade do investimento, com incremento justificado de qualidade ou eficiência do sistema, inclusive em termos de desempenho ou redução de custos –, estaremos diante de um investimento inerente ao serviço de iluminação pública para fins do custeio com recursos do tributo correspondente.

Ainda que o município pudesse cogitar em operar o parque de IP sem a implantação dessa infraestrutura tecnológica, a inclusão do investimento no contrato de PPP, assim como a sua justificação em função dos benefícios trazidos à gestão e operação do parque, parecem determinantes para aferir a possibilidade ou não do seu custeio com recursos da CIP. Em outras palavras, se o investimento na plataforma é necessário ou traz inegável utilidade e incremento de qualidade ao sistema de IP, é legítimo apropriar a despesa como melhoria dos serviços de iluminação pública.  

A segunda interpretação, por sua vez, embora realmente pareça mais acertada ao admitir o custeio da referida infraestrutura tecnológica com recursos da CIP, não está livre de alguns cuidados e condicionantes. Ainda que os ganhos advindos da implantação da tecnologia para o parque de IP possam justificar, a priori, a sua remuneração integral pela CIP – com o efeito colateral positivo de ainda possibilitar outras funcionalidades para o município sem custo adicional –, a questão traz outras complexidades na perspectiva da concepção da infraestrutura tecnológica e do potencial de utilização para serviços agregados. 

A concepção da infraestrutura tecnológica, seu dimensionamento e suas especificações técnicas devem ser adequados e proporcionais ao sistema de iluminação pública. Isso significa que, para serem custeados exclusivamente com recursos da CIP, não se admitirá que haja superdimensionamento da plataforma tecnológica, além do necessário ou razoável, com o objetivo de atender a outras finalidades alheias aos serviços de iluminação pública individualmente considerados. 

Nesse sentido, nada impede que a CIP possa servir para custear os investimentos e a operação da rede de iluminação pública inteligente, entendida como aquela conectada a um sistema de telegestão e aos sistemas de conexão de dados que funcionarão como uma plataforma para uma série de tecnologias de gestão, de captação de imagens e sensoriamento que coletam dados sobre o status, material, localização exata do ponto de luz, movimento de tráfego e de pessoas, tudo isso com objetivo de garantir soluções de eficientização do parque de IP, a exemplo da dimerização.

Tome-se como exemplo a utilização de plataforma tecnológica integradora, como o middleware que é um tipo de software muito utilizado por desenvolvedores para criar aplicações com mais facilidade e eficiência, pois tem o papel de conectar aplicações, dados e usuários. Esse tipo de solução deve ser devidamente dimensionado para atender às finalidades vinculadas à iluminação pública, admitindo-se a previsão da arquitetura e das especificações técnicas que melhor atendam aos critérios de custo-benefício à luz das finalidades vinculadas exclusivamente à inteligência embarcada aos equipamentos e sistemas de IP. Até aqui é possível sustentar o custeio do investimento e da operação da plataforma com recursos exclusivos da contribuição para iluminação pública.  

Ocorre que a mesma plataforma tecnológica integradora, uma vez implantada e em funcionamento para os serviços de IP, pode ser aproveitada pelo município para admitir outras funcionalidades que não se confundem e não aproveitam ao serviço de IP. É o caso, p. ex., da integração de dados de geolocalização ou de sensores espalhados pela cidade (nos postes de iluminação ou outros equipamentos, como lixeiras etc), os quais podem passar a ser transmitidos e recebidos pela plataforma de IP, mediante a utilização da infraestrutura tecnológica existente4

Desde que não haja alteração da concepção e do dimensionamento da plataforma ou de suas especificações exclusivamente para atender às suas funcionalidades acessórias potenciais, não haverá qualquer mudança ou ônus adicional na infraestrutura já implantada decorrente da eventual incorporação posterior de funcionalidades ou serviços viabilizados mediante a utilização da plataforma tecnológica implantada para o sistema de iluminação pública. A infraestrutura tecnológica continuará sendo aquela estritamente necessária ou útil ao sistema de IP, o que é suficiente para legitimar o seu custeio da sua implantação mediante recursos provenientes da arrecadação da CIP. 

O que não se admitirá é que a própria concepção ou dimensionamento da plataforma, ou ainda suas especificações, sejam majoradas ou alteradas com o único propósito de atender a serviços outros que não aqueles estritamente necessários ou úteis à operação do parque de iluminação pública. Não se quer dizer com isso que tais incrementos ou adaptações não possam ser previstos no contrato de PPP, senão apenas que a sua remuneração, na parcela que extrapolar os sistemas de IP, não poderá ser custeada com recursos da iluminação pública.   

E mais, em relação aos serviços agregados que eventualmente venham a ser incorporados à plataforma, igualmente não poderão ser remunerados com recursos da CIP, ainda que o tomador seja o próprio município (desenvolvimento do sistema para permitir a interface com dados externos, p. ex). E isto por uma razão muito simples: se a funcionalidade ou serviço incorporado à plataforma de IP não se presta ao serviço de iluminação pública, não haverá fundamento legal para remunerar a atividade com os recursos vinculados àquela finalidade específica. Eventual remuneração devida à concessionária pela prestação do serviço adicional decorrente da atividade relacionada deverá assim encontrar outra fonte de recursos e receber tratamento equiparado às receitas extraordinárias.

Além disso, não se admitirá que a incorporação de novas funcionalidades ou serviços à plataforma – como por exemplo o tratamento de dados de sensores meteorológicos – de alguma maneira prejudique o bom desempenho da atividade principal, ou seja, interfira negativamente no cumprimento dos indicadores de desempenho e qualidade do sistema de iluminação pública. Trata-se de condição ou limitação inerente ao próprio modelo de concessão, como medida de proteção e satisfação do objetivo principal da PPP. Por outro lado, se a nova funcionalidade ou serviço não prejudicar a atividade principal, o aproveitamento da infraestrutura tecnológica de IP para tais finalidades acessórias será medida consentânea com a economicidade e com o interesse público5.

Faz-se necessário, portanto, segregar-se o quanto possível as atividades segundo a ordem de classificação aqui proposta, a fim de se avaliar, um a um, quais investimentos ou serviços poderão ser custeados integralmente pela CIP; quais não poderão ser remunerados por ela e necessitarão de uma fonte alternativa de receita; e quais, eventualmente, admitirão remuneração apenas parcial pelos recursos dedicados à iluminação pública, até o limite das parcelas que a ela aproveitam.

A motivação demonstrará, afinal, em cada situação, a possibilidade, a adequação e os limites da utilização dos recursos da contribuição para custear outras soluções inteligentes para as cidades, desde que atendidas as diretrizes e condicionantes aqui delineadas, inclusive em face das possíveis alternativas e da relação de interdependência da nova solução com a infraestrutura e serviços de iluminação pública do município.

Ressalva-se que a eventual remuneração adicional devida à concessionária pelo compartilhamento da infraestrutura tecnológica da plataforma integradora para fins de agregação de novas funcionalidades e serviços, como a integração de dados de geolocalização p. ex., não induz à obrigatoriedade de remuneração pela eventual utilização da infraestrutura física de postes exclusivos de iluminação pública para a instalação ou “ancoragem” de equipamentos e sensores de coleta de dados que sejam do interesse do Poder Público.

Embora sejam situações relativamente semelhantes, a utilização da infraestrutura física dos postes para a instalação e manutenção de equipamentos públicos não conferirá ao concessionário, especificamente em relação a tais equipamentos, qualquer direito à remuneração pela cessão de uso do espaço, responsabilizando-se a concessionária por quaisquer danos que causar a esses equipamentos em decorrência da execução de suas atividades. Por outro lado, a instalação dos equipamentos e sensores não poderá, em qualquer caso, provocar interferências negativas ou mesmo prejudicar a execução das atividades e serviços de iluminação pública, assumindo o Poder Concedente os riscos relacionados à utilização dessa infraestrutura física.

Recentemente, as preocupações que rondam a eficiente incorporação de soluções de smart cities em contratos de PPP, especificamente relacionadas à iluminação pública, foram objeto de apontamentos realizados pela ABDIB (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base). O grupo de trabalho “Incorporação de soluções de cidades inteligentes ao escopo de PPPs de iluminação pública” ligado à Associação, publicou um documento onde são apresentadas propostas para incorporação das soluções de smart cities aos contratos de PPP. O estudo traz propostas como respostas aos desafios detectados para a incorporação de soluções de cidades inteligentes no escopo de contratos, de forma a auferir receitas acessórias/extraordinárias decorrentes dessa prestação de serviços.

Os desafios foram divididos em ordens jurídica, técnica e financeira. O estudo entende que os altos deságios nas propostas vencedoras das licitações no setor se fundamentam nas expectativas dos licitantes sobre receitas acessórias voltadas para soluções de cidades inteligentes, e por isso os especialistas do setor vem se dedicando a compreender como tais soluções e receitas podem efetivamente contribuir tanto tecnologicamente, quanto financeiramente ao negócio, além de delinear com maior clareza quais são as implicações e questões jurídicas que condicionam a sua concretização.

Especificamente no aspecto jurídico, a ausência de uma política pública clara para cidades inteligentes e a baixa capacidade institucional dos municípios foram identificados como entraves para a utilização dos contratos de PPP com o objetivo de disponibilizar as soluções de smart cities aos municípios. Esses dois entraves resultam por gerar desincentivos nos contratos de concessão para aprovação de atividades geradores de receitas acessórias. 

Ali se considerou importante, por exemplo, que os municípios que tenham interesse “sejam apoiados na construção de uma política transparente e fundamentada de implantação de cidades inteligentes, por meio da identificação de objetivos e aplicações/serviços prioritários e factíveis relacionados à matéria; eleição de meios estratégicos para seu desenvolvimento (como, se for o caso, a rede de iluminação pública) e identificação de recursos públicos ou outros, para suportar a execução de tais atividades”.

As conclusões do documento da ABDIB, somadas às definições aqui apontadas acerca das diferentes categorias de soluções inteligentes relacionadas aos serviços de IP, revelam a possibilidade de sua incorporação nos contratos do setor, desde que tomados alguns cuidados. É preciso diferenciar as soluções propostas entre aquelas que podem e aquelas que não podem ser custeadas pelas receitas da contribuição de iluminação pública. E, para estas, é necessário justificar a sua relação com os serviços ou com a infraestrutura de iluminação pública, a fim de autorizar a sua exploração pelo concessionário no regime do art. 11 da Lei nº 8.987/1995.

A segregação e a identificação dos limites das soluções de smart cities coopera com a possibilidade de utilização da CIP para seu custeio dentro do contrato da PPP de IP, inclusive para aquelas soluções localizadas na “zona cinzenta”, ou mediante exploração de receitas extraordinárias para as demais. Isso é possível de perceber na medida em que tais contratos autorizem a execução e implantação das soluções de cidades inteligentes, onde o objeto contratual é alargado desde o início, para incluir a possibilidade de implantação de soluções inovadoras pelo concessionário.

Sem prejuízo, é possível também defender a ampliação das possibilidades de uso e aplicação da contribuição. Uma alteração constitucional e legislativa poderia até mesmo mudar a sua vocação ou possibilitar o emprego de eventuais sobras da contribuição na remuneração de serviços relacionados às cidades inteligentes. Seria como uma desvinculação de receita após o cumprimento das obrigações pecuniárias decorrentes do contrato de PPP, inclusive após a cobertura de eventuais garantias e indenizações. Isso garantiria maior segurança jurídica para adoção das soluções nos contratos, além de significar um incentivo financeiro aos parceiros privados, que passariam a contar com a segurança do fluxo financeiro para o desenvolvimento e implantação de novas tecnologias e funcionalidades, em benefício do interesse público. 

Não se desconsidera que são muitos os desafios para a construção de cidades inteligentes, para além de uma fonte de financiamento segura e previsível. É certo que há outros pontos relevantes a tratar, cujos desdobramentos extrapolariam os limites desta reflexão. Ainda no campo jurídico, um exemplo é a discussão em torno da possibilidade de o poder público contratar a incorporação de soluções inteligentes dentro do próprio contrato da PPP, em contraposição à alternativa de licitar a contratá-las em separado. A fonte de recursos públicos, a qualificação técnica do particular e a vantajosidade da contratação integrada da solução certamente deveriam ser objeto de análise e consideração em cada caso. 

Dentro dos limites propostos, aqui nos debruçamos apenas sobre um dos aspectos relevantes, com o objetivo de apontar um caminho jurídico para o suporte de investimentos em soluções inteligentes nas cidades por intermédio dos contratos de PPP dos serviços de iluminação pública, inclusive mediante a utilização de recursos da contribuição específica em situações justificadas. Destacou-se então que o planejamento e o cuidado na etapa de estruturação do contrato, assim como a identificação das diferentes categorias de soluções tecnológicas e sua relação com a infraestrutura de IP, são determinantes para a viabilidade do custeio de soluções inteligentes a partir dos contratos de PPP de iluminação pública nas cidades.

1 Revista de Dir. Público da Economia – RDPE. Belo Horizonte, ano 17, n. 66, p. 9-31, abr/jun. 2019.
2 BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL. Cartilha de Cidades. Janeiro de 2018. p. 56. “Implement the multi-functional smart lampposts pilot scheme starting from 2019 to facilitate collection of real-time city data to enhance city management and other public services”. INNOVATION AND TECHNOLOGY BUREAU. Hong Kong Smart City Blueprint. Disponível em <www.smartcity.gov.hk>. Dezembro de 2017. p. 24.
3 A possibilidade de servir a outras funcionalidades seria suficiente, segundo esta visão restritíssima, para vedar a utilização da fonte orçamentária para custear o investimento.
4 Como vimos, uma vez implantada a infraestrutura de IP, nada impedirá, sob o ponto de vista técnico, que a base tecnológica instalada seja mais bem aproveitada para uma séria de outras finalidades em vários outros serviços ligados ao interesse público municipal. Ninguém duvidará que segurança pública, estacionamento nas vias públicas, qualidade do ar, clima, poluição sonora, índice pluviométrico, condições da via, controle do tráfego em tempo real revisando os tempos dos sinais são serviços garantem qualidade de vida à população e são abarcados pelo interesse público.
5 Até porque não se cogitaria da vedação à exploração ou compartilhamento da infraestrutura tecnológica já instalada somente porque ela foi eventualmente custeada pela CIP. Exigir a duplicação dessa infraestrutura pelo Município, isto sim, seria antieconômico e contrário aos interesses coletivos e aos objetivos de políticas públicas.
*Rafael R. Garofano é advogado e sócio fundador do escritório Garofano Sociedade de Advogados em São Paulo. É doutorando e mestre em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo.
**Israel Barbosa dos Santos é advogado e sócio da área de infraestrutura do escritório Garofano Sociedade de Advogados. É bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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