Marisa Wanzeller e Geraldo Campos Jr., da Agência iNFRA
O governo articula a possibilidade de criar uma regra para garantir isenção de tributos federais para quem se encaixa no benefício da Nova Tarifa Social de Energia, segundo fontes. No entanto, essa medida pode acabar onerando os demais consumidores de energia, explicam especialistas à Agência iNFRA.
Isso porque as alíquotas do PIS/Cofins incidem sobre a receita total da empresa. Dessa forma, a distribuidora repassa o valor ao consumidor final, em uma espécie de rateio, explicou uma fonte do setor elétrico.
Assim, com a nova regra, o valor que deixará de ser pago pela classe de consumo isenta passará a ser bancado por outras faixas de consumo. O advogado Luis Claudio Yukio, sócio do Toledo Marchetti Advogados, explica a lógica: “Quando você tira de alguém, outro alguém vai ter que pagar essa conta, sejam os outros usuários, seja a própria distribuidora”, disse.
Ele ponderou que, para que não houvesse essa oneração aos demais consumidores, a isenção dos tributos precisaria ocorrer em toda a cadeia de energia elétrica, não apenas para o consumidor final. “Quando a gente isenta só a parte final, não quer dizer que ninguém vai pagar essa conta, quer dizer que aquele usuário final não vai pagar a conta”, pontuou.
No entanto, nem todas as empresas cobram os impostos federais (PIS/Cofins) da mesma forma, pois não há regulamentação sobre o tema. Atualmente, a cobrança é feita de duas formas:
- O tributo cobrado do beneficiário da Tarifa Social incide sobre o seu consumo total, ou seja, considerando também a parte em que ele tem desconto custeado pela CDE (Conta de Desenvolvimento Energético);
- O tributo pago pelo beneficiário incide apenas sobre o valor referente à parte do consumo que, de fato, deverá ser paga por ele, sem considerar a parte em que há desconto. Nesse caso, o tributo referente à parte isenta do seu consumo é redirecionado aos demais consumidores.
Segundo fontes, o que o governo tem buscado é deixar claro que o tratamento a ser dado com a nova Tarifa Social seja o do segundo caso, como já é feito por algumas distribuidoras. Dessa forma, evitaria que clientes com consumo de até 80 kWh, que terão isenção, recebam a fatura com apenas os tributos federais para pagamento.
Para definir uma regra, o governo tem tratado do tema com a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) e a Receita Federal. A princípio, entende-se que a determinação pode ser fixada diretamente pela reguladora, a fim de evitar emissão de faturas com cobrança apenas de tributos.
Reguladora
A diretora da ANEEL Ludimila Lima já mencionou o tema, em voto aprovado na última reunião de diretoria. Nele, a diretora pede que as distribuidoras observem a exposição de motivos da MP (Medida Provisória) 1.300/2025 que, ao criar a nova Tarifa Social, estabelece que a política pública “visa garantir gratuidade no consumo mensal de até 80 kWh para famílias beneficiárias”.
Segundo fontes, mesmo sem uma regulamentação específica sobre o PIS/Cofins, a interpretação que vem sendo feita pelas distribuidoras do voto aprovado na reguladora é de que elas devem isentar tais consumidores também do tributo federal. Assim, muitas delas já estão se organizando para passar a faturar a cobrança da segunda forma exemplificada acima.
“O que vem sendo entendido é como se a diretora Ludimila dissesse o seguinte: ‘como o ordenamento é para que exista a gratuidade, significa dizer que eu não vou aplicar o PIS e o Cofins sobre o valor que vem da CDE. Então, vai ficar para os demais consumidores pagarem essa diferença”, explicou uma fonte do setor.
Apesar disso, interlocutores do governo sinalizam que ainda é possível que a ANEEL venha a tratar do tema em um processo específico.
Isenção
Com a publicação de uma norma que especifique a isenção tributária para o consumidor da Tarifa Social, a segunda modalidade apresentada prevaleceria. Dessa maneira, em todas as concessões, os consumidores não beneficiados pelo programa do governo pagarão os tributos referentes ao consumo de quem está dentro da modalidade.
A advogada Camila Galvão, sócia do escritório Machado Meyer, defende a isenção dos tributos do ressarcimento que a distribuidora recebe via CDE, referente ao valor não cobrado do consumidor da Tarifa Social. “Na hora que a distribuidora recebe da CDE o valor, o fisco quer tratar como uma nova receita da distribuidora e quer cobrar de novo o PIS/Cofins. É por isso que as distribuidoras estão querendo cobrar o PIS/Cofins do consumidor de baixa renda que não paga a conta, porque elas têm que pagar quando recebem o subsídio da conta CDE”, afirmou.
Impostos locais
A intenção do governo de deixar clara uma regra para a tributação da Tarifa Social, no entanto, não alcançará o ICMS (imposto estadual) e a taxa de iluminação pública (municipal). Isso porque a União não pode regulamentar a cobrança desses tributos, que são regidos exclusivamente por leis locais.
Dessa forma, mesmo com o esforço sobre o PIS/Cofins, não ficará eliminada a possibilidade de consumidores beneficiados pela nova Tarifa Social receberem contas de luz apenas com imposto. Aliás, em seu voto na ANEEL, Ludimila ressaltou que as distribuidoras devem observar as legislações locais sobre esses tributos.
Ocorre que, neste caso, a situação varia entre cada ente. Há estados que já isentam ICMS, por exemplo, da Tarifa Social. No entanto, como se trata do principal imposto da conta de luz, que pode chegar a 30% em alguns casos, e alguns estados têm a maioria da sua população como beneficiária do programa, uma isenção para redistribuição pesaria excessivamente nas tarifas dos demais consumidores, avaliam fontes do governo.
A mesma situação ocorre em relação à taxa de iluminação pública, em que as regras são ainda mais diferentes conforme cada município. Há localidades, por exemplo, em que as alíquotas são menores para a faixa de consumo residencial de até 80 kWh, como é o caso de Brasília. No Rio de Janeiro, há isenção para quem consome até 100 kWh. No entanto, em muitas cidades, há uma alíquota única para todas as classes.