George Santoro* e Gabriela Avelino**
O governo federal bateu o recorde de concessões rodoviárias: fez mais leilões em dois anos e dois meses do que foi feito nos oito anos anteriores, além de já ter publicado outros três editais com leilão marcado até maio deste ano. Com os novos contratos, o Brasil vislumbra uma expansão e aumento da qualidade da infraestrutura de transportes sem precedentes, cruciais para o desenvolvimento socioeconômico de um país emergente.

Esse resultado é fruto de diversos aprimoramentos regulatórios e da modelagem econômico-financeira dos projetos. Na chamada 5ª etapa de concessões rodoviárias, os editais e contratos foram padronizados, reduzindo barreiras à entrada de potenciais investidores. A matriz de risco ficou mais objetiva e clara e a taxa de retorno dos projetos foi ajustada de acordo com os riscos envolvidos, destravando concessões mais desafiadoras, como foi o caso da BR-381/MG, conhecida como “Rodovia da Morte”, levada a leilão quatro vezes antes de ser concedida com sucesso em agosto do ano passado. Outras mudanças regulatórias incluem o uso de contas vinculadas como amortecedores de flutuações no câmbio e no preço dos insumos, criação dos chamados dispute boards como estratégia de solução ágil de conflitos técnicos e exigência de aportes em leilões a partir de determinado desconto na tarifa como forma de afastar aventureiros.
Para além disso, o cenário favorável para as concessões em infraestrutura também é fruto de aprimoramentos nos instrumentos de financiamento, reforçando a posição de destaque que o Brasil ocupa quando o assunto é a sofisticação do mercado financeiro. As debêntures incentivadas, por exemplo, criadas em 2011, estimulam o levantamento de recursos no mercado de capitais por meio de renúncias fiscais. Em janeiro de 2024, o governo sancionou a Lei 14.801, ampliando o uso do instrumento para reembolso de gastos: antes, as debêntures incentivadas só podiam cobrir despesas realizadas até dois anos antes da emissão; com as novas regras, esse prazo passa a ser de cinco anos. Assim, as concessionárias de infraestrutura terão mais flexibilidade para mudarem suas estratégias de financiamento ao longo da execução do contrato.
A nova lei também eliminou burocracias no processo de emissão: agora, as empresas podem ir a mercado sem necessidade de aprovação prévia dos ministérios. Essa agilidade permite que as concessionárias aproveitem momentos favoráveis para captarem mais recursos. Por fim, a mesma Lei 14.801 criou as chamadas debêntures de infraestrutura, que oferecem incentivo fiscal para o emissor do título (e não para o comprador, como nas debêntures incentivadas), prometendo somar outro poderoso instrumento ao arsenal de mecanismos de financiamento já existentes e bem sucedidos.
O Ministério dos Transportes foi o primeiro a incorporar essas inovações legais nos setores sob sua supervisão, publicando a Portaria 689 em julho de 2024 e destravando investimentos em rodovias e ferrovias. Estendeu a dispensa de aprovação ministerial prévia para as concessões subnacionais e se destacou ao trazer mais segurança jurídica para uso das debêntures no financiamento das outorgas.
A consequência de todos esses avanços é clara: 2024 foi o ano recorde em emissões de debêntures incentivadas no setor de transportes rodoviário e ferroviário. Do total de R$ 135 bilhões em títulos desse tipo emitidos no ano, 27% vieram de concessionárias de rodovias e ferrovias, mostrando a força do setor. E os resultados transcendem o governo federal: dos R$ 37 bilhões em debêntures incentivadas emitidas para rodovias e ferrovias, quase 20% foram destinados à expansão da infraestrutura dos estados, mostrando que as políticas públicas de fomento têm alcance nacional.

Para que as debêntures sigam tendo papel importante no financiamento da infraestrutura, as inovações regulatórias precisam ser cirúrgicas, principalmente em conjunturas adversas. Atualmente, o Brasil tem passado por uma alta de juros que onera o acesso a capital por quem quer investir em empreendimentos arriscados e de longo prazo. Para fazer frente a esse desafio, o Ministério dos Transportes editou, na semana passada, a Portaria 201, que autoriza a reemissão de debêntures: nova captação de recursos para pagamento de dívida oriunda de debêntures emitidas anteriormente. A nova norma dá segurança jurídica para que as empresas possam emitir títulos mais curtos em momentos de juros altos e depois fazer uma nova emissão mais longa quando as taxas estiverem mais favoráveis, quitando a dívida anterior. Assim, evita-se a fixação de custos financeiros elevados por longos períodos.
Por fim, outra inovação se aproxima no horizonte: a partir de 26 de julho de 2025, as debêntures com incentivos fiscais emitidas por concessionárias de rodovias e ferrovias federais deverão estar atreladas a investimentos sustentáveis. Diante de eventos climáticos extremos que aumentam os riscos e custos de projetos de infraestrutura, o Ministério dos Transportes aposta na sustentabilidade – em especial, na resiliência climática – como a saída para uma rede de transportes mais segura e eficiente no longo prazo. Esses investimentos ainda trazem o benefício adicional de permitir o acesso a bolsos de investidores estrangeiros, cuja governança frequentemente exige sustentabilidade como requisito para aplicações.
Motivado pelo sucesso dos leilões já realizados, o Ministério dos Transportes quer ir além: entregar mais 34 leilões de rodovias federais e pelo menos três leilões de ferrovias até o final de 2026. A regulação e as políticas públicas no setor de infraestrutura têm se adaptado aos desafios de um mundo em constante mudança, reduzindo custos para investimentos estruturantes e criando, assim, as condições favoráveis para que essa meta seja alcançada. Como nos ensinou Charles Darwin, nas palavras do professor de administração e negócios Leon C. Megginson: “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”. Inovar para crescer: essa é a filosofia do Ministério dos Transportes.
*George Santoro é secretário-executivo do Ministério dos Transportes.
**Gabriela Avelino é subsecretária de Fomento e Planejamento do Ministério dos Transportes.
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.