Gabriel Vasconcelos, da Agência iNFRA
As petroleiras que atuam no país reagiram mal à boa parte do pacote de medidas preparado pelo MME (Ministério de Minas e Energia) para engordar a arrecadação em R$ 35 bilhões em 2025 e 2026. O ponto mais rechaçado é a preparação de um novo decreto para aumentar a progressividade de participações especiais sobre a produção de campos de petróleo sob regime de concessão.
Segundo fontes, o governo acredita que a medida, sozinha, poderia render mais R$ 6,5 bilhões ao Tesouro Nacional nos dois próximos anos caso valha para campos gigantes com produção corrente, como Tupi, o maior campo do país, concedido à Petrobras, Shell e Petrogal ainda em 2010. Altos executivos do setor têm dito que isso seria romper a tradição brasileira de respeito a contratos. “Nem sob a Dilma (Rousseff), no início do pré-sal e com enorme ímpeto nacionalista, tivemos quebra de contratos”, disse um deles sob a condição de anonimato.
O presidente do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás), Roberto Ardenghy, disse à Agência iNFRA que retroagir eventuais novas regras de participação especial para fazê-las incidir em contratos antigos de concessão seria uma “catástrofe” para o setor. “Isso é rasgar contrato assinado, algo que o Brasil nunca fez”, afirma.
Ele admite, porém, que revisar alíquotas para contratos futuros “faz parte do jogo”, embora traga consigo um risco de redução a atratividade de leilões como o marcado pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) para 17 de junho, algo que o governo deve observar.
Outras medidas
Sobre a revisão para cima dos preços de referência usados para definir encargos – que já estava no horizonte das empresas – o presidente do IBP lembra que, pela regra, os novos valores só entram em vigor seis meses após publicação de portaria pela ANP. A agência planeja concluir esse processo de revisão em julho, conforme a agenda regulatória do biênio, o que levaria seus efeitos arrecadatórios para janeiro de 2026. Isso, diz Ardenghy, desmonta a tese de mais arrecadação já em 2025.
Outras medidas no pacote do MME para aumentar arrecadação são a unitização de áreas, que Ardenghy encara como assunto superado, e mais leilões e antecipações na venda do óleo da União, que são até recomendadas em sua avaliação.
Nesta terça-feira (3), o IBP emitiu nota criticando especificamente a investida cogitada sobre participações especiais e a revisão do preço de referência, definidas no documento como “medidas abruptas com impacto negativo significativo”, inclusive sobre o leilão de áreas exploratórias da ANP marcado para 17 de junho. Os CEOs das maiores petroleiras do país se reuniram nesta terça-feira pela manhã na sede do IBP, no centro do Rio de Janeiro, para discutir o assunto. Mais discretos que os agentes do mercado financeiro no caso do IOF, os executivos do petróleo acordaram a nota e aguardam os próximos passos do governo.
“Puxadinho”
O ex-presidente do instituto Eberaldo de Almeida avalia que o pacote é voltado ao curtíssimo prazo, para cobrir um rombo nas contas do governo, evidenciando a “mentalidade de puxadinho” que ganha espaço no governo. A fim de desviar de medidas estruturantes que tenham de passar pelo Congresso Nacional, diz ele, o governo procura expedientes rápidos, via portaria de agência ou decreto, o que não raro atravessa o setor de óleo e gás e afasta investimentos futuros. Foi o caso, diz, do imposto de 9,2% sobre exportações de petróleo, implementado via Medida Provisória e revertido pela Justiça meses depois sem que fosse apreciado pelo Congresso.
“É uma lástima que se cogite este tipo de intervenção em um negócio com ciclo de implantação de projetos variando de seis a dez anos. Pode ajudar agora, mas gera contração lá na frente”, diz Almeida. Segundo ele, o setor já vive de decisões de investimento tomadas anos atrás, enquanto iniciativas novas seguem em compasso de espera devido ao juro alto e à insegurança jurídica crescente.
Márcio Félix, presidente da Abpip (Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo e Gás), que reúne petroleiras pequenas e médias, afirma que o governo estica a corda ao cogitar mexer em participações especiais e preços de referência ao mesmo tempo, sobretudo no atual cenário, em que as margens já ficaram mais apertadas com o preço do barril do tipo Brent caindo US$ 20 dólares nos últimos doze meses e estacionado no patamar de US$ 65.
“Ainda é preciso entender se as medidas valeriam para contratos antigos e a partir de quando entrariam em vigor. Mas só a admissão de que isso está sendo discutido já faz a intenção de investimento recuar, e reduz a competição de qualquer leilão, seja de óleo, seja de áreas”, diz. Em nota, a Abpip fala em “profunda preocupação” e centra fogo na revisão dos preços de referência, ponto de maior sensibilidade para suas empresas. No grupo estão petroleiras como Brava e Prio, cujo balanço financeiro das maiores operações offshore também pode vir a ser prejudicado por alterações nas participações especiais.