Geraldo Campos Jr., da Agência iNFRA
O MPTCU (Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União) ingressou com representação nesta quinta-feira (31) para que a Corte de Contas investigue possíveis irregularidades na operação que antecipou R$ 7,8 bilhões em recebíveis da Eletrobras, no modelo de securitização, autorizada pela MP (Medida Provisória) 1.212/2024 para quitar as contas Covid e Escassez Hídrica.
A representação é assinada pelo subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado e leva em consideração o entendimento da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) quanto a um possível prejuízo aos consumidores e a possibilidade de favorecimento das instituições financeiras que intermediaram a antecipação, conforme voto do diretor da agência, Fernando Mosna.
Furtado ponderou que, conforme a reguladora, a operação proposta pelo MME (Ministério de Minas e Energia) não alcançou a finalidade original proposta, de reduzir as tarifas de energia. E que em ocasiões anteriores, operações do tipo foram coordenadas pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), o que não ocorreu desta vez.
“Tanto os benefícios indicados pelo MME na antecipação do recebimento dos recursos quanto os indícios de prejuízos aos cofres públicos nessa operação trazidos pela ANEEL devem ser detidamente analisados por esta Corte de Contas. Deve ser apurado e definido, de forma clara, se houve ou não a ocorrência de irregularidades nessa operação financeira de antecipação de recebíveis”, sustenta.
O procurador disse ainda ver com “grande preocupação a nova controvérsia entre a ANEEL e o MME”, afirmando que diretores da agência e gestores da pasta têm travado embates constantes numa “guerra que tem se mostrado mais acirrada do que em Gaza”.
Ministério envia documentos
Após a divulgação da representação, o Ministério de Minas e Energia informou que já tinha disponibilizado previamente ao TCU todos os documentos do processo de securitização dos recebíveis da CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) pela Eletrobras.
Segundo o MME, os documentos, incluindo memoriais e notas técnicas, foram submetidos à Corte de Contas na quarta-feira (30) “com o objetivo de dar total transparência à operação de securitização”.
Os documentos foram encaminhados ao TCU por iniciativa própria do MME um dia depois da análise do tema pela ANEEL. Na terça-feira (29), a ANEEL aprovou a abertura de consulta pública para debater o impacto tarifário da operação. Foi constatado que o benefício econômico ao consumidor foi de R$ 46,5 milhões, ou seja, 11 vezes menor que os R$ 510 milhões inicialmente previstos.
Relator na ANEEL defendeu apuração do TCU
Em seu voto apresentado na terça-feira, o diretor Fernando Mosna avaliou que o despacho do secretário de Energia Elétrica do MME, Gentil Nogueira, autorizando a operação sem o efetivo benefício econômico ao consumidor, demonstrava aparente erro grosseiro e falha na execução das atribuições do secretário.
Como a ANEEL não tem poder fiscalizatório sobre o ministério, o relator votou para que o caso fosse encaminhado para análise do TCU (Tribunal de Contas da União) e da CGU (Controladoria-Geral da União), para que os órgãos possam avaliar a abertura de auditoria e sindicância sobre os atos do secretário. Também propôs encaminhar o processo para análise de comissões competentes do Congresso Nacional.
No entanto, esses encaminhamentos não foram aprovados pela maioria, com a votação sobre esses itens terminando empatada, portanto, sem deliberação. Por outro lado, foi aprovada abertura de fiscalização nos trâmites da operação conduzidos pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica).
O impacto tarifário médio com o benefício menor foi calculado pela ANEEL em 0,02%. No entanto, apenas os clientes de 50 distribuidoras terão alguma redução tarifária com a operação. Para os consumidores de outras 53 empresas, o impacto do benefício não será sentido. Isso porque essas concessionárias tinham mais valor a receber da Eletrobras do que a pagar pelas contas Covid e Escassez Hídrica.
Esse grupo de 53 empresas terá prejuízo com a operação de R$ 1,17 bilhão. Só os consumidores da Cemig terão um custo de R$ 175 milhões, segundo a ANEEL. Já nas 50 distribuidoras que terão ganho com a securitização, o benefício total foi calculado em R$ 1,22 bilhão.
Mosna entendeu que, dessa forma, houve falta de isonomia e que a antecipação não foi benéfica aos consumidores, tendo sido mais vantajosa para as instituições financeiras que participaram da operação. Os cálculos passarão por consulta pública até 13 de dezembro.