Marília Sena, da Agência iNFRA
As opiniões entre a imposição de restrições à participação de grupos empresariais no leilão de arrendamento do Tecon Santos 10, novo terminal de contêineres do porto de Santos (SP), e a livre concorrência para o certame, na audiência pública que tratou do tema, na última terça-feira (18), mostram que a o tema da disputa concorrencial está longe de estar pacificado.
A restrição ou não da concorrência a grupos empresariais ligados a armadores que já operam terminais de contêineres no porto foi o grande motivo de disputa que ajudou a atrasar a primeira tentativa de leiloar o projeto entre 2020 e 2021.
A expectiva entre agentes públicos era de que as mudanças no mercado de transporte de contêineres após a pandemia de Covid-19 e novas aquisições de transportadoras no Brasil pudessem mudar esse cenário e ajudar a acelerar o projeto que o governo quer leiloar até o fim deste ano. Mas não foi isso o que se viu no primeiro encontro público para tratar desse arrendamento, que será o maior do país.
A Abtra (Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados) e a ABTP (Associação Brasileira dos Terminais Portuários) indicaram que as mudanças do mercado de contêineres desde 2022 não são suficientes para alterar as previsões de restrição que foram encaminhadas na proposta de edital anterior.
O diretor-presidente da ABTP, Jesualdo Silva, pontuou que mudanças mercadológicas não são suficientes para sanar os riscos da falha de mercado. “Os remédios regulatórios não inviabilizam a participação de qualquer empresa no processo licitatório, mas, no eventual caso concreto de falha do mercado, eles entram em ação para garantir harmonia no setor”, disse.
A tese dos defensores da restrição à concorrência é que os terminais verticalizados, ou seja, que têm armadores de contêineres como controladores, praticam a self-preferencing, o que poderia criar problemas para os terminais não verticalizados (chamados de bandeira branca) de ficarem sem cargas para movimentar.
Em Santos, há três grandes terminais de contêineres. O BTP é verticalizado, controlado pelos dois maiores armadores do mundo, a MSC e a Maersk. O DP World é bandeira branca. E o Santos Brasil, que era um opositor do leilão do STS10, foi bandeira branca até o ano passado, quando foi adquirido pela CMA CGM, terceiro maior armador de contêiner do mundo.
Essa aquisição e o fato de a MSC e a Maersk terem rompido uma aliança de compartilhamento de carga em seus navios eram a esperança de uma redução no conflito concorrencial, que parece não ter ocorrido. Segundo uma fonte envolvida no processo, isso se dá porque há novos atores não armadores interessados na aquisição do Tecon 10, imaginando que as restrições podem ajudar nessa disputa.
Defensores da livre concorrência
O número de defensores da licitação sem restrição presente ao encontro foi maior do que os defensores da restrição. O consultor Luís Carlos Montenegro, da NeoWise consultoria, disse que os estudos que guiam a tramitação do Tecon Santos 10 precisam continuar comprometidos com a “plena liberdade de participação assegurando o ambiente de livre concorrência […]. A expectativa é que esses recursos reforcem esse compromisso”, afirmou.
O representante da Lourenço Ribeiro Advogados, Cássio Lourenço, também defendeu a “ampla participação de armadores no Tecon Santos 10”. “Não surpreendentemente há muitos que se aceleram na buscam de criar proibições e condicionantes de mercado para tentar proibir ou tentar limitar a participação de armadores nesse projeto, mas não trazem evidências de suporte às razões que levantam para fazer essa proibição”, pontuou.
Claudio Loureiro, diretor-executivo do Centronave, afirmou que a política pública deve evitar restrições que desestimulam os investimentos. “A ampla competição é crucial para garantir que o processo de licitação seja justo e benéfico para a economia. A competição extensa colabora para uma maior capacidade de escolha”, defendeu.
Nova análise concorrencial
De acordo com o presidente da comissão permanente de licitações e concessões e arrendamentos portuários da ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), Ygor Costa, já está sendo desenvolvida uma revisão da análise concorrencial considerando a mudança de cenário. “Vai ser dada ampla transparência, isso ainda vai ser encaminhado para a diretoria colegiada e depois para a análise do TCU [Tribunal de Contas da União]”, explicou.
Nos estudos concorrenciais feitos na proposta para licitar o STS10, em 2021, houve indicações para que fossem feitos dois tipos de restrição. Primeiro à entrada de armadores com terminais em Santos na disputa. Caso houvesse vitória de um armador desse tipo, que fossem colocadas restrições ex-ante à quantidade possível de movimentação, o que levou a severas críticas dos armadores.
O prazo para contribuições vai até a próxima segunda-feira (24). A audiência pode ser vista neste link. Para o diretor-geral interino da autarquia, Caio Farias, a medida é essencial para apresentar a modelagem do projeto e colher as contribuições da sociedade. “É o momento principalmente de escutar os possíveis interessados, os usuários do serviço e as autoridades […] sempre na busca da segurança jurídica e do aprimoramento do projeto”, afirmou.