Dimmi Amora, da Agência iNFRA
O líder do governo no Senado, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), afirmou que o governo está apoiando a proposta do Senado de incluir o setor de saneamento básico nas alíquotas reduzidas dos futuros impostos da Reforma Tributária, o IBS e o CBS, equiparando o setor ao da saúde.
Em entrevista após evento promovido pelas associações que representam empresas estatais e privadas do setor para falar sobre as consequências negativas da manutenção da cobrança da alíquota completa nesse setor, o senador afirmou que a não inclusão do saneamento na alíquota reduzida é a maior incoerência do texto do PLP 68/2024 (Projeto de Lei Complementar) aprovado pelos deputados.
“Essa é a mais grave incoerência no texto advindo da Câmara. Não ter equiparado a tributação do saneamento básico à da saúde, enquanto outros setores, e o mais gritante é exemplo sobre armas, vem com tributação mais próxima à da saúde”, comparou o senador.
Perguntado como a Fazenda se posicionava em relação à proposta de alteração, Randolfe afirmou que “há sensibilidade na Fazenda para essa mudança. Não só da Fazenda, há no governo, fazendo o reequilíbrio de outras alíquotas e, repito, de imperfeições e incoerências que vieram da Câmara.”
Randolfe disse ainda que não houve até o momento nenhuma restrição, em nenhum momento, do ministro Haddad com essa mudança.
“Em todas as conversas que fizemos, não há qualquer tipo de restrição em fazer alterações do texto”, disse o senador. “O governo tem a consciência de que não tem como o texto que veio da Câmara não ter retificações e correções no Senado. E essa é uma correção central”, afirmou Randolfe.
Mais 18 pontos percentuais
Desde que foi aprovada, no ano passado, a PEC da Reforma Tributária, os representantes das empresas estatais e privadas de saneamento vêm alertando que haverá um aumento significativo na alíquota cobrada hoje. O setor paga apenas alguns dos impostos que foram unificados para formar o IBS e o CBS, estimados em cerca de 9%.
A estimativa é que, com a alíquota cheia, o valor do recolhimento suba 18 pontos percentuais. A proposta aprovada na PEC e regulamentada no PLP determina que os contratos sejam reequilibrados, ou seja, que as empresas sejam compensadas pelo valor a mais que passarem a recolher.
No entanto, a indicação é que isso só pode ser feito ou com um significativo aumento nas tarifas de água e esgoto ou a postergação e corte de obras, o que afetaria o cumprimento das metas de universalização do atendimento, previstas também em lei, para 2033.
Na votação da PEC da Reforma Tributária em 2023, os senadores aprovaram uma emenda ao texto da Câmara incluindo o setor na alíquota reduzida em 60%, o que nos cálculos resultaria numa alíquota muito semelhante à atual. Mas a mudança foi vetada na Câmara. Agora, a Câmara novamente não aceitou emendas no PLP 68 para equiparar o setor ao de saúde.
Nova tentativa no Senado
Os senadores, no entanto, devem novamente tentar fazer a inclusão. O pedido já consta no relatório de um Grupo de Trabalho formado por 21 senadores da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) que propôs cerca de 50 alterações no texto que veio da Câmara, entre elas a inclusão do saneamento na alíquota diferenciada.
Antes da fala do líder do governo, o senador Eduardo Gomes (PL-TO), que é o autor da emenda para a inclusão do setor na alíquota diferenciada, disse acreditar que será possível fazer a mudança e votar o PLP ainda neste ano. Mas, segundo ele, é necessário convencer os parlamentares a fazer a mudança.
“Tivemos eleições agora em 5.570 cidades. Foram eleitos mais de 57 mil vereadores e eu não conheço nenhum que defendeu aumento de imposto para o setor de saneamento”, afirmou Gomes em sua apresentação no evento, que pode ser vista neste link.
3,8 mil contratos em mais de 100 agências
Roberto Correa Barbuti, CEO da Iguá Saneamento e presidente do Conselho de Administração da Abcon Sindcon (Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviço Público de Água e Esgoto), lembrou da dificuldade operacional de fazer mais de 3,8 mil reequilíbrios de contratos em mais de 100 agências reguladoras espalhadas.
Somente em contratos privados já assinados para investimentos no setor são mais de R$ 150 bilhões. Segundo ele, o pleito de mudança é mais da sociedade do que das empresas propriamente.
“No limite, os contratos serão reequilibrados. As empresas serão preservadas e o prejudicado será a velocidade dos investimentos e a questão do aumento tarifário para a população”, explicou Barbuti em entrevista.
“Vai ser o caos dos dois lados”
O presidente da Aesbe (Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento), Ricardo Soavinski, também presidente da Saneago (Companhia de Saneamento de Goiás), lembrou que os investimentos previstos para a universalização estarão ameaçados se não houver a mudança.
“As empresas serão obrigadas a reajustar suas tarifas para manter a sustentabilidade financeira. Isso não só aumentará os custos ao consumidor, mas limitará os investimentos necessários para expandir e melhorar a infraestrutura no setor”, explicou.
Munir Abud, diretor da Cesan, lembrou que já foi presidente de uma agência reguladora e não acredita que será possível fazer os reequilíbrios dos contratos como está previsto na legislação.
“Sei o caos que isso vai ser, do lado de cá [empresas] e de lá [agências]. Conheço a realidade dos dois lados”, disse o diretor da empresa estatal. “A confusão é muito maior do que um aumento de alíquota que vai cair no colo da população, o que, por si só, já é catastrófico.”