Amanda Pupo, da Agência iNFRA
O Ministério dos Transportes, que tenta destravar uma carteira ferroviária, vai reavaliar os estudos para conceder as rodovias da chamada Rota Agro Central, considerando efeitos da almejada malha de ferrovias no projeto. A modelagem contempla 887,6 quilômetros das BRs 070, 174 e 364, no Mato Grosso e em Rondônia. A proposta seria julgada na quarta-feira (3) pelo TCU (Tribunal de Contas da União), mas teve a análise sobrestada a pedido da pasta. Veja o acórdão.
Em ofício à Corte, a Secretaria Nacional de Transporte Rodoviário do ministério afirmou que a solicitação tinha como fundamento, em primeiro lugar, as manifestações recentes apresentadas pelo setor produtivo, “que evidenciam a necessidade de aprofundamento da análise da atratividade logística do empreendimento, especialmente à luz da carteira de projetos ferroviários”. O cronograma de leilões da pasta para o setor de ferrovias foi lançado oficialmente na semana passada.
Os segmentos da Rota Agro Central compõem sistema importante de escoamento da produção agrícola da região e a concessão está na carteira de projetos do ministério para 2026. Na área de influência dessas rodovias estão dois projetos ferroviários que o governo quer leiloar no próximo ano: a Ferrogrão, que liga Mato Grosso e Pará, e o Corredor Leste-Oeste, que seria formado por trilhos que iriam de Lucas do Rio Verde (MT) a Ilhéus (BA).
Mas antes mesmo do pedido do Ministério dos Transportes ao TCU, a área técnica do tribunal, ao avaliar o projeto, já havia feito uma análise sobre a relação desta concessão com as aspirações ferroviárias da pasta. A avaliação da AudRodoviaAviação (Unidade de Auditoria Especializada em Infraestrutura Rodoviária e de Aviação Civil), contudo, era de ressalva sobre os reais impactos das ferrovias nas projeções de tráfego da Rota Agro Central.
Segundo a área técnica, o projeto incorporou impactos negativos na projeção de receitas em função da expectativa de entrada em operação de ferrovias “em prazo não embasado na realidade dos fatos”. “Esses eventos futuros e incertos conduzem a menor disponibilidade de recursos para a execução de investimentos, a exemplo da exclusão de 154 km de terceiras faixas realizada na versão atual do projeto”, afirmou a auditoria.
Para os técnicos, um estudo “mais realista no que diz respeito ao momento de entrada em operação das ferrovias e ao consequente impacto na redução de tráfego e arrecadação poderia trazer ao projeto equilíbrio entre atratividade e benfeitorias”.
Por isso, a AudRodoviaAviação chegou a recomendar que a corte, ao julgar o projeto, determinasse à ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) que alterasse os estudos para inserir 13,4 km de terceiras faixas no sétimo ano da concessão e 20,5 km no oitavo ano, retirando-as da condição de obras de gatilho.
Queria ainda que o tribunal recomendasse à ANTT que reduzisse a distância média entre faixas adicionais em trechos longos de pista simples para minimizar comboios, reduzir risco de ultrapassagens perigosas e prejuízos aos transportadores. Como o projeto no TCU foi sobrestado a pedido do Ministério, contudo, o relator, ministro Benjamin Zymler, acabou não entrando no mérito das orientações da unidade técnica.
“O projeto em questão apresenta impactos diretos sobre um importante corredor logístico de exportação, o que impõe reavaliações quanto à integração intermodal, à eficiência operacional e aos potenciais efeitos sobre os fluxos de escoamento da produção agroindustrial”, observou o Ministério dos Transportes no pedido ao TCU.
“Considerando a amplitude e a relevância dessas repercussões, entende-se prudente que a deliberação seja temporariamente sobrestada, de modo a permitir a conclusão das análises técnicas em curso por esta Pasta e pelos demais órgãos envolvidos e a avaliação quanto à necessidade de eventuais adequações no estudo”, disse a pasta.
O relatório final da minuta do projeto de concessão da Rota Agro Central foi aprovado pela ANTT em junho deste ano. Pela modelagem, o Capex estimado para o projeto foi de R$ 5,9 bilhões, com Opex de R$ 3,5 bilhões.
Transparência
A corte também julgou nesta quarta uma auditoria do TCU que havia identificado fragilidades na divulgação das obrigações contratuais e no acompanhamento do cumprimento dos PERs (Programas de Exploração de Rodovia) sob gestão da ANTT. Como mostrou reportagem da Agência iNFRA, foram quatro achados pela unidade técnica.
Entre outros pontos, o tribunal determinou que a ANTT, no prazo de 180 dias, dê publicidade à existência das bases de dados sobre a fiscalização e acompanhamento do cumprimento das obrigações contratuais das concessionárias (base do Sigicor), mediante revisão do Plano de Dados Abertos 2025-2027. A agência também deverá divulgar em formato acessível as informações sobre as obrigações contratuais previstas nos PERs, bem como sobre o andamento e o cumprimento dessas obrigações.
Precisará também padronizar as informações sobre as concessões rodoviárias disponíveis em seu portal, contendo no mínimo:
- informações gerais e histórico do contrato;
- seções e documentos disponíveis;
- documentos contratuais e de gestão; e
- links de acesso a portais externos, painéis e páginas internas.
Em nota, a ANTT informou ter atuado de forma colaborativa durante toda a auditoria que deu origem ao acórdão, manifestando concordância com os principais achados e demonstrando disposição para adotar as melhorias recomendadas.
A agência disse ainda que já iniciou a implementação de diversas ações voltadas à ampliação da transparência ativa, em especial no que se refere à disponibilização de informações sobre as obrigações contratuais das concessionárias, o acompanhamento das obras previstas nos PERs e a padronização dos dados públicos sobre concessões rodoviárias.
“Durante o desenvolvimento da auditoria, a ANTT apresentou ao Tribunal de Contas da União (TCU) as limitações orçamentárias atualmente enfrentadas, bem como os impactos dessas restrições na velocidade de implantação das melhorias propostas”, assinalou a ANTT.
“Ainda assim, conforme destacado no pronunciamento da unidade técnica, ‘durante a auditoria, a Agência adotou uma postura colaborativa, mostrando abertura às ideias apresentadas e empenho em aprimorar a transparência das informações. Essa atitude proativa resultou em avanços concretos, com o início da implementação de soluções propostas no relatório. As iniciativas da ANTT refletem uma resposta direta e construtiva ao trabalho de fiscalização, evidenciando o impacto positivo do controle externo'”, concluiu a agência.








