Dimmi Amora, da Agência iNFRA
O TCU (Tribunal de Contas da União) apresentou em uma consulta pública, na última quinta-feira (8), a matriz de planejamento do que será sua primeira auditoria para avaliar os motivos de as ferrovias brasileiras terem partes abandonadas e não atenderem a um maior espectro de clientes.
A ferrovia escolhida como uma espécie de teste foi a Malha Oeste, trecho de cerca de 2 mil quilômetros que liga o Mato Grosso do Sul a São Paulo. A Malha Oeste é uma das ferrovias sob controle da Rumo, que nesse trecho atende praticamente só quando é obrigada pelo governo.
Nesse tipo de trabalho do tribunal, chamado de auditoria operacional, os auditores fazem uma série de levantamentos de dados sobre o tema e vão a campo para entrevistas com agentes que tenham algum interesse. A mais recente auditoria desse tipo concluída foi a que comparou os terminais portuários privados e públicos, votada nesta semana pelo plenário órgão.
No evento desta quinta-feira, disponível neste link. Os auditores da SeinfraPortoFerrovia, responsáveis pelo trabalho, indicaram quais vão ser os temas de auditoria que serão avaliados. A apresentação está neste link. A relatoria dessa auditoria será do ministro Raimundo Carreiro.
De acordo com o responsável pelo levantamento, o auditor João Manoel Dionísio, a avaliação prévia apontou para três pontos a serem analisados na auditoria: a forma como a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) atua para assegurar a prestação do serviço adequado; a forma como a ANTT atua para induzir o atendimento à demanda; e como a agência atua para garantir a manutenção dos bens da concessão.
Entre os temas a serem avaliados, estão a verificação da existência de parâmetros e faixas adequadas para atingir as metas do contrato; e a verificação se a ANTT está adotando procedimentos para induzir melhorias e ampliação do atendimento.
Segundo os auditores também será analisada, por exemplo, a confiabilidade dos dados fornecidos pela concessionárias sobre as metas de produção por trecho. A intenção, segundo os auditores, é ainda analisar os motivos que levaram os clientes a deixarem de transportar por ferrovia e porque algumas cargas não usam esse meio de transporte.
O diretor da secretaria, Jairo Misson, lembrou que a apresentação prévia dos questionamentos é para indicar se o trabalho está no caminho adequado e se há outros temas que precisam ser tratados na auditoria.
E já recebeu uma contribuição inicial do presidente da Anut (Associação Nacional dos Usuários de Transportes), Luiz Baldez, que pediu para que fosse avaliado não somente o trabalho da ANTT, mas também do poder concedente, que é o Ministério da Infraestrutura.
Problemas desde a origem
O superintendente em exercício da Superintendência de Transportes Ferroviários da ANTT, Jean Mafra, apresentou um histórico da Malha Oeste que, segundo ele, tem problemas praticamente desde o início do contrato, quando seu principal fluxo, o de combustíveis, foi impactado por uma decisão do governo de alterar regras de transporte do produto.
Por causa disso, a então responsável pela concessionária entrou com um pedido de reequilíbrio. Mas, segundo Mafra, a ANTT não deixou de atuar para fazer com que o contrato fosse cumprindo. Em 2011, atuou para obrigar a empresa a informar se devolveria trechos abandonados ou os recuperaria.
De acordo com ele, a partir de 2017, pelo fato de a empresa ter indicado a recuperação dos trechos, mas não estar operando, foi aberto o procedimento que pode levar à caducidade da concessão.
Jaime Verruk, secretário de Desenvolvimento Econômico do Mato Grosso do Sul, lembrou que a situação de paralisação do atendimento da ferrovia vem desde 2016 e afirmou que ela precisa ser solucionada, mesmo reconhecendo os problemas de competitividade da ferrovia. Ele citou que atualmente empresas do estado estão transportando em caminhões cargas de minério que não podem ser escoadas por sistema de hidrovias devido à seca.
Prejuízo em todos os anos
O representante da Rumo, Guilherme Penin, lembrou que a ferrovia nunca operou no positivo. Segundo ele, os fluxos que hoje seriam adequados para o transporte – um pequeno trecho de transporte de minério, um trecho de transporte de celulose e outro de cargas agrícolas – não estão adequados ao transporte ferroviário na Malha Oeste.
Penin pediu para que a análise se volte para encontrar uma nova vocação da malha. Lembrando que após a Rumo assumir as concessões, ela tem ampliado o atendimento aos clientes, o diretor da empresa indicou que ela não pode operar com prejuízo, lembrando que as empresas anteriores quebraram, citando a Rede Ferroviária, a Brasil Ferrovias e a ALL.
Baldez, da Anut, concordou que a companhia não pode trabalhar para ter os retornos abaixo da expectativa do mercado, mas informou que está trabalhando no governo federal para tentar viabilizar fluxos ferroviários que tenham incentivos para que possam ser feitos com retornos menores que os pedidos pelos acionistas das empresas ferroviárias, segundo ele na faixa dos 15%.
O advogado Leonardo Ribeiro, sócio da LL Advogados, apontou que a auditoria do tribunal terá como ganho contribuir para o maior desenvolvimento do setor ferroviário. Ele lembrou que a renovação antecipada dos contratos poderá dar os incentivos necessários para o setor privado ampliar a operação das vias, o que não era o objetivo dos contratos firmados na década de 1990, quando elas foram concedidas.
Ferrovia Norte-Sul
Durante o evento, o representante da Rumo, Guilherme Penin, informou que a empresa deverá antecipar em pelo menos seis meses o início da operação da Ferrovia Norte-Sul entre Tocantins e São Paulo.
A ferrovia foi concedida pelo governo no início do ano passado, e a Rumo, vencedora da disputa, tinha um prazo de dois anos após a assinatura do contrato para concluir obras inacabadas e iniciar a operação.