Em projeto de lei, governo quer ampliar forma de BNDES financiar obras no exterior

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

O governo federal encaminhou proposta ao Legislativo para ampliar a forma como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) pode financiar obras e serviços no exterior, permitindo que haja inclusive aquisição de bens fora do país.

A proposta foi encaminhada nesta segunda-feira (27) na Mensagem 621 ao Congresso Nacional, que se tornou o PL (Projeto de Lei) 5.719/2023 da Câmara, para instituir regras que autorizam o BNDES a “constituir subsidiárias integrais ou controladas, e alterar a Lei nº 10.184, de 12 de fevereiro de 2001, que dispõe sobre a concessão de financiamento vinculado à exportação de bens ou serviços nacionais”.

A proposta põe em lei a permissão para que o banco empreste recursos ou ofereça garantias para que empresas nacionais que vendem produtos, serviços ou obras no exterior possam adquirir bens no Brasil para realizar essas vendas ou projetos no estrangeiro. 

A prática fez o país financiar quase R$ 40 bilhões entre 2003 e 2012, segundo dados do banco, mas foi praticamente paralisada desde que foram levantadas suspeitas sobre parte dessas operações de financiamento a obras no exterior no âmbito da Operação Lava Jato, entre 2014 e 2016.

O governo agora quer retomar esse tipo de investimento de empresas brasileiras, mas esbarra na falta de segurança jurídica para que os servidores possam autorizar os empréstimos. Por isso, na avaliação de Evaristo Pinheiro, advogado do escritório Barral, Parente e Pinheiro e ex-analista de Comércio Exterior da Camex, o PL é necessário, mesmo com seu texto original sendo na prática uma reprodução do que é permitido ao BNDES fazer por suas regras internas.

“Os servidores ainda estão sofrendo muito com as decisões do TCU [Tribunal de Contas da União] sobre isso e sem dúvida que um PL vai dar maior segurança”, disse Pinheiro, que também presidiu o Sinicon, associação que representa grandes empreiteiras que se utilizavam do crédito. 

Fornecedores no Brasil
Na justificativa do PL encaminhado ao Congresso, o governo justifica que os financiamentos movimentam a economia nacional. Ao longo da operação, criou-se por parte dos partidos de oposição ao governo da época, uma narrativa de que os financiamentos ao exterior eram para beneficiar apenas os recebedores, sem benefícios ao Brasil. 

“Os financiamentos às exportações de serviços de engenharia realizados pelo BNDES entre 2007 e 2015 movimentaram uma rede de 4.044 fornecedores diretos no Brasil, sendo 2.785 microempresas e empresas de pequeno porte (MPME)”, informa a justificativa do projeto de lei encaminhada à Câmara.

Ainda de acordo com a proposta, “entre 2003 e 2012, as empresas brasileiras de engenharia e construção apoiadas exportaram 19 vezes mais bens brasileiros para mercados em que atuavam com apoio do BNDES do que para outros países onde atuavam sem financiamento do BNDES”. 

Os dados do banco indicam ainda que foram desembolsados pelo BNDES R$ 22,2 bilhões, “que retornaram aos cofres públicos, incluindo o Fundo de Amparo ao Trabalhador, na forma de pagamentos de US$ 12,8 bilhões de principal e juros (equivalentes a R$ 39,3 bilhões, considerando o câmbio das datas dos repagamentos)”.

Calotes dados por Venezuela, Cuba e Moçambique em relação a esses empréstimos também atiçaram os discursos contrários ao modelo. O PL tem um artigo que impede o banco de fazer empréstimos aos inadimplentes até que regularizem suas dívidas.

Gastos locais
O avanço em relação às regras atuais fica por conta da permissão para que o banco possa financiar também a aquisição de bens locais nos países onde são feitos os investimentos, em níveis que torne as empresas brasileiras competitivas no local. O governo diz que isso é uma prática difundida entre as agências de crédito à exportação pelo mundo. 

“Ao não apoiar determinados gastos locais previstos como necessários para a realização de projetos que geram demanda para exportações brasileiras, diminui-se a competitividade nacional, em benefício de exportações a partir de outros países cujas Agências de Crédito à Exportação estrangeiras permitem tal apoio combinado”, informa o texto, lembrando que o limite da participação dos gastos locais ficará definido em regulamento do Poder Executivo.

Evaristo Pinheiro diz que a regra de financiar gastos fora do país ainda ficará aquém da prática dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) atualmente e que ela é necessária para que se possa ser competitivo no mercado. Pinheiro diz ainda que seria preciso ter um reforço na proposta à segurança jurídica para os gestores que autorizam os financiamentos.

O advogado diz que o timing de envio do projeto requer do governo atenção, visto que são várias as propostas de parlamentares tramitando nas duas casas para impedir totalmente esse tipo de financiamento. Para ele, será necessário usar toda a energia para que o projeto seja aprovado sem ser desfigurado.

Subsidiárias
A proposta também permite ao banco criar subsidiárias no Brasil. Na justificativa, o governo diz que isso é importante para que o BNDES possa se estruturar para reforçar suas fontes de captação internas e externas, de maneira complementar ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), para suas operações de financiamento.

“Trata-se de algo usual para os Bancos de Desenvolvimento no exterior, a exemplo do alemão Kreditanstalt für Wiederaufbau (KfW), cuja principal fonte de recursos é sua própria captação, e que adequou a sua estrutura operacional para atender áreas de negócios específicas, tais como exportações e negócios internacionais, transição climática, startups e pequenas empresas, habitação, dentre outras”, diz o texto.

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