Com aprofundamento de canal no Pará, falta de ferrovia será limitador para expansão de navios no arco amazônico

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

Os terminais portuários e estações de transbordo que formam o chamado Arco Amazônico ampliaram em 2023 a liderança do país na exportação de granéis agrícolas em relação aos terminais no Sul e Sudeste.

Com dados ainda preliminares, a expectativa do diretor-presidente da Amport (Associação dos Terminais Portuários e Estações de Transbordo da Bacia Amazônica), Flávio Acatauassú, é de que a liderança conquistada em 2022, com 51% da carga exportada, possa chegar a algo na casa dos 55% em relação aos outros portos nacionais.

A confiança vem da informação de que todos os 13 associados apresentaram ao fim de 2023 dados indicando ampliação dos volumes exportados em relação a 2022, quando eles alcançaram 41,5 milhões de toneladas. Uma década atrás, essas quantidades não alcançavam 10 milhões de toneladas ao ano.

A ampliação da quantidade de terminais, melhorias operacionais em cada um deles e novas tecnologias trazidas, como o transbordo de carga entre navios e barcaças feito nas águas dos rios amazônicos, explicam em parte a ascensão meteórica do transporte nessa região entre o Pará e o Maranhão.

As águas abrigadas e profundas dos rios, que têm dimensões oceânicas, e os movimentos para a construção de mais estruturas indicam que no futuro devem aumentar ainda mais os volumes transportados na região. Flávio aponta para algo na casa dos 100 milhões de toneladas em cinco anos.

“Só temos um limite para isso: a ferrovia”, lamenta o diretor-presidente da associação, que já dirigiu a área de hidrovias do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e trabalhou na construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

Logística mais barata
A ferrovia a que ele se refere é a Ferrogrão, projeto de cerca de mil quilômetros que ligaria a principal área de produção do Mato Grosso, a região de Lucas do Rio Verde, ao distrito de Miritituba, no Pará, onde já há pelo menos 17 estações de transbordo de carga funcionando ou em projeto no Rio Tapajós.

As cargas que saem dos caminhões que atravessam o trecho hoje pela BR-163 são colocadas em barcaças, nessas estações em Miritituba, que descem o rio Tocantins até Barcarena, a cerca de 1,2 mil quilômetros, onde os navios podem atracar em portos ou até mesmo em estações de transbordo flutuante para receber os grãos.

Essa logística tornou-se a mais barata para exportar os produtos agrícolas da região norte do Mato Grosso depois que a BR-163 foi completamente asfaltada até os terminais portuários de Miritituba, entre 2017 e 2019, criando assim o incentivo para o crescimento da região. Em relação aos outros portos usados anteriormente, Santos (SP) e Paranaguá (PR), a estimativa é de uma queda na casa dos 40%.

Descarbonização
Essa operação, segundo Flávio, tem outra vantagem em relação às exigências logísticas do mundo atual, que é a de descarbonização. Não basta apenas que a carga chegue de forma mais barata ou rápida, mas que também gere menos carbono, o que, segundo ele, a operação por barcaça pelos rios faz, por consumir menos de 10% do combustível de um transporte de caminhão.

“Quem não se enquadrar nesses critérios, em pouco tempo não vai conseguir negociar seu produto”, alerta o engenheiro.

A criação de estações flutuantes, nas quais um guindaste acoplado a um flutuante tira a carga das barcaças e leva para os navios, de comboios de barcaças cada vez maiores, com até 35 unidades, que podem transportar 70 mil toneladas de uma vez, deram outro impulso que levou à liderança.

O próximo passo, segundo Flávio, são as ampliações de terminais na região de Barcarena. Cargill e LDC, duas das maiores tradings do planeta no setor, estão com projetos prontos para serem executados na margem oposta a que estão os terminais que hoje operam em Barcarena.

Canal do Quiriri
Há ainda a necessidade de se aprofundar o canal do Quriri, que é por onde os navios têm que passar para chegar ao oceano Atlântico, o que Flávio aponta que deverá ser alcançado rapidamente. 

Ele conta que a associação investiu em estações de informação em tempo real para que a Marinha pudesse permitir calados maiores. Somente com esse investimento, já foi possível passar o calado de 13,5 metros para 13,9 metros.

Por ser uma área de rio, as regras da Marinha determinam que a distância entre a quilha do navio e o fundo deve ser de 1,5 metro, mas a associação também está estudando maneiras de reduzir essa permissão para um metro, o que poderia elevar o calado para 14,5 metros. 

“Com isso, já teríamos o mesmo calado de Santos. Mas não há dificuldades para se dragar e chegarmos a 15, 16, 17 metros. O limite são os portos receptores”, conta Flávio, citando o caso de um navio que saiu ano passado com volume de carga abaixo do que poderia para ficar com um calado de 13 metros porque o porto de recepção, Roterdã, na Holanda, não tinha capacidade para mais.

Meio ambiente
Mas os 100 milhões de toneladas previstos para exportação causam preocupação por causa do gargalo que será o transporte entre Mato Grosso e Pará pelo único caminho possível hoje, a BR-163. Mesmo concedida, a estrada é em pista simples. O volume de caminhões atual já traz desafios operacionais e na relação com a cidade.

Para o diretor-presidente, somente a ferrovia, com capacidade estimada para levar anualmente 60 milhões de toneladas, daria as condições adequadas para garantir um fluxo contínuo e também de baixo carbono, já que o transporte ferroviário também consome menos que o rodoviário.

Mas as dificuldades impostas para a construção da Ferrogrão, até o momento, causam um certo desânimo no engenheiro, que passou por situações complexas na construção da hidrelétrica. E alguma indignação.

“Eu não consigo entender o que uma ferrovia pode causar de dano ao meio ambiente maior que uma rodovia”, avalia Flávio. (O repórter viajou a convite da Amport)

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