Marisa Wanzeller e Leila Coimbra, da Agência iNFRA
O Decreto 11.910, publicado na última quarta-feira (7), altera os atos de designação de procurador-geral para as agências reguladoras, dentre outras autarquias, e reforça o entendimento de que o “dirigente máximo da entidade” é o responsável pela indicação do nome.
No ano passado, diretores da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) se insurgiram contra a condução do diretor-geral, Sandoval Feitosa, na substituição do então procurador Luiz Eduardo Diniz. Na reunião pública da reguladora de 8 de agosto de 2023, o diretor Fernando Mosna alegou que Feitosa teria agido “às escondidas” ao indicar o advogado-geral Paulo Firmeza para o cargo “sem passar pelo crivo no colegiado”, articulando a nomeação com a AGU (Advocacia Geral da União), sem o aval do restante da diretoria.
Na mesma reunião, Fernando Mosna e o companheiro de diretoria, Ricardo Tili, abandonaram a deliberação dos processos, retirando-se da sala, em protesto. Segundo fontes, a “rebelião” dos diretores gerou indisposição não apenas na agência, como também na AGU. Portanto, o decreto seria uma resposta a esse episódio. Assista aqui à 28º reunião ordinária da ANEEL, em 8 de agosto de 2023 (16 minutos).
Firmeza acabou não sendo nomeado para o cargo após a confusão, e Raul Lisboa, apadrinhado pelo PSD, partido do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, foi indicado e tomou posse na função de procurador-geral da ANEEL.
O Decreto 11.910 alinha os critérios para a indicação e nomeação dos procuradores-gerais, e deixa claro que o advogado-geral da União é quem formaliza a indicação. Nos casos das “agências reguladoras, de instituições federais de ensino superior, do Banco Central do Brasil e da Unidade de Inteligência Financeira”, o direito de escolha do nome é do “do dirigente máximo da entidade”.
“Protagonismo da AGU e da reguladora”
Na avaliação do ex-procurador geral e atual sócio do escritório Wald Advogados, Luiz Eduardo Diniz, “o decreto reforça o protagonismo da AGU e dos diretores-gerais das agências reguladoras”.
“O decreto publicado altera o fluxo das nomeações e exclui a participação do ministério setorial. Assim, a inserção no sistema de nomeações para o cargo de procurador-geral de agência reguladora e de instituição de ensino federal é feita pela inserção no sistema pelo advogado-geral da União após oitiva do dirigente máximo da entidade. Afasta, portanto, a interferência política do MME [Ministério de Minas e Energia], no caso da ANEEL”, explica.
Diniz afirma que a indicação pelo diretor-geral já era algo comum na agência, e o decreto apenas “institucionalizou” esse processo.
“Aval do colegiado”
Na reunião de 8 de agosto, Mosna iniciou seu protesto criticando um “flash” enviado pela Agência iNFRA aos seus assinantes, que relatava o descontentamento do restante dos diretores com a indicação feita por Feitosa.
“Na matéria é colocado literalmente que a indicação do procurador-geral é prerrogativa do ministro da AGU e que o nome foi alinhado com o DG [diretor-geral] da ANEEL, o diretor Sandoval Feitosa, e que não precisaria da aprovação da agência, não teria que ter o aval do colegiado. Só que o nome não teria agradado parte dos diretores. E aqui é por onde eu principio, porque da minha parte, e eu tenho certeza, ou da parte de qualquer um dos diretores, nunca teve qualquer divergência quanto ao nome”, disse.
Em seguida, porém, Mosna se contradisse, contando que acreditava que o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, também teria sido desrespeitado pela forma com que o diretor-geral estava conduzindo o processo.
“Eu consegui identificar que nós, quatro diretores, não fomos os únicos desconsiderados ou desrespeitados. Também o Ministério de Minas e Energia, na figura do ministro de Minas e Energia, porque o ofício, como nós vemos, deveria ter sido enviado para ele. (…) Esse tipo de postura do diretor-geral, para mim, particularmente, faz com que não tenha condições no ambiente para tratarmos aqui de temas, ficarmos discutindo questões regulatórias, sabendo que fomos apunhalados pelas costas”, afirmou, retirando-se logo após, com o colega Tili.
Indicações
Posteriormente, a Agência iNFRA apurou que o descontentamento de Mosna e do diretor Ricardo Tili, que o acompanhou no protesto do dia 8 de agosto, deu-se porque teriam o interesse de indicar outro nome para o cargo, Thiago Carrion, advogado da União alinhado ao grupo e próximo do ex-secretário-executivo de Minas e Energia Efrain Cruz. Ambos negaram a informação e disseram que apoiariam um nome interno da reguladora.
“Não tive a oportunidade de discutir nomes, mas se me consultassem eu sugeriria qualquer um dos procuradores da ANEEL”, disse Mosna à Agência iNFRA à época do acontecimento.
Atualmente, Raul Lisboa está na cadeira de procurador-geral da ANEEL, após cerimônia ocorrida em 23 de novembro de 2023. Ele assumiu a Procuradoria Geral da agência com o aval de Gilberto Kassab, cacique do partido.