Amanda Pupo, da Agência iNFRA
A exigência para as empresas aéreas ampliarem a frequência de voos entre os aeroportos da Amazônia Legal e do Nordeste como condição de acesso ao crédito com recursos do FNAC (Fundo Nacional de Aviação Civil) pode passar por uma revisão. O requisito será mantido, mas técnicos do MPor (Ministério de Portos e Aeroportos) estão avaliando possíveis adequações nos parâmetros.
A análise ocorre após as companhias avaliarem que as condições colocadas tornaram o acesso ao crédito desenhado pelo governo inviável neste momento, por cobrar uma ampliação considerada muito expressiva nos voos dessas duas regiões. Aprovada em outubro pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), a regra integra a resolução que estabelece todas as condições do financiamento do FNAC – cuja fase de regulamentação só deve ser encerrada no início de 2026.
A cobrança por mais voos no Norte e Nordeste está inserida numa política do MPor de tentar ampliar a aviação regional, especialmente em regiões historicamente menos atendidas. A iniciativa casa com o AmpliAR, programa de concessão de terminais deficitários para operadoras de grandes aeroportos, que na primeira rodada conseguiu levantar propostas para 13 das 19 unidades colocadas no mercado.
Mas a agenda tem alguns obstáculos para acontecer na medida desejada pelo Executivo, em parte porque a aviação regional sofreu um baque com a sucessão de recuperações judiciais das aéreas, em especial da Azul, forte nesse segmento. O alto custo para operar em regiões com menor demanda e nas quais ainda não há um mercado criado está entre as outras dificuldades do setor.
Aumento de 30%
Segundo a resolução do CMN que está em vigor, a empresa aérea que quiser pegar emprestado com recursos do FNAC – financiamento em real e que terá juro de até 7% ao ano – vai precisar promover um incremento de, no mínimo, 30% na proporção anual de frequências operadas pela companhia entre aeroportos da Amazônia Legal e do Nordeste. A ampliação deverá ser em relação à proporção praticada no ano anterior ao pedido de financiamento.
Na prática, se uma empresa opera 10% de frequências dentro das duas regiões, ela precisará aumentar esse número para 13%. A resolução contém ainda uma regra alternativa, pela qual a empresa deve garantir que pelo menos 20% do total de suas decolagens anuais sejam realizadas com origem e destino situados nas duas regiões. A meta da contrapartida precisa ser atingida num prazo de 18 meses a partir da aprovação do financiamento.
O patamar foi definido a partir de um estudo sobre o porcentual operado pelas três maiores companhias – Azul, Gol e Latam – dentro da Amazônia Legal e do Nordeste. Por isso, a avaliação de técnicos da pasta é de que, apesar do apontamento feito pelas aéreas, a contrapartida nesses moldes seria possível.
Já entre as companhias o que se chama atenção é que a malha regional enxugou no últimos tempos. Assim, o aumento almejado exigiria um esforço maior nos planos de negócios. Hoje, as aéreas atendem 138 destinos nacionais. Mas esse número já chegou a 160 no passado.
Por entender que não é ideia do governo impor um ônus muito grande às companhias é que a área técnica do MPor está avaliando algum nível de adaptação nos parâmetros, preservando o intuito da contrapartida. O fato de não ser mais esperado que contratos de empréstimo possam ser fechados neste ano também dá mais tempo para as empresas e o governo conversarem sobre as possíveis revisões.
“Vitória”
Na terça-feira (16), o presidente da Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas), Juliano Noman, classificou o programa do FNAC como uma “bela vitória”, mas também observou que o financiamento ainda não parece acessível nas condições atuais. “Se neste primeiro não for acessível, não é o fim do mundo, porque o produto pode ser melhorado. É um processo natural. Sabemos o quanto o governo se esforçou. É um produto que tem potencial. A história é tentar olhar o filme, não a foto”, disse Noman a jornalistas.
Também ontem, foi publicada a resolução do Comitê-Gestor do FNAC que estabelece o limite global de empréstimo, definido em R$ 4 bilhões para 2025 – conforme previsto no orçamento. Apesar da previsão, não há expectativa de que os recursos sejam usados neste ano.
Para além de eventuais revisões na resolução do CMN, o MPor ainda precisa celebrar contrato com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para que ele seja o operador do crédito. Isto está previsto para ocorrer nos próximos dias. Já a outra resolução do comitê gestor do fundo pendente será publicada no início do próximo ano. Nesse meio tempo, o banco de fomento deve se preparar para a estruturação das linhas.
Panorama de 2025
A expectativa da Abear é que o ano feche com patamar próximo de 130 milhões de passageiros transportados, o que seria um recorde para o setor. Até outubro, foram 106,8 milhões – 83,3 milhões no doméstico e 23,5 milhões no internacional, segmento que, recuperado mais facilmente após a crise da Covid-19, tem praticamente dobrado na participação de passageiros totais.
Apesar do bom momento, as aéreas reforçam que há uma ampla agenda de custos para ser atacada no Brasil, de forma a permitir que a classe C entre efetivamente no mercado de aviação comercial. Parte do problema, o aumento previsto para o imposto de renda do leasing e a elevação do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) são tema de tratativas com a equipe econômica, disse Noman.
“Estamos confiantes que vamos conseguir endereçar IOF e IR”, disse o presidente da Abear. O IR sobre o arrendamento de aeronaves está aumentando de forma escalonada desde 2024. Em 2025 foi a 2% e no próximo ano vai a 3%. O impacto maior, contudo, está previsto para 2027, quando a alíquota vai a 15%.
Noman também reforçou a preocupação com os efeitos da reforma tributária sobre o consumo, o custo da transição para o SAF (Combustível Sustentável de Aviação) e o problema crônico da alta judicialização. Sobre o último tópico, duas frentes são monitoradas pelas aéreas.
Uma é o processo de repercussão geral no STF (Supremo Tribunal Federal), no qual foram suspensos todos os processos judiciais contra companhias aéreas referentes a indenização por dano moral devido a atraso ou cancelamento de voos causados por caso fortuito ou força maior. O mérito ainda será julgado. A outra é a revisão da Resolução 400 da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), que estabelece as obrigações das empresas e os direitos dos passageiros.
Para Noman, mesmo que o STF eventualmente decida de forma favorável as aéreas, uma revisão da norma da ANAC ainda será necessária, especialmente para detalhar as situações em que as empresas são ou não responsáveis por atrasos e cancelamentos de voos.








