Marisa Wanzeller e Leila Coimbra, da Agência iNFRA
A diretoria da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) aprovou nesta terça-feira (15) a abertura de CP (Consulta Pública) que condiciona a renovação dos contratos de concessão das distribuidoras de energia à renúncia de ações judiciais. No entendimento da reguladora, tanto as empresas quanto a Abradee (Associação dos Distribuidores de Energia Elétrica) devem abrir mão de pleitos em andamento para que o termo aditivo seja assinado, renovando a concessão por mais 30 anos. Leia o voto da diretora Agnes Costa aprovado pelo colegiado e a nota técnica que embasou os termos.
A imposição da desistência das ações na Justiça desagradou a alguns agentes do segmento que falaram à Agência iNFRA sob anonimato. Para eles, a ANEEL não pode tentar solucionar as judicializações do setor pressionando as empresas que pretendem renovar suas concessões.
Temas ultrapassados
Durante a reunião de diretoria, o diretor-geral, Sandoval Feitosa, explicou que a medida foi fruto de uma discussão que teve com a diretora relatora, Agnes Costa. “Nós solicitamos que fosse colocado para discussão com a sociedade como critério de renovação das concessões que as distribuidoras que assinarem os termos aditivos de renovação renunciem a todas as demandas judiciais com o estado brasileiro relacionados à prestação do serviço”, disse.
“No momento em que nós iremos repactuar um longo período de concessão, a nosso juízo, claro, para discussão com a sociedade, não faz nenhum sentido que as empresas continuem litigando com o poder concedente, com a agência reguladora, em temas que já foram ultrapassados”, continuou o diretor-geral.
No entendimento de Sandoval, “faz todo sentido que as empresas, ao pleitearem suas renovações, por óbvio, quitem as suas multas administrativas que têm hoje judicializadas com a ANEEL e com o poder concedente em grande medida”, afirmou.
“Da mesma forma, demandas judiciais não necessariamente pecuniárias, de discussão de méritos, de regulamentações das agências, também sejam encerradas como condição necessária para renovação das concessões”, pontuou Sandoval.
Associação
A NT 1.056/2024 deixa claro que não apenas as distribuidoras devem abrir mão das ações na Justiça, como também a Abradee.
“É necessário esclarecer que, no caso de concessionárias que façam parte da Abradee, a renovação da concessão deve ficar condicionada e ser precedida da desistência da referida ação judicial, bem como da renúncia a qualquer alegação de direito sobre o qual se funda a ação (…). Adicionalmente, previamente à celebração do termo aditivo, deve a concessionária apresentar à ANEEL o respectivo acerto financeiro com cada um dos municípios afetados pela suspensão do cumprimento da regulação”, diz o documento.
Questionado sobre esse tópico, o diretor-executivo de Regulação da Abradee, Ricardo Brandão, disse que a associação ainda vai se debruçar sobre o tema e fazer uma avaliação jurídica sobre sua pertinência, assim como de outros itens que serão objeto de estudo. “Vamos trazer a nossa posição quando da entrega da contribuição para a consulta pública”, disse à imprensa.
Eventos climáticos extremos
Entre as contribuições a serem apresentadas pela Abradee, está um maior detalhamento da alocação de riscos entre as distribuidoras e o poder concedente, um deles o enfrentamento de eventos climáticos extremos. Segundo Brandão, a lista de riscos apresentada na minuta do termo aditivo “é insuficiente para cobrir todas as situações que as distribuidoras enfrentam”.
Ele entende que “eventos de força maior”, “de fato são riscos do poder concedente e não da distribuidora”, mas que há espaço no contrato para deixar esses aspectos mais claros.
“A gente entende que a proposta que está colocada ali precisa ser aprimorada porque, de fato, já seria uma evolução. Os contratos atuais não têm uma matriz de risco muito bem definida sobre o que é risco da distribuidora, o que é risco do poder concedente”, disse. “Claro que existe alguns conceitos, como de eventos de força maior, que de fato são riscos do poder concedente e não da distribuidora, mas eu acho que tem um espaço aqui nesse contrato de concessão exatamente para deixar esses aspectos mais claros.”
Crise na Enel
O diretor da associação das distribuidoras disse ainda esperar uma “cooperação institucional” para que a crise atual envolvendo a Enel São Paulo não prejudique o debate.
“A gente entende que um tema como esse, que é tão importante para o consumidor e para a sociedade, que ele precisa de cooperação institucional”, afirmou à imprensa. “A gente entende que tem as situações da conjuntura, mas nós estamos falando de um modelo de contrato de concessão que vai servir para os próximos 30 anos. Então, ele tem que ser robusto o suficiente, inclusive para as situações da conjuntura, mas entendemos que a proposta que está colocada no Decreto [12.068/2024], e também na minuta de contrato de concessão colocada pela ANEEL, endereça os problemas atuais e os futuros.”
Questionado sobre uma eventual caducidade do contrato da Enel, Brandão destacou que a possibilidade está prevista em lei e que há confiança de que o caso será bem conduzido pela agência reguladora.