06/10/2025 | 11h00  •  Atualização: 07/10/2025 | 11h27

Tecon 10: Área técnica do TCU mantém parecer contrário à restrição

Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Amanda Pupo, da Agência iNFRA

A auditoria especializada do TCU (Tribunal de Contas da União) classificou como inconsistente a justificativa do MPor (Ministério de Portos e Aeroportos) de defender o faseamento do leilão do Tecon Santos 10 com o argumento de que a decisão se insere na política pública para incentivar a entrada de novo player no porto. Embora reconheça que a definição de uma política pública é algo discricionário do poder concedente, a AudPortoFerrovia (Unidade de Auditoria Especializada em Infraestrutura Portuária e Ferroviária) da corte afirmou que escolha deve ser fundamentada, diferente das “explicações genéricas e hipotéticas” apresentadas pela pasta no caso. 

As avaliações foram feitas em relatório concluído na última quinta-feira (2), no qual os auditores analisam os comentários feitos pelo MPor e pela ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) em resposta ao parecer emitido pela área no fim de agosto. Por entender que as devolutivas dos órgãos trouxeram “poucos argumentos novos”, “todos incapazes de alterar o encaminhamento sugerido neste relatório”, a AudPortoFerrovia manteve a sugestão para que o tribunal determine ao MPor a realização do certame em uma única etapa, sem vedar a participação de operadores que já estão no Porto de Santos. 

O parecer, que é usado para subsidiar a decisão final do TCU, não é vinculante e não precisa ser seguido pelo relator do caso, ministro Antonio Anastasia. Mesmo que o relator concorde, pode haver divergências no plenário. A expectativa do governo é de que Anastasia leve o tema para julgamento do plenário ainda em outubro. 

A pasta tem insistido que fará o leilão em dezembro deste ano. Para isso, não poderá lançar mão do período recomendado de 100 dias entre a publicação do edital e a realização do certame. A ideia dos 100 dias para as empresas estudarem o edital e se prepararem para licitações mais complexas surgiu a partir de uma demanda do próprio setor privado. Embora o prazo mínimo previsto em lei seja menor, é considerado insuficiente para os interessados formularem propostas e obterem aprovações dentro de suas próprias governanças. 

No caso do Tecon, o “cheque” que será assinado pelo vencedor é expressivo. Será o maior terminal de contêineres do Brasil, com investimento previsto na casa de R$ 6 bilhões – além da outorga que precisará ser desembolsada.

Se o TCU realmente definir sua posição em outubro, há um período em que as áreas técnicas do governo ainda usam para internalizar as determinações e recomendações da corte dentro do edital, o que dificilmente leva menos de duas semanas. No caso do Tecon 10, mesmo que o modelo de leilão não seja alterado, o Executivo já sinalizou que deve acordar com alguns ajustes, como tornar obrigatória a construção e a manutenção de um pátio ferroviário.

Política pública não é “suficientemente madura”
A resposta do MPor ao TCU, enviada no último dia 26, foi a primeira manifestação oficial da pasta em defesa do modelo aprovado pela ANTAQ (confira aqui a reportagem). Apesar de nos últimos meses o ministério ter endossado a escolha da agência reguladora, até então ainda não havia um documento com essa posição e uma argumentação em prol do modelo faseado por parte do ministério. Os comentários da pasta entregues ao TCU foram elencados em seis páginas.

Para a AudPortoFerrovia, muitas das ideias externadas pelo MPor na resposta são sequer desenvolvidas para justificar a tomada de decisão. “Por exemplo, é colocado que o remédio estrutural adequado pode gerar vulnerabilidades diante da ‘reconfiguração da geopolítica mundial’, mas não é explicado como isso poderia ocorrer e nem como players tão distintos em suas estratégias, estruturas e controle, como DPW e armadores verticalizados incumbentes, poderiam gerar vulnerabilidades na geopolítica mundial”, afirmam os auditores.

“Ocorre que a discricionariedade é uma avaliação de conveniência e oportunidade que está circunscrita à devida motivação. E, no presente caso, o Ministério apresenta apenas explicações genéricas e hipotéticas, quase sempre acompanhadas da palavra ‘pode’ para justificar sua decisão, indicando um mero juízo de possibilidade e não de plausibilidade”, continuou a AudPortoFerrovia. 

A unidade ainda escreve que posições recentes da ANTAQ e do MPor se chocariam com ideia de que um player independente no Porto de Santos seria altamente desejável, citando aprovação sem ressalvas pela agência da compra da Santos Brasil, até então bandeira branca, pela armadora CMA-CGM.

“Pelo exposto, verifica-se que a ideia externada pelo Mpor revela mais um desejo recente sobre a entrada de um novo player, marcado por várias inconsistências, do que uma política pública formalmente instituída e desenvolvida, como se pode depreender do Referencial de Controle de Políticas Públicas do TCU (RCPPT)”, diz o parecer.

“O problema a ser atacado pela política pública seria um eventual número reduzido de armadores, a necessidade de um novo terminal independente ou alguma questão de natureza geopolítica? Ou seriam todos esses? De que forma a vedação aos incumbentes resolveria satisfatoriamente esses problemas tão diversos e com causas tão distintas? E, nesse sentido, como foi feito o diagnóstico desse problema, se, por exemplo, no caso da verticalização o Cade nos trabalhos mais recentes não a considerou um risco relevante, e, no cenário de ser desejável um novo operador independente a própria ANTAQ autorizou sem ressalvas a compra da Santos Brasil pela CMA CGM?”, questiona ainda. 

Sobre os comentários feitos pela ANTAQ, um dos pontos destacados pela auditoria é de que as respostas da agência não teriam demonstrado que o Porto de Santos se encontra em um nível de concentração disfuncional, ainda mais em um cenário de desinvestimento. 

“Caso os armadores incumbentes precisem vender seus ativos no evento de vitória na licitação do Tecon 10, ter-se-á quatro grandes players no Porto de Santos, em um cenário muito semelhante a portos de referência como Rotterdam e Antuérpia, sendo que o mercado nacional é sensivelmente menor. A Antaq falha em demonstrar que o caso do Porto de Santos, em comparação com exemplos internacionais, encontrar-se-ia em níveis perigosos de concentração em caso de vitória de incumbente”, escreveram os auditores, para quem o raciocínio adotado pela agência não apresenta evidências empíricas de que a solução “ótima” é a vedação dos incumbentes.  

A reportagem procurou a ANTAQ e o MPor sobre as colocações da área técnica. O ministério respondeu que aguarda a decisão final do colegiado do TCU e “reiterou” seu compromisso institucional com o pleno cumprimento das determinações e recomendações que vierem a ser estabelecidas pela Corte. “O MPor destaca, por fim, que defende amplamente modelos que assegurem maior competitividade e eficiência ao setor portuário brasileiro”, disse. A agência não respondeu até o fechamento desta edição. 

Recomendações de determinação
Para que o leilão seja feito em uma única etapa – e não faseado, como decidiu a ANTAQ, vedando na primeira fase as empresas que operam em Santos –, a AudPortoFerrovia sugere que o edital inclua dispositivos que especifiquem remédios definidos junto ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), ou, alternativamente, a obrigatoriedade de desinvestimento caso algum operador que já tem terminal no porto leve o Tecon 10. 

Já em relação ao projeto do terminal em si, uma das recomendações feitas pela área técnica é que o governo inclua nas obrigações do futuro operador a obrigatoriedade de construção e manutenção, na sua área interna, de pátio ferroviário com capacidade mínima de tratar em cada sentido o equivalente a 900 TEU por dia – ponto com o qual o MPor já sinalizou concordância. 

Sobre o pedido do ministério para o TCU avaliar a possibilidade de permitir ao governo a fixação de valor mínimo inicial de outorga em patamares condizentes com a dimensão e relevância do Tecon Santos 10, a área técnica respondeu que a decisão cabe ao poder concedente, não havendo óbices à sua adoção. “No entanto, não é uma medida capaz de contornar a ilegalidade da adoção do leilão em duas etapas, pois não só é incapaz de garantir o repasse adequado do bem-estar do player mais eficiente à sociedade, como também não elide a quebra aos princípios da isonomia e proporcionalidade”, escreveu. 

ABTP em defesa do modelo da ANTAQ
Na sexta-feira (3), a ABTP (Associação Brasileira dos Terminais Portuários) divulgou nota para dizer que a decisão da agência reguladora sobre o Tecon Santos 10 está amparada em pareceres técnicos “consistentes e foi tomada de forma unânime”, e que sua manutenção é fundamental para assegurar a segurança ao setor. A avaliação feita pelo diretor-presidente da ABTP, Jesualdo Silva, é que a condução do processo “tem observado rigorosamente as competências legais e institucionais de cada órgão”. 

Para ele, a política definida no caso não é uma inovação no setor. “Há exemplos recentes da licitação de terminais para celulose no Porto de Santos, de granéis em Itaguaí, entre outros. Ou seja, é uma política setorial. Assim, a manutenção da decisão da diretoria colegiada da ANTAQ e da Secretaria Nacional de Portos é medida fundamental para assegurar a segurança jurídica e regulatória ao setor portuário”, disse.

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