Dimmi Amora, da Agência iNFRA
Acordos celebrados pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) com concessionárias de rodovias para reprogramar obras atrasadas “não foram capazes de mudar o comportamento das concessionárias”, que mantiveram alto índice de inexecução.
Além disso, a falta de investimento não se reverteu em reduções tarifárias proporcionais, o que criou incentivos para as concessionárias deixarem de executar 25% do que haviam se comprometido a fazer, o que significou mais de R$ 1,2 bilhão em obras não realizadas.
As constatações são de uma auditoria aprovada na semana passada pelo TCU (Tribunal de Contas da União) referente à primeira tentativa do governo de solucionar inexecuções de obras em concessões federais, uma década atrás. A ANTT na época chamou o projeto de TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), e ele era voltado para as concessões da chamada 2ª Etapa. A agência informou que aguarda ser notificada pelo tribunal para avaliar a decisão.
Uma década depois, governo e agência negociam um novo modelo para tentar tirar obras obrigatórias da concessão do papel. Chamado de “reprogramação contratual” agora, ele inclui rodovias que estavam no programa anterior e não cumpriram parte dos acordos que assinaram na década passada.
Os pedidos de reprogramação desta vez passarão por uma câmara de conciliação dentro do próprio TCU, que conta com auditores da área especializada que realizaram a auditoria no programa anterior, o TAC, e indicaram no seu relatório final necessidades de mudanças na forma como a ANTT atua nesse tipo de acordo.
A constatação principal é que nos TACs assinados na década passada, cujas ações foram analisadas entre os anos de 2012 e 2019, a ANTT permitiu que fosse possível à concessionária reprogramar as obras que estavam previstas no acordo, se fosse constatado que o novo atraso não era de responsabilidade da empresa.
Em geral, a impossibilidade de fazer as obras era atribuída a problemas de licenciamento ambiental, remoção de equipamentos públicos e desapropriações. No entanto, pelas regras do acordo, a agência não descontava nas tarifas os valores das inexecuções ou fazia isso de maneira parcelada, o que, para o órgão de controle, criou incentivos para as concessionárias manterem as inexecuções. Os índices de inexecução após o TAC eram proporcionalmente tão elevados quanto antes do TAC, apontaram os auditores.
“Nesse cenário, os termos de ajustamento de conduta não foram capazes de induzir mudança de comportamento das concessionárias no sentido de regularizar as pendências na execução de obras obrigatórias e demais obrigações pactuadas nos contratos de concessão, frustrando, assim, o objetivo da Resolução 442/2004-ANTT/DG”, escreveu o relator do processo, ministro Walton Alencar. “Ao contrário, esse quadro representa verdadeiro incentivo à continuidade da inexecução dos contratos de concessão, uma vez que as concessionárias muito provavelmente irão se valer do histórico de ineficiência da Agência para permanecerem contumazes no descumprimento de suas obrigações, com prejuízo ao usuário.”
Determinações
Por causa desses problemas constatados, o TCU fez várias determinações à agência em relação às concessionárias que se utilizaram do instrumento. No caso da ViaBahia, por exemplo, a agência terá que fazer descontos sobre o valor da tarifa para compensar as inexecuções. No entanto, por decisões judiciais devido à disputa com a concessionária, a agência tem sido impedida de mexer nas tarifas. A ViaBahia é uma das que tentam novo acordo para reprogramar as obras.
Há também determinações de reversão à modicidade tarifária de inexecuções de TACs para as concessionárias Litoral Sul, Régis Bittencourt, Rodovia do Aço e Transbrasiliana.
E há ainda uma série de determinações para futuros TACs que podem ter que ser levadas em consideração na hora de assinar os novos acordos de solução consensual que estão em negociação.
Entre as determinações, a agência terá que prever que as inexecuções contratuais “produzam efeito redutor na tarifa de pedágio em respeito à modicidade […] sem a necessidade de comprovar que o referido evento se deve a culpa da concessionária, para evitar que a tarifa continue remunerando investimentos não-realizados”.
Também será necessário que os acordos tenham “prazo fatal para seu cumprimento, de forma a não permitir reprogramações sucessivas”, e compatibilizem os prazos de todas as etapas, incluindo licenciamentos, desapropriação, remoção de interferência, para permitir o acompanhamento pela agência e evitar atrasos.
A ANTT também terá que ter “atitude proativa no sentido de efetuar ações que estão ao seu alcance buscando solucionar as pendências”, mudando normativos internos para agilizar essa fiscalização.
Reprogramações em andamento
O ministro dos Transportes, Renan Filho, vem informando que a pasta identificou 15 concessionárias que estão com problemas para cumprir as obras obrigatórias ou teriam interesse em inserir novos investimentos em contratos que já estão com seus projetos concluídos. De acordo com ele, R$ 80 bilhões em investimentos novos poderiam ser executados com as reprogramações ao longo dos contratos.
No entanto, em três dessas 15, o próprio governo já vem anunciando que colocará os trechos em alguma das 35 novas licitações que estão prometidas na atual gestão. Das 12 restantes, quatro estão com pedidos formais de reprogramação em análise no TCU: Eco 101, MS Vias, Arteris Fluminense e Via Bahia.
Com exceção da MS Vias, as outras três estavam no TAC de 2012. As discussões na câmara de conciliação do TCU ainda estão em início. Segundo apurou a Agência iNFRA, os conflitos sobre os temas estão lentamente sendo direcionados para uma solução, mas ainda não há concenso sobre se chegará a uma solução em todos os casos.
Na semana passada, Renan Filho disse em entrevista que mais seis concessionárias teriam feito o pedido para repactuarem seus contratos, o que somaria 10 pedidos. No entanto, segundo apurou a Agência iNFRA com representantes das empresas e do setor público, não houve ainda a formalização de nenhuma dessas seis, apenas a manifestação da intenção de fazer os pedidos. Algumas solicitaram a extensão do prazo para apresentar a proposta, que vence neste mês, e o ministro disse que está considerando fazê-lo.