Marisa Wanzeller e Rafael Bitencourt, da Agência iNFRA
O setor elétrico ficou dividido em relação aos vetos do governo à MP (Medida Provisória) 1.304, que muda o marco legal do setor. Enquanto alguns agentes comemoraram, outros falaram em “paralisação” da indústria de renováveis e prejuízo à transição energética. O texto foi sancionado na terça-feira (25) com mais de 20 itens vetados, sendo transformado na Lei 15.269 de 2025.
Um dos trechos mais controversos, deixado de fora da lei, é o que tratava de ressarcimento amplo aos agentes pelos cortes obrigatórios de geração, o chamado “curtailment”. A Abeeólica (Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias) e a Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica) alertam para risco de desinvestimentos no Brasil com o veto.
“Vai ter mais demissão, vai ter paralisação de investimentos, os fundos que investem aqui, as empresas de fora, elas vão direcionar os investimentos para outro lugar. A gente não segura essa indústria do jeito que ela está hoje”, disse Elbia Gannoum, da Abeeólica, à Agência iNFRA. A executiva afirma que o segmento “espera um posicionamento urgente do governo para manter os investimentos em renováveis no Brasil”.
A Absolar complementa ao dizer, em nota, que o veto “pode levar à perda de credibilidade, fuga de capital, fechamento de empresas, perda de empregos e retrocesso na transição energética no país”.
A Apine (Associação dos Produtores Independentes de Energia) também avalia que o trecho deveria ter prosperado. “No nosso entendimento, daria maior segurança e traria maior justiça para os geradores que são bastante impactados pelos cortes de geração que estão ocorrendo, dos quais os geradores não deram causa”, disse o presidente da associação, Rui Altieri.
A associação também criticou o veto ao trecho que estabelecia prazo de 90 dias para análise de pedido de LAE (Licenciamento Ambiental Especial) para a construção de hidrelétricas. “No nosso entendimento, seria um avanço fundamental e importantíssimo para o setor elétrico. Nós não entendemos o motivo dessa restrição”, afirmou o presidente.
Hidrelétricas
Para a Abrage (Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica), a escolha dos trechos vetados contemplou em grande parte o interesse do segmento. Um dos aspectos positivos foi a imposição de limite para ressarcimento dos subsídios via CDE (Conta de Desenvolvimento Energético).
Sobre curtailment, a presidente da entidade, Marisete Pereira, disse entender que, no texto aprovado, há “espaço para buscar uma regulamentação que seja equilibrada e que aloque de forma justa os custos e riscos” aos geradores. Ela destacou que os cortes de geração não atingem exclusivamente eólicas e solares, mas também as hidrelétricas de forma “bastante preocupante”, conforme pontuou em entrevista à imprensa.
Sobre aspectos da nova lei que podem afetar negativamente os grandes geradores hidrelétricos, a presidente da Abrage avalia que a solução poderá vir da regulamentação que será feita por parte da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) e do MME (Ministério de Minas e Energia). “A questão da contratação das baterias é algo que a gente vai acompanhar”, afirmou Marisete.
Comercializadores
A maior parte dos vetos pleiteados pelos comercializadores foi atendida, como o que alterava a lei da improbidade administrativa e culpabilizava agentes públicos em eventuais falhas na “segurança energética e a continuidade do fornecimento de energia elétrica”. Ainda foi vetado trecho que atribuía também aos comercializadores taxa referente à pesquisa e desenvolvimento.
Por outro lado, foi sancionado item que determina aos agentes do segmento pagarem 0,4% da receita de energia vendida como taxa de fiscalização. O presidente da Abraceel (Associação dos Comercializadores de Energia), Rodrigo Ferreira, avalia que a medida foi mantida devido à necessidade do Ministério da Fazenda de “ampliar a arrecadação”. Ele pondera que o dinheiro, que deveria ser destinado à reguladora para fiscalização do setor, passa primeiro pelos cofres públicos e não é enviado na sua totalidade para a ANEEL.
Autoprodução
A Abiape (Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia) comemorou a retirada do trecho que previa que novos arranjos de autoprodução só ocorressem por meio da contratação de usinas novas, medida chamada de “adicionalidade” pelo segmento, impedindo a integração de empreendimentos já existentes na autoprodução.
O presidente da entidade, Mario Menel, destaca que, se aprovada, a medida aumentaria a sobreoferta de energia e, por consequência, os cortes de geração. Além disso, seria “uma prática restritiva a um procedimento usual de grandes indústrias, a aquisição e fusão visando ativos existentes”. A entidade agora trabalhará para evitar que o veto seja derrubado em apreciação no Congresso Nacional.
Aumento da conta
Alexei Vivan, presidente da ABCE (Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica), avalia positivamente os vetos do governo. No seu entendimento, muitos dos trechos implicariam em mais encargos para a CDE, caso sancionados, enquanto outros não necessitam estar dispostos em lei.
Por exemplo, itens que dispunham sobre o acesso aos sistemas de transmissão e de distribuição, regras para a realização de leilões de reserva de capacidade, regras para a contratação de energia pelas distribuidoras, dentre outros, “são temas que, por exemplo, a ANEEL, o MME, o poder concedente, podem regrar, não necessitando estar engessado em leis”, avalia Vivan.
A Abrace (Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres) comemora os vetos a artigos “que iriam encarecer a energia dos brasileiros”. A entidade alega que o eventual ressarcimento amplo aos geradores, conforme previa o item vetado, custaria R$ 7 bilhões aos consumidores de energia.
A associação pondera, no entanto, que o texto final ainda tem um “conjunto de problemas que vai exigir novas intervenções sobre o setor”, dentre eles, a extensão dos contratos de termelétricas a carvão e a contratação compulsória de energia.
Na mesma linha, a Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia) avalia que os vetos “evitam a expansão de custos desnecessários e preservam a coerência do planejamento do setor elétrico”. Mas pondera que poderiam ter contemplado também “a contratação compulsória de usinas termelétricas”, diz a associação em nota.








