Tarifa Social deve direcionar prestadores de saneamento para cobrança de tarifa fixa, avalia ANA

Sheyla Santos, da Agência iNFRA

As regras para implementação da Lei de Tarifa Social de Água e Esgoto (Lei 14.898/2024) devem acelerar o direcionamento das empresas do setor para o modelo de cobrança de tarifa fixa, com pagamento da tarifa pelo consumo proporcional, e não mais por um valor fixo independentemente da quantidade consumida, o consumo mínimo.

A indicação veio da primeira reunião de apresentação da Norma de Referência que a ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico) está elaborando para lançar audiência pública em 2025 para estabelecer como serão as regras gerais para reajuste tarifário das concessionárias, o que vai contemplar as regras sobre a Tarifa Social.

Na avaliação da agência, fazer a implementação da Tarifa Social, que prevê desconto de 50% do valor da tarifa para quem consome até 15 metros cúbicos por mês e esteja no CadUnico do governo, utilizando o consumo mínimo pode tornar inviável os contratos em algumas regiões onde a quantidade de beneficiário do desconto pode chegar a 60% dos consumidores.

O reequilíbrio dos contratos para a implementação da Tarifa Social foi motivo de preocupação da diretora-geral da agência, Verônica Sanchez, e do diretor Nazareno Araújo, durante suas falas na abertura do encontro virtual, destacando a necessidade de que os prestadores tenham segurança jurídica para a execução dos contratos.

O coordenador de Regulação Tarifária da ANA , Renê Gontijo, defendeu que o modelo de cobrança por consumo proporcional é mais justo e econômico, promovendo o uso racional dos recursos. Leia aqui a apresentação da proposta regulatória da agência, realizada no encontro da última quinta-feira (5).

“O que a gente tem observado no setor é uma transição gradual para o modelo de tarifa fixa, porque ele tem sido demonstrado que é mais equitativo e promove uma sinalização econômica muito clara de uso racional do recurso”, disse o coordenador. “Entendemos que esse tipo de proposta regulatória tem, sim, o condão de acelerar essa transição, que nós entendemos que é muito benéfica”. 

Segundo Gontijo, na tarifa por consumo mínimo, a mais comum atualmente, o usuário não sente que tem incentivo à economia de uso de água, visto que vai pagar o mesmo valor consumindo até um determinado limite, que pode chegar a 20 metros cúbicos em algumas regiões. Já no modelo por tarifa fixa, ele afirma que, como todo o volume consumido é faturado, há uma sinalização mais clara de benefício para o usuário, o que o incentiva a economizar recursos.

Em fevereiro, a ANA havia aprovado a NR (Norma de Referência) 6/2024, acerca dos modelos de regulação tarifária para saneamento. Segundo Gontijo, a nova proposta de nova estrutura tarifária, que inclui as normas para a tarifa social, só deverá vir a ser regulamentada, no entanto, em 2025. Uma CP (Consulta Pública) sobre o tema está prevista para ser realizada entre março e abril do ano que vem.

No entanto, a lei determina o início dos descontos para os beneficiários nesta semana. Mas o artigo 6º da lei da Tarifa Social informa que a cobrança só será eficaz mediante prévia recomposição de equilíbrio econômico-financeiro dos contratos. O governo ainda bate cabeça sobre como será feita essa implementação.

Insustentabilidade do benefício
Gontijo destacou que as regiões Norte e Nordeste têm grande percentual de inscritos no CadÚnico, com até 59% da população elegível à tarifa social. Para ele, o alto percentual poderia tornar o benefício da tarifa social insustentável economicamente em determinadas localidades.

No entendimento do coordenador da ANA, o reequilíbrio também é necessário para contratos de programa e prestação direta de serviços, devendo ser acompanhado da atualização da estrutura tarifária por meio da respectiva entidade reguladora.

“Por isso que é importante nós fazermos uma regulamentação de como a tarifa social, de fato, deve ser implementada para garantir e assegurar que os serviços sejam sustentáveis economicamente falando e que seja preservado o equilíbrio econômico-financeiro”, afirmou durante a apresentação.

Estrutura tarifária da cobrança
Na regulamentação da tarifa social em desenvolvimento, a ANA pretende propor que o desconto de 50% seja aplicado a todas as faixas de consumo até o limite de 15m³. Com relação à aplicação ou não do desconto sobre a parcela fixa, que não é volumétrica e não tem franquia de volume associado, a agência entende que caberá à ERI fazer a regulamentação.

Ou seja, a ERI deverá analisar o impacto tarifário das demais categorias de usuários que vão suportar os subsídios da tarifa social e definir a aplicação ou não do desconto, que poderá ser inferior a 50%, sobre a tarifa fixa.

Evitar saída do sistema
Para evitar que o impacto seja grande e induza usuários a saírem do sistema, a ERI deverá observar, ainda, aspectos socioeconômicos locais, modicidade tarifária, uso racional de recursos, disponibilidade hídrica e sustentabilidade econômico-financeira da prestação do serviço.

Gontijo explica que há dois casos a serem seguidos para a aplicação do desconto da tarifa social. No caso 1, em que há cobrança de tarifa fixa mais parcela variável, existe, segundo a agência, uma margem de discricionariedade para a ERI definir ou não a aplicação do desconto.

No caso 2, em que há consumo mínimo somado à tarifa variável, ele ressalta que a lei não permite essa análise para que se conceda ou não o desconto. “O desconto tem que ser, sim, aplicado em todas as faixas de consumo, inclusive aquela faixa que é chamada de consumo mínimo, até 15m3. Se a faixa de consumo mínimo for menor que 15[m3], aplica-se o desconto também naquilo que exceder o volume mínimo até o limite de 15m3”, explicou.

Formas de reequilíbrios
Ainda de acordo com Gontijo, a proposta da agência visa ampliar as formas de recomposição de contratos, incluindo alteração do valor das tarifas, do prazo de concessão, compensação direta à concessionária, alteração em valores de outorgas ou outras alterações contratuais que não impactem a universalização do sistema.

“Quando tem aquela outorga paga ao longo da prestação do serviço, o poder concedente pode optar por reduzir essa outorga para poder, de fato, reequilibrar o contrato”, afirmou.

Orientação às ERIs
Gontijo ressaltou que a agência disponibiliza em seu site orientações do MDS (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome) de como as prestadoras e ERIs (Entidades Reguladoras Infranacionais) devem acessar e gerir os dados do CadÚnico.

Na prática, a ERI deverá pedir os dados considerados essenciais aos estados, Distrito Federal ou municípios, cruzá-los com a base de dados do prestador e apresentá-los ao prestador. Em caso de BPC, haverá um fluxo mais detalhado ainda a ser disciplinado.

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