10/07/2025 | 16h11  •  Atualização: 11/07/2025 | 13h36

Governo foca em negociar 14 dispositivos em reta final de PL do Licenciamento, diz número 2 do MMA

Sheyla Santos, da Agência iNFRA

O governo está concentrando em negociar 14 dispositivos do PL 2.159/2021, que trata do licenciamento ambiental e tem previsão de ser votado na Câmara dos Deputados na próxima semana. Desses 14, a orientação do Executivo é para que doze sejam rejeitados. O diagnóstico foi feito pelo secretário-executivo do MMA (Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima), João Paulo Capobianco, reforçando a visão crítica da pasta sobre a proposta, aprovada em maio pelo Senado.

Embora o MMA seja mais vocal sobre as preocupações com o texto, Capobianco afirmou que a avaliação é compartilhada por integrantes da Casa Civil e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

Dos 360 dispositivos do projeto, 40 ainda precisariam de reparos, explicou o secretário, referindo-se à versão aprovada pela Câmara em 2021. Agora os deputados vão avaliar novamente o texto, mas, uma vez que só podem analisar as alterações feitas pelos senadores, o governo foca nos 14 dispositivos citados por Capobianco nesta reta final.

Capobianco participou, nesta quinta-feira (10), de AP (audiência pública) realizada na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados para debater os impactos e os riscos do projeto de licenciamento ambiental. Segundo a deputada Socorro Neri (PP-AC), que presidiu a sessão, o texto deve ser levado a plenário na próxima semana.

O secretário-executivo apontou como “ponto absolutamente preocupante” no PL um possível enfraquecimento do Sisnama (Sistema Nacional do Meio Ambiente), caso o texto seja aprovado conforme a atual redação. Além disso, apontou haver uma desarticulação entre as políticas de ordenamento territorial, que hoje estão sob responsabilidade dos municípios e que no entendimento do governo passarão a ser ignoradas no licenciamento.

“Este projeto transfere do sistema dos conselhos para os órgãos executivos a responsabilidade de tomar as decisões que dizem respeito, por exemplo, à classificação do grau de impacto e grau de risco ambiental de empreendimentos”, disse o número 2 do MMA.

Judicialização
Também na audiência, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, foi na mesma linha de Capobianco. Para ele, ainda que o governo avance nas negociações com a relatoria do PL, ainda restarão pontos críticos, que foram propostos na primeira passagem do texto pela Câmara e que futuramente poderão ser passíveis de judicialização. Em entrevista à Agência iNFRA recentemente, Agostinho já havia alertado para o risco de a proposta parar na Justiça.

Agostinho listou como pontos problemáticos ainda não resolvidos no PL os impactos indiretos e intervenientes, que no caso do governo federal envolvem Funai, Incra, Iphan, ICMBio e Ministério da Saúde. Ele também manifestou preocupação quanto aos trechos que propõem mudanças na Lei da Mata Atlântica e Unidades de Conservação.

“Unidade de Conservação não é Casa da Mãe Joana. Não é proibido fazer estudos dentro de Unidades de Conservação, mas da forma como está o texto qualquer um pode entrar a qualquer momento em qualquer Unidade de Conservação sem autorização do gestor, para fazer estudos para empreendimentos para licenciamentos ambientais. Isso não faz o mínimo sentido. Faça sua licitação, protocole o pedido”, disse.

A coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama, Suely Araújo, falou que o PL aumenta a fragmentação normativa e a possibilidade de gerar decisões casuísticas para empreendimentos específicos.

“Mesmo aqueles que apoiam a proposta e a votação na semana que vem apontaram correções a serem feitas. Importante entender que a maior parte dessas correções é inviável no ponto legislativo que nós temos”, disse, acrescentando que o texto fere o pacto federativo e o que se espera de legislação concorrente, sendo portanto inconstitucional.

LAC
Assim como Capobianco e Agostinho, ela também manifestou preocupação quanto à LAC (Licença Ambiental por Adesão e Compromisso) ser aplicada para projetos de médio impacto, e não para pequenos empreendimentos e com baixo potencial poluidor, como prevê o STF (Supremo Tribunal Federal).

“A LAC está pegando em médio impacto. Isso significa, pelas nossas contas, cerca de 90% dos processos. Não é no Ibama. O Ibama não me preocupa em relação à LAC, porque o Ibama tem muita coisa com EIA/RIMA. O problema é tudo nos estados passar a ser um apertar de botão e vai sair impressa uma licença do empreendimento cujo relatório vai ser lido por amostragem. É isso o que está no texto”, disse.

O coordenador-geral substituto de Meio Ambiente da Diretoria de Planejamento e Pesquisa do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte), Alexandre Neumann, mencionou impactos positivos da proposta, entendendo que o PL traria um pouco mais de previsibilidade à autarquia. Por outro lado, ele manifestou preocupação quanto ao Licenciamento Ambiental Corretivo.

Segundo Neumann, o texto traria retrocesso ao trazer novamente a necessidade RCA (Relatório de Controle Ambiental) e PCA (Plano de Controle Ambiental), que haviam sido dispensados em 2020. Como fragilidades gerais, ele apontou falta de clareza procedimental, critérios diferenciados e autotutela na faixa de domínio.

Avanço normativo
Andrea Vulcanis, representante da Abema (Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente), classificou o PL como um avanço que representa um marco normativo significativo. Ela ressalvou que o texto precisa de aprimoramentos.

Vulcanis disse que a Abema não concorda com a interpretação de que haveria enfraquecimento do Sisnama, conforme apontado por Capobianco, porque cada um dos estados fizeram seus avanços normativos nos últimos anos. Ela afirmou que a LAC é aplicada há décadas pelos estados, sem registros de empreendimentos que tenham causado graves danos, e que a Abema concorda com o posicionamento de que os estados devam ter mais autonomia.

“Todos os estados já construíram, se não todos, a grande maioria, as suas listas, com tipologias, portes e potenciais poluidores. E isso não tem gerado, isso é um fato, nenhum contexto de disputa, ou de dificuldades, ou de divergências, como se tem falado em torno da proposta que está no PL”, disse.

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