Reforma tributária e o aumento da carga para o setor de saneamento

Hendrick Pinheiro* e Julia Daneluzzi**

No dia 20 de dezembro de 2023, o Congresso Nacional promulgou a Emenda à Constituição 132/2023, que chamada promove a tão esperada “reforma tributária” dos tributos sobre o consumo. As alterações têm impacto direto no setor de saneamento, com potencial aumento na carga tributária.

Aspectos gerais da reforma
O objetivo, a princípio, é simplificar a tributação em âmbito federal, estadual e municipal, por meio da substituição de cinco tributos por dois IVAs (Impostos sobre Valor Agregado): a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), sob gestão federal, que unificará IPI, PIS e Cofins; e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), gerenciado de forma compartilhada por estados e municípios, unificando os atuais ICMS (estadual) e ISS (municipal).

Esse modelo de IVA pauta-se pela não cumulatividade plena – que permite uma ampla base de créditos sobre despesas sujeitas à tributação, exceto para uso e consumo pessoal – e pelo recolhimento dos impostos no local de destino, onde o bem ou o serviço será consumido, e não mais na origem.

Embora as alíquotas ainda não tenham sido definidas – o que será feito por meio de lei complementar –, estima-se a aplicação de uma alíquota única, possivelmente em torno de 27%, com poucas exceções para benefícios.

Além disso, a EC 132/2023 introduz o denominado Imposto Seletivo, que visa desencorajar o consumo de produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, ao mesmo tempo em que garante isenção tributária para itens essenciais da cesta básica.

Impactos para o saneamento
A reforma tributária prevê tratamento diferenciado para alguns setores específicos – como educação, saúde, transporte coletivo, dentre outros –, que terão sua carga tributária reduzida em comparação aos demais. O texto final não incluiu o setor de saneamento no rol dessas exceções, o que permite inferir que o segmento poderá sofrer significativo aumento de tributação. A projeção é de que a carga tributária saltará de 9% para 27%.

No modelo atual, não há incidência de ISS sobre a prestação de serviços de saneamento básico, em razão do veto presidencial à época da edição da Lei Complementar 116/2003. Com as mudanças no regime tributário existe o risco que os serviços de saneamento básico sejam tributados seguindo à alíquota geral.

No campo do fornecimento de água tratada, atualmente não há incidência de ICMS por força de decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) no RE 607.056, em sede de repercussão geral. Com o novo regime tributário não há garantia que estas operações não sejam alvo da CBS e do IBS.

Outra mudança relevante diz respeito à extinção do Reidi (Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura). Este regime atualmente concede desoneração de PIS e Cofins na aquisição de estruturas destinadas ao saneamento.

Com as alterações propostas, os benefícios do Reidi para o setor serão, em tese, eliminados. Uma possível alternativa para reduzir o impacto dessa mudança é a previsão no texto da reforma de desonerar a aquisição de bens de capital, cuja regulamentação dependerá de lei complementar.

Transição
A EC 132/2023 prevê um período de transição de dez anos, dentro do qual os tributos existentes serão substituídos começando pelos tributos federais (PIS, Cofins e IPI), que serão substituídos pela CBS e pelo Imposto Seletivo em 2027. A substituição do ICMS e do ISS pelo IBS será gradual em um período que vai de 2029 a 2032.

A reforma tributária garante ainda a manutenção dos benefícios tributários de ICMS e de PIS e Cofins até 31 de dezembro de 2032.

Diante dessas incertezas, torna-se essencial o acompanhamento dos desdobramentos da reforma tributária, principalmente da edição da lei complementar regulamentadora, para compreender de que maneira as mudanças tributárias poderão impactar o setor de saneamento e possíveis alternativas para gerenciamento estratégico.

*Hendrick Pinheiro é membro da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.
**Julia Daneluzzi é membro da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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