Marisa Wanzeller e Geraldo Campos Jr., da Agência iNFRA*
O texto final do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a devolução de créditos de ICMS cobrados por distribuidoras de energia na conta de luz sobre o PIS/Cofins gerou diferentes interpretações no setor. O acórdão foi publicado nesta quarta-feira (10), embora o julgamento tenha ocorrido em agosto deste ano. Estima-se que foram cobrados cerca de R$ 60 bilhões indevidamente dos consumidores, dos quais mais de R$ 40 bilhões já teriam sido devolvidos.
As divergências sobre a decisão se dão em torno de como ocorrerá a aplicação do marco inicial para a contagem do prazo fixado para consumidores poderem reaver os valores cobrados.
A Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica) diz entender que a decisão foi favorável às distribuidoras e que prevaleceu o entendimento de que o pagamento de créditos deve retroagir dez anos da data em que a concessionária passou a compensar os créditos na conta de luz. Essa devolução dos tributos foi disciplinada na Lei 14.385/2022.
A interpretação, no entanto, não é unânime e há quem diga que o prazo deve ser aplicado a partir do início da cobrança indevida, em meados de 2018. O acórdão cita que os dez anos são “contados da data da efetiva restituição do indébito às distribuidoras ou da homologação definitiva da compensação por elas realizada”.
Os dois entendimentos trazem impactos diferentes para as empresas: se a tese das distribuidoras estiver correta, grande parte do montante já terá sido ressarcido aos consumidores na conta de luz; mas se contar partir da cobrança “indevida” do tributo, ainda restaria um valor expressivo para devolver aos consumidores, impactando a saúde financeira das concessionárias.
Light, Cemig, Copel e Enel RJ estão entre as empresas que teriam que devolver grandes quantias aos consumidores, segundo fontes, caso prevaleça a interpretação de que o marco temporal é de dez anos para frente.
Diferentes entendimentos
Ainda na quarta-feira (10), a Abradee divulgou nota considerando positiva a decisão da corte e afirmando que, “com a decisão, o STF reconheceu o reembolso dos custos processuais e definiu o marco prescricional de dez anos, contados retroativamente a partir da restituição ou da homologação definitiva da compensação”.
A associação destacou ainda que foi feito “reconhecimento do Supremo com relação à regulação por incentivo, já que competiu às distribuidoras de energia o risco judicial da defesa dos consumidores”.
O advogado Gustavo De Marchi, sócio do Décio Freire Advogados, reforça o posicionamento da Abradee. “Ao se fazer uma análise conjuntural sistemática, inclusive no que diz respeito aos debates, eu só posso entender que os efeitos são retroativos da prescrição. Até pela fala do próprio ministro [Cristiano] Zanin, quando se tenta preservar aquele usuário que recebeu de boa-fé [devolução de créditos]”, disse à Agência iNFRA.
Outras fontes, no entanto, ressaltaram que “não existe, no Direito, prescrição para trás” e que o texto do acórdão teria sido claro ao expressar que os dez anos seriam “contados da data da efetiva restituição do indébito às distribuidoras”.
Aqueles que defendem a interpretação de que o prazo contará para frente, utilizam-se de trechos do voto do ministro relator, Alexandre de Moraes, conforme consta no acórdão: “o ressarcimento sempre será em um momento subsequente […]. Nesse momento é que se instaura o poder-dever da agência em destiná-lo […] Não seria possível cogitar que a ANEEL providenciasse tal medida quando do pagamento indevido”.
Embargos de declaração
Interlocutores acreditam que o STF será questionado sobre a interpretação correta por meio de “embargos de declaração” – expressão jurídica para quando as partes pedem esclarecimentos ao juiz sobre pontos obscuros da decisão.
De Marchi, do Décio Freire Advogados, aponta que o acórdão não apresentou novos elementos além do que foi proferido no dia da decisão, em agosto deste ano, restando portanto “obscuridades” apontadas na ocasião, como a contagem do marco da prescrição. “Há naturalmente necessidade de embargos de declaração para que esse ponto de obscuridade seja aclarado”, afirmou.
* Colaborou: Lais Carregosa








