Sheyla Santos, da Agência iNFRA
O relator do PL (Projeto de Lei) 2.918/2021, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), anunciou nesta quinta-feira (16) que a CMA (Comissão de Meio Ambiente) do Senado criará um GT (Grupo de Trabalho) para avançar na conclusão do relatório do texto, que trata da compensação financeira pela exploração de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica.
A primeira audiência pública sobre o PL, que altera a cobrança do uso da água por hidrelétrica e estava adormecido no Senado, ocorreu em 8 de abril, e a segunda, nesta quinta-feira, quando recebeu 10 representantes do setor.
A proposta muda o método de cálculo da compensação, que passa a se basear em 7% da receita bruta total, e não mais na energia gerada no mês. O montante seria distribuído entre União, estados e municípios (6,25%) e para gerenciamento de recursos hídricos no Ministério do Meio Ambiente (0,75%).
Recepção negativa
O PL recebeu muitas manifestações contrárias, principalmente em relação ao uso dos recursos, aumento de tarifa e de custo de produção. Para a representante do governo Iara Bueno Giacomini, que é diretora de Revitalização de Bacias Hidrográficas, Acesso à Água e Uso Múltiplo dos Recursos Hídricos, do MMA (Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima), o texto impacta, principalmente no recurso destinado ao monitoramento de qualidade e quantidade de recursos hídricos.
A discussão, na visão dela, deveria ser para aumentar os recursos da ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico), em sua rede hidrometeorológica, fortalecendo, assim, os entes do sistema de gerenciamento de recursos hídricos e beneficiando municípios que estão na ponta e também fazem parte do sistema.
O coordenador do FNCBH (Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas), Maurício Scalon, também foi na mesma linha do MMA. Ele disse que o PL não representa uma pauta municipalista e que os recursos beneficiariam somente 726 municípios, que hoje já recebem 65% dos recursos da CFURH (Compensação Financeira pela Utilização dos Recursos Hídricos), ou seja, R$ 1,2 bilhão por ano.
Na avaliação de Scalon, o PL oneraria o setor elétrico e implicaria em um “desmonte” do SINGREH (Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos), fragilizando órgãos e precarizando políticas de gestão de recursos hídricos, saneamento e segurança de barragens.
Aumento no custo de energia
Para a representante do Fase (Fórum das Associações do Setor Elétrico) e da ABRAPCH (Associação Brasileira de Pequenas Centrais Hidrelétricas e Centrais Geradoras Hidrelétricas), Alessandra Torres de Carvalho, a eliminação de receitas oriundas da CFURH, que são destinadas à União, implicaria em aumento no custo de energia e traria insegurança jurídica aos contratos existentes.
Ela destacou, ainda, que o aumento do custo de energia afetaria diretamente a inflação. Argumentou, com base em dados da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), que a alteração na base de cálculo da CFURH impactaria em, aproximadamente, R$ 1,7 bilhão por ano na conta do consumidor, principalmente aquele do mercado cativo/regulado, que é, em grande parte, de baixa renda.
A representante do FMASE (Fórum de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Setor Elétrico) e diretora da Abrage (Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica), Camilla Fernandes, também se mostrou contrária à aprovação do PL, argumentando que qualquer mudança na CFURH impactaria no custo da conta de energia elétrica. Fernandes defendeu, ainda, o uso da tarifa de referência em vez da adoção de preços praticados, tópico proposto no PL.
A diretora de Relações Institucionais da Apine (Associação Brasileira de Produtores Independentes de Energia Elétrica), Josiani Napolitano, também destacou o risco de aumento de tarifa.
“É muito importante que seja preservada a forma de cálculo que hoje é feita”, argumentou, salientando que uma dupla incidência de encargos incorreria em oneração ao consumidor.
Aumento no custo de produção
Para o agronegócio, por sua vez, a principal preocupação sobre o PL é o aumento no custo de produção, principalmente de café e arroz, visto que a energia elétrica é insumo essencial à produção agropecuária, disse o coordenador de sustentabilidade da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária), Nelson Ananias Filho.
Ele pontuou que, em cultivos irrigados, a energia elétrica chega a 20% do custo de produção de uma atividade agropecuária.
“A irrigação, o uso da água, não está só na questão produtiva, ela está nas metas brasileiras, inclusive no plano ABC, está incluída dentro do plano de agricultura de baixa emissão de carbono, como uma tecnologia que verticaliza a produção e diminui a emissão dos gases de efeito estufa”, ressaltou.