Dimmi Amora, da Agência iNFRA
Uma auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre a Malha Oeste de Ferrovias indicou um elevado número de acidentes na ferrovia mesmo com volume cada vez mais baixo de produção, menos de 1/3 do que era transportado antes da concessão, de acordo com os dados.
O relator do processo, ministro Raimundo Carreiro, relacionou os acidentes à falta de manutenção intencional da Rumo, concessionária da rodovia no trecho. A auditoria apontou que clientes são indicados a transportarem de caminhão para outra malha da concessionária cargas que estão ao lado dos trilhos da Malha Oeste, que atende parte de São Paulo e o Mato Grosso do Sul.
A auditoria da Malha Oeste resultou em diversas determinações e recomendações para que a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) aperte a fiscalização e cobre das concessionárias de ferrovias melhoria dos seus serviços.
E indica ainda que a agência deve apresentar um plano para avaliar novas autorizações e concessões da empresa observando todas as suas concessões, e não apenas a que estiver solicitando. A Malha Oeste foi qualificada no PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) para relicitação. Mas a Rumo tem interesse em renovar a Malha Sul, outra de suas concessões ferroviárias. E também pleiteia ampliar a sua concessão da Malha Norte.
O trabalho do TCU recomenda ainda ao governo que separe a parte ferroviária da ANTT em outra agência, apontando que o setor não tem prioridade nas decisões da agência, que se concentraria mais nos setores de transporte de carga e passageiros em rodovias.
Constatações
O trabalho do TCU indicou que “a atuação da ANTT não tem garantido a prestação de um serviço adequado de transporte ferroviário de carga pela concessionária da Malha Oeste”. E também que “a atuação da ANTT não tem estimulado o atendimento às demandas existentes na área de abrangência da Malha Oeste”; e “não tem sido efetiva no sentido de impedir a degradação das condições operacionais”.
Para cada um desses achados, os auditores indicaram problemas relevantes, seja na fiscalização da agência, seja na prestação do serviço por parte da Rumo. Para os ministros, a ANTT não deve se restringir apenas à fiscalização dos itens chamados obrigatórios do contrato, metas de segurança e produção. Para eles, a agência está amparada em lei para exigir que a prestação do serviço adequada seja exigida da empresa com atendimento regular, por exemplo.
Mas, de acordo com o órgão de controle, nem mesmo os itens de contrato estão sendo cumpridos pela Rumo. Uma tabela mostra que a concessionária não cumpriu nem metas de produção nem de segurança na maioria dos anos do contrato.
Acidentes
O trabalho informa também um “elevado” número de acidentes entre 2015 e 2019. “Foram registrados 47 acidentes, (23 descarrilamentos, 16 abalroamentos, três atropelamentos e cinco incêndios), números considerados elevados frente à baixa densidade de tráfego.”
O órgão relaciona os elevados números de acidentes à falta de manutenção da via. Em vez de resolver os problemas, a concessionária tem reduzido a velocidade dos trens, o que faz com que o volume de produção seja cada vez menor. O TCU também relaciona a falta de manutenção e atendimento a um processo de desvio de cargas dessa malha para outra ferrovia do mesmo grupo, a Malha Norte.
“Essa é uma situação que deve ser analisada com bastante atenção pela agência reguladora e pelos órgãos de controle, pois pode haver prejuízos à competitividade nos preços de frete, bem como incentivo a comportamentos oportunistas, como, por exemplo, a priorização de uma das malhas em detrimento de outras, que podem ficar sucateadas. Há possibilidade ainda da empresa ‘segurar’ uma concessão apenas para evitar a entrada de um potencial concorrente no setor”, escreveu o relator Raimundo Carreiro.
Impacto nas concessões
No acórdão, são determinadas duas ações à ANTT. A agência terá que, antes da definição do planejamento para as Malhas Oeste e Sul após o término das concessões atuais, realizar estudo acerca dos impactos da concentração do controle das ferrovias na área de abrangência sobreposta entre as duas ferrovias e entre a Malha Paulista.
O órgão também determinou que, no prazo de 60 dias, a agência avalie o estabelecimento de normativo para “comprovação de que todas as concessões controladas por empresas do mesmo grupo econômico estejam adimplentes e com desempenho satisfatório, como requisito obrigatório para a
postulação de novas autorizações”.
Há ainda recomendações para a agência no sentido de rever normativos sobre comunicação de acidentes, sobre metas de produção, de prestação de serviço adequado, entre outras. E recomenda ainda ao Ministério da Infraestrutura e à Casa Civil que avalie separar os setores rodoviário e ferroviário, transformando a ANTT em duas agências separadas.
Posição da Rumo
Em nota, a Rumo esclareceu não ser parte do processo em trâmite no TCU. Segundo a empresa, no primeiro ano de concessão ocorreu evento “fora do seu controle e risco que ocasionou importante desequilíbrio econômico e financeiro do contrato, já reconhecido judicialmente”.
“Tal fato afeta o projeto desde então. Em razão deste cenário, a Malha Oeste apresentou requerimento de relicitação que foi aprovado em dezembro de 2020 pelo conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), com base na Lei nº 13.448/2017 e no Decreto nº 9.957/2019”, diz o texto.
De acordo com a empresa, a relicitação abrirá caminho para que o poder concedente promova nova licitação, com um novo concessionário assumindo a malha, ou mesmo para que o formato dessa concessão possa ser remodelado pelo governo.
“Em decorrência da adesão à relicitação, em maio de 2021 foi assinado um Termo Aditivo ao Contrato de Concessão da Malha Oeste, estabelecendo as condições transitórias de gestão do ativo até que seja realizado o novo certame licitatório. É importante ressaltar que desde que a Rumo assumiu a concessão da Malha Oeste, em 2015, foram investidos, só na via permanente, mais de R$ 150 milhões, com o objetivo de garantir a segurança da prestação do serviço concedido, bem como o atingimento das metas pactuadas com a ANTT e o atendimento adequado aos usuários da malha concedida.”
Informada sobre a reportagem, a ANTT não respondeu até a publicação desta matéria.