Sheyla Santos e Dimmi Amora, da Agência iNFRA
Empresas do setor ferroviário pediram ao ministro dos Transportes, Renan Filho, para que o dinheiro que será pago em outorgas e indenizações das renovações antecipadas e repactuações de contratos de concessões renovados do setor seja investido em ferrovias.
A preocupação é que os recursos, que já estão estimados na casa dos R$ 20 bilhões e podem aumentar, entrem no caixa do governo e não possam ser utilizados para uma espécie de fundo que o ministério pretende implementar para financiar novas concessões do setor.
Os primeiros recursos já vão ser pagos em menos de 60 dias pela repactuação do contrato da Rumo Malha Paulista, que teve na última quarta-feira (5) a cerimônia oficial de assinatura do acordo realizada na sede do ministério, em Brasília, com a presença do ministro e do presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), Bruno Dantas.
No encontro, o diretor-presidente da ANTF (Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários), Davi Barreto, foi o primeiro a apresentar a preocupação, seguido de outros diretores de empresas, como o presidente da Transnordestina, Tufi Daher. “No Tesouro, esse recurso é uma gota d’água e desaparece em um dia”, disse Tufi.
O vice-presidente de Regulação da Rumo, Guilherme Penin, alertou que a empresa terá que fazer o depósito da primeira das quatro parcelas do acordo, de cerca de R$ 670 milhões, e apelou para que a solução seja apresentada logo. “Não perca esse dinheiro”, pediu.
Renan Filho, em tom de brincadeira, respondeu que para isso ele tinha um “pequeno” aliado, o presidente da República, Lula. “Se eu e o presidente Lula não conseguirmos, é porque não tinha jeito”, respondeu o ministro, dizendo que o presidente está animado com a solução.
Na saída do evento, Renan Filho disse à Agência iNFRA, no mesmo tom, que o mais difícil tinha sido conseguir obter o dinheiro das concessionárias e que estava confiante de que a solução virá em breve. No evento, ele lembrou que a tragédia no Rio Grande do Sul acabou prejudicando a agenda do governo para o tema.
Dinheiro para o déficit zero
No ano passado, o governo considerou dentro do Orçamento da União de 2024 que recursos dessas repactuações e novas outorgas de ferrovia seriam pagos ao Tesouro, que computou esses valores como um dos componentes do orçamento com estimativa de déficit zero.
Neste ano, já na primeira revisão orçamentária, o Tesouro reduziu esse volume de receita de outorga, mas mesmo assim continuou mantendo um valor que considera as outorgas ferroviárias. Se o recurso entrar no caixa, o temor é que ele não possa ser usado para o fundo. Apesar de outros setores da Fazenda indicarem também que topam o modelo, o Tesouro não quer abrir mão do recurso.
A ideia do Ministério dos Transportes é que esses pagamentos possam ir para uma conta específica e, de lá, só saiam para financiar futuras concessões ferroviárias. Se o fundo ficar dentro do orçamento, ele é contingenciável e, dessa forma, não haveria aceitação do mercado para o projeto de concessões em desenvolvimento.
Sem nova lei
Pelo modelo que está sendo desenhado, as concessões serão modeladas e, quando houver déficit para zerar o VPL (Valor Presente Líquido) do projeto, o dinheiro será aportado na fase inicial da concessão com os recursos dessa conta. O critério de leilão, inclusive, será quem pedir a menor necessidade de aporte.
O ministério trabalha para que seja possível fazer esse modelo sem a necessidade de nova lei. Ele é considerado um formato de investimento cruzado, que já é permitido pela Lei 13.448/2017, que legalizou a repactuação dos contratos, foi validado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) após análise de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade e está sendo usado para a construção da Fico (Ferrovia de Integração Centro-Oeste).
Os cerca de R$ 20 bilhões que o ministro vem apresentando como o valor do fundo para financiar as futuras ferrovias são, em sua maioria, dos acordos de repactuação que já estão negociados com a Rumo (assinado), a Vale e a MRS. A maior parte virá do acordo com a Vale, que é estimado na casa dos R$ 15 bilhões.
A aceitação dos termos do acordo com a Vale está incluída no pacote de decisões sobre o setor que vai envolver todo o governo. Caso as condições propostas sejam aceitas, a negociação deverá ser encaminhada ao TCU para uma mesa de negociação consensual, segundo o ministro.