Sheyla Santos, da Agência iNFRA
O secretário de Controle Externo de Soluções Consensuais e Prevenção de Conflitos do TCU (Tribunal de Contas da União), Nicola Khoury, anunciou na última terça-feira (4) que o tribunal tratará, em breve, de dois painéis de referência no âmbito de soluções consensuadas que envolvem repactuações de contratos – um sobre procedimento competitivo em relação a rodovias e outro a respeito da alocação de aeroportos regionais em aeroportos de maior porte.
O painel de referência é uma espécie de consulta do TCU a agentes do setor para que colaborem com informações em auditorias do órgão, modelo que já foi usado em vários momentos para processos que tratam de temas de infraestrutura.
Nicola contou ainda que a corte de contas trabalha em temas como o sigilo no processo de admissão na Secex Consenso, no qual será considerada a possibilidade de informações sigilosas constarem em um anexo específico e outras serem apresentadas publicamente. Ele disse ainda que a Consenso tem discutido junto à CVM (Comissão de Valores Mobiliários) de que forma empresas de capital aberto devem comunicar seus fatos relevantes sobre o tema.
“É lógico que as empresas já estão atentas a isso e já têm feito divulgações, mas a gente está buscando a CVM para participar”, disse, durante Seminário sobre Consensualismo na Administração Pública realizado na corte de contas. “O objetivo é acertar. Ninguém tem a pretensão de ter bala de prata e uma resposta única”, completou.
No mesmo evento, o presidente do TCU, ministro Bruno Dantas, afirmou a jornalistas que o tribunal estuda criar uma fase de audiência pública em processos de soluções consensuadas. Ele disse ainda avaliar o limite do sigilo dos processos, a fim de ampliar a transparência.
“Nós não tínhamos isso presente quando começamos a realizar. Tudo isso está sendo registrado para que na próxima modificação [na Instrução Normativa que regulamenta o processo de consenso] nós possamos controlar todas essas questões”, afirmou, acrescentando que a corte de contas tem recebido críticas ao modelo com “espírito aberto”.
Dantas lembrou que, entre as cobranças que chegam ao tribunal, está a de como o órgão pode revisar a matriz de risco de um contrato de concessão de rodovia sem fazer uma audiência pública se no processo de estruturação da modelagem daquele contrato há uma etapa de audiências públicas. “Esse é um exemplo do tipo de problema com o qual o tribunal tem se deparado no decorrer dos trabalhos”, afirmou.
Legítimo na democracia
O presidente do órgão lembrou que há uma resistência cultural, até mesmo interna no tribunal, aos modelos de solução negocial com as empresas, mas que isso tem evoluído ao longo dos anos. Ele disse que o órgão está aberto a receber críticas e evoluir com os modelos, mas lembrou que parte delas são feitas por política partidária, dentro do jogo de governo e oposição, onde os opositores não querem que o governo tire projetos do papel.
“O TCU não se importa com quem é o governante de plantão”, disse Dantas, lembrando que o órgão também trabalhou em melhorias em projetos da gestão anterior e que acha esse comportamento normal dentro do sistema democrático. “O que o TCU não pode é se deixar levar por isso.”
Agências reguladoras
Dantas disse ainda que a ideia é que as próprias agências reguladoras tenham seus instrumentos para fazer medição com as empresas, deixando para o TCU casos de maior complexidade, citando o exemplo da Compor (Câmara de Negociação e Solução de Controvérsias), da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).
“Estamos saindo do ponto pêndulo em que o TCU questionava tudo o que as agências faziam”, afirmou, acrescentando que o objetivo da corte de contas é se concentrar em casos mais complexos. “Não queremos que o TCU tenha mil processos de solução consensual.”
Cooperação com TCEs e TCMs
Dantas defendeu ser absolutamente necessário que os membros de tribunais de contas dos estados e municípios estejam a par de projetos de solução consensuada. Ele citou como exemplo o marco regulatório do saneamento, cujas licitações e contratos administrativos são feitos por estados e municípios, ao passo que o TCU tem outras expertises, como concessões.
“É exatamente nessa troca que estamos apostando. Como existem diversos setores regulares da economia que vão ter que ser operados por estados e municípios, é importante que eles também dominem essas técnicas e esses métodos de estruturação de contratos e resolução de conflitos.”
O seminário composto por quatro painéis reuniu acadêmicos e representantes ligados aos Três Poderes que se mostraram favoráveis à iniciativa de consensualismo. O evento pode ser assistido na íntegra aqui e também aqui.
Convidados favoráveis
Em painel mediado por Dantas, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes defendeu uma jurisdição pedagógica e menos repressiva nos processos. Ele citou exemplos de acordos que foram bem encaminhados “graças ao diálogo institucional”, como nas discussões acerca do ICMS sobre combustíveis e da Lei Kandir, que isenta de pagamento do mesmo tributo exportações de produtos primários e semielaborados ou serviços.
Presente ao mesmo painel, o senador e presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco, declarou ver “com muita alegria” o tema do consensualismo. Ele mencionou o código de processo civil, conduzido pelo ministro Luiz Fux em 2015, como um marco importante na área.
Em outro painel sobre “resultados alcançados consensualmente na administração pública”, a secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, disse por sua vez acreditar que o trabalho de gerar consenso trará mais segurança para o setor privado, que ciente desse processo poderá evitar “batalha longuíssima” para, em alguns casos, alterar “uma vírgula no contrato”.